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Inferno - Destruição ou Tormento Eterno?


A Escritura fala claramente sobre o Inferno. Mas, não obstante esta clareza, as posições divergem sobre o que seja ele seja. Há, de fato, muitas posições: se o inferno existe ou não existe, se é lugar ou estado, ou ambos, se é eterno ou provisório. Não iremos abordar todos estes problemas, pois isso levaria muito tempo. Queremos aqui apenas resolver essa última díade de questões: o inferno seria uma realidade em que sofrem eternamente os condenados, ou seria, antes, um lugar onde eles são destruídos e cessam de existir?
Notemos que esse problema está intimamente relacionado à querela sobre a imortalidade da alma, que é um assunto de que trataremos futuramente.

Vamos primeiramente a alguns argumentos contrários à perenidade do inferno:

1- Seria contrário à bondade de Deus, pois alguém ficar queimando eternamente é uma realidade imensamente cruel. Deus é amor. Logo, não permitiria isso.

2- Em Isa 33,11, se fala, numa passagem meio enigmática, de restolho, e Deus diz que um fogo o consumirá.

3- A palavra "inferno" vem de "inferii", que dá a idéia de um lugar inferior tão somente, e não de um lugar espiritual de tormento eterno. O sinônimo grego seria "hades", que pode indicar simplesmente a sepultura. O equivalente hebraico é "geena" que, antigamente relacionado aos sacrifícios aos ídolos, era, já na época de Jesus, um lugar onde eram colocados os lixos e os cadáveres de animais e, de tempo em tempo, esses restos eram queimados; talvez daí também a associação do inferno com o fogo. Outro termo usado era "sheol", também hebraico, mas mais relacionado à sepultura.

Bem estes são os principais argumentos, pelo que eu sei. Tentemos resolvê-los.

Quanto ao 1, é preciso saber primeiramente o que é o homem. No domínio da criação, há a dimensão espiritual e a dimensão material. O ser humano é um ser de transição: dotado de um corpo físico, possui uma alma espiritual. Esta alma é a sede da inteligência e da vontade, faculdades que APENAS seres espirituais possuem (Deus, os anjos e os homens). É próprio do espírito não ser corruptível, isto é, não destruir-se. Logo, a despeito da finitude dos corpos, a alma humana é imortal. Deus poderia destruir-nos, se quisesse. Mas Ele não renega as Suas criaturas. Se assim fosse, seria muito mais sábio e prático ter destruído o demônio tão logo ele tivesse se rebelado, já que Deus previa tudo o que viria em resultado daquela revolta. Talvez devêssemos ainda dizer que Deus deveria até ter se abstido de criá-lo, pois sabia o que ele viria a tornar-se. A criação e a permissão da vida do demônio apenas ganham sentido quando se percebe esta verdade: Deus não renega as suas criaturas.

Se somos imortais - e o somos -, isto não nos isenta de tomarmos uma decisão em favor ou contra Deus. No caso de vivermos em amizade com Ele, nos salvamos. Do contrário, Deus respeita a nossa escolha e nos permite passar a eternidade ausentes d'Ele. Veja aqui o ponto: não é Deus Quem condena, mas é a própria pessoa que decide ficar longe d'Ele. Ora, se Deus é a fonte de todo o bem, isto significa que não há bem fora d'Ele. Portanto, uma existência longe de Deus seria uma existência ausente de todo o bem. E isso, precisamente, é o inferno. O fogo, então, pode apenas simbolizar esse estado de sofrimento interno profundo em que vivem os réprobos.

Quanto ao 2, a passagem, como dito, é enigmática e o "fogo" é um símbolo de Deus, como se depreende do versículo 14: "Quem de nós poderá permanecer perto deste fogo devorador? Quem de nós poderá permanecer perto das chamas eternas?". O escritor fala de não conseguir permanecer perto. Ora, estas chamas são o próprio Deus. Quem não consegue ficar perto, afasta-se. À mesma pergunta, Isaías responde: "Aquele que procede bem e diz a verdade, que não quer um benefício extorquido, que não quer tocar um presente corruptor, que fecha os ouvidos aos propósitos sanguinários e cerra os olhos para não ver o mal. Semelhante homem habitará nas alturas." (33,15-16) Logo, este homem, o Justo, suportará aquelas "chamas eternas", pois o amor de Deus é como um fogo. (Dt 3,24; Hb 12,29)

Sobre o "restolho", ele não simboliza as pessoas, mas as ações das pessoas, o que faz lembrar de perto a passagem de 1Cor 3,11-15, e que os católicos associam ao Purgatório. Portanto, não dá pra provar muita coisa por aí.

Quanto ao 3, os termos usados para referir-se à realidade celeste são sempre emprestados do comum dos ouvintes. O céu é como um fermento, é como um tesouro escondido, é como uma mulher que encontra uma moeda perdida, é como uma água que sacia para sempre, é como uma festa, etc. Portanto, é óbvio que, para referir-se ao inferno, Nosso Senhor teria de usar termos conhecidos. Quando, por exemplo, queremos nos referir ao céu, para que lado olhamos? Para baixo? Para o lado? Não. Para cima, não é? E, no entanto, o Céu não está geograficamente lá em cima. Falar das "coisas do alto", ou Jesus dizer que Ele é "de cima", indicam que estas coisas ou a procedência de Jesus são elevados. Mas errará quem imaginar isso no sentido literal. Portanto, em chamar o estado de condenação de inferno, quer-se dizer que este estado é inferior. Cada nome é um símbolo: geena porque eles são atormentados como que pelo fogo, e sheol porque, comparados ao estado dos bem aventurados, os réprobos vivem uma contínua morte. Lembremos ainda que o grego Hades não tinha a conotação de inconsciência. Basta ler os gregos clássicos para notar que eles criam em consciência póstuma. Essa era, inclusive, uma das esperanças de Sócrates.

Vamos agora às evidências de que os condenados estão bem acordados.

Primeiro, lembremos: não há nenhuma necessidade de restringir o campo da discussão a querelas escriturísticas, pois não professamos a Sola Scriptura que, segundo já escrevemos vez e outra (aqui), não tem sentido. Mas, como a idéia é convencer os que a professam, fiquemos neste âmbito.

Primeiramente, lembremos da parábola do Rico Epulão e do pobre Lázaro, em Lc 16. 19-31. Seguindo a idéia que expusemos acima, Jesus não iria criar uma estória sem qualquer relação com a realidade. Ele falava de idéias já comuns aos judeus, e é óbvio que Ele não se ia dar ao luxo de inventar um contexto para a história que fosse de todo falso. É óbvio. Em todas as parábolas, o contexto é real. Também nessa ele o é. E, como vemos, o rico, depois da morte, está sendo atormentado de modo que pede para que Lázaro venha refrescar-lhe a boca com o dedo molhado. Ora, há atividade consciente nele. Há pedidos, há percepção, há dor.

Isso se coaduna infinitamente melhor com a descrição que o próprio Jesus faz das "trevas exteriores": "ali haverá choro e ranger de dentes" (Mt 8,12; Mt 22,13, Mt 25,30, Lc 13,28). Primeiro, pensemos no que significa a expressão "trevas exteriores". Como se sabe, as trevas não possuem uma natureza objetiva. Pelo contrário, elas são a ausência da luz. E o termo exterior é um termo puramente relacional que só faz sentido enquanto contrastado com a expressão interior. Exterior é o que está fora ou não participa de algo. Note que o modo de referir-se ao inferno é sempre como realidade negativa, isto é, como dimensão à qual faltam as características do céu. Ele é ausência de Deus e é exclusão da vida beatífica.

As trevas não significam, portanto, inexistência, mas inimizade com Deus, ausência de Deus. Cf. Col 1,13; 1Pe 2,9; 1Jo 1,6.

Lembremos das virgens imprudentes que, por não terem óleo, não são destruídas, mas somente excluídas do convívio com o Noivo. (Mt 25,1-13)

Judas é ainda mais claro. Depois de falar dos que seguiram o caminho de Caim, e dizer que estes estão duas vezes mortos, ele escreve: "estrelas errantes, para as quais está reservada a escuridão das trevas para toda a eternidade!" Analisemos. O que é uma estrela errante? É um astro que transita pela imensidade do universo, longe da luz do sol. É uma analogia belíssima. Ora, ainda que longe, o astro segue existindo. E quanto tempo dura essa existência nas trevas? Judas responde sem rodeios: "para toda a eternidade!". (13) Interessante ainda notar que ninguém pode ser destruído pelas trevas, rs..

Observemos também Judas falar dos "duas vezes mortos". Em geral, os aniquilacionistas pensam que a segunda morte será a destruição depois da Ressurreição. No entanto, Judas fala de pessoas que já são duas vezes mortas e, não obstante, seguem como "estrelas errantes".

Em segundo lugar, se há "choro e ranger de dentes" é porque há consciência e existência. Quem chora, chora por algo. O choro implica a consciência do motivo. E assim como o choro implica o "chorante", o ranger de dentes implica o rangedor e, também, o motivo. Note que o sofrimento é simultâneo à consciência.

Um outro argumento comumente usado contra os mortalistas se baseia na idéia de que é justo dar a diferentes crimes diferentes punições. Ora, os que defendem a segunda morte como uma destruição defendem que a mesma pena deverá ser dada a todos, o que, obviamente, é injusto. Depois de mortos, eles seriam ressuscitados e, então, depois de tomarem consciência dos motivos pelos quais iam ser mortos de novo, viria a destruição. Façamos um teste mental:

Imagine uma pessoa que tem o péssimo hábito de furtar pequenos pertences dos seus amigos. Ele vai na casa de um, e pega um carregador de celular; vai na casa de outro, e rouba uma estatueta; vai num terceiro, e lhe some 10 reais. Vai ainda num quarto, e lhe diminui um livro, etc. Essa pessoa, se não se ajeitar, não poderá salvar-se, correto?

Agora pensemos num daqueles soldados do ISIS, o Estado Islâmico, que matam de forma cruel - metralhando e decapitando com requintes de crueldade - todos os que encontram pela frente que não sejam muçulmanos.

Agora pense que, no fim do mundo, essas duas pessoas irão ressuscitar e, depois de uma breve conscientização do motivo pelo qual morrerão uma segunda vez, eles sejam destruídos igualmente. Isso, de fato, tem algum sentido? Isso é justo? Se encontrar dificuldades em resolver o problema ou em encontrar algum problema, faça a mesma pergunta a uma pessoa não religiosa.

É óbvio que existem diferentes graus de crimes, e, portanto, diferentes penas. É nessa intuição básica que se fundamenta inclusive o direito humano.

E para não nos alongarmos demasiado - pois estas e outras referências constarão no artigo sobre a imortalidade da alma que sairá em breve -, vamos a um argumento que eu penso ser definitivo.

Em Apocalipse 20,10, lemos: "o Demônio, sedutor delas (das nações dos quatro cantos da terra), foi lançado num lago de fogo e de enxofre, onde já estavam a Fera e o falso profeta, e onde serão atormentados, dia e noite, pelo século dos séculos."

Trechos assim não deveriam deixar dúvidas. Mas vamos lá. Os aniquilacionistas afirmam que este lago é um lago de destruição, espécie de matadouro. No entanto, há, só neste trechinho, pelo menos duas evidências para que não se pense dessa forma. Primeiro, que o próprio João especifica que eles serão atormentados - e não destruídos - dia e noite, pelo século dos séculos. Ora, a expressão "dia e noite, pelo século dos séculos" quer dizer, absolutamente, que isso não terá fim. Não existem possibilidades de interpretação alternativa a não ser descambando para um argumento desonesto. A coisa foi especificada assim porque ela é assim mesmo! Outro trecho fala de "desprezo eterno" (Dn 12,2), onde fica claro que há sofrimento e vergonha, e não destruição. O outro ponto é que, quando o Demônio é lançado no lago de fogo, a Fera e o falso profeta lá já estavam, ou seja, não haviam sido destruídos, mas estavam padecendo. E quando foi que a Fera e o falso profeta foram lançados lá?

Em Ap 19, 20: "Mas a Fera foi presa, e com ela o falso profeta, que realizara prodígios sob o seu controle, com os quais seduzira aqueles que tinham recebido o sinal da Fera e se tinham prostrado diante de sua imagem. Ambos foram lançados vivos no lago de fogo sulfuroso."

Depois disso, o Demônio é preso por mil anos (Ap 20,2). No versículo 7, depois de mil anos, Satanás é solto. E aí, depois de mil anos é que ele é lançado no lago onde já estão a Fera e o falso profeta. Mil anos e eles não haviam sido destruídos? Ora, é óbvio então que o lago de fogo não pretende destruí-los mas simplesmente atormentá-los, exatamente como é dito.

Fábio.
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