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Ainda sobre o Inferno: símbolo do fogo e trevas exteriores


Depois de ter devidamente provado que a própria Bíblia atesta a existência do inferno, vejamos agora mais uma conveniência bíblica de que o inferno seja real.

No texto passado, vimos como o destino eterno dos condenados é referido como "lago de fogo sulfuroso". Outra expressão que sugere uma idéia similar é "Geena" (Mt 5,22,29). Na verdade, este era um lugar físico, fora de Jerusalém, onde eram jogados os lixos, animais mortos, e, depois,  eram incinerados. É obviamente uma comparação que Jesus faz. Os negadores do inferno creem que a analogia se deve ao fato dos corpos físicos - objetos e animais - serem destruídos. Nós, ao contrário, cremos que Jesus utiliza esta figura para simbolizar o estado contínuo do inferno, não no que se refere à destruição, mas à chama.

E aqui fazemos um parêntese: embora haja de fato teólogos e santos que afirmam haver fogo literal no inferno, crer nisto não é essencial à Fé Católica. Não há consenso entre os teólogos a respeito da natureza do inferno, e as revelações dos santos que supostamente visitaram-no se enquadram no campo das revelações particulares que não obrigam a crença individual.

Além disso, quando consideramos o modo como o ser humano conhece, vemos que é complicado que uma pessoa veja sensivelmente realidades espirituais não sensíveis. Expliquemos: o ser humano é um composto substancial de corpo e alma. A alma possui inteligência e vontade, mas opera través da substância material, que são os órgãos físicos e os sentidos. Assim, a fim de inteligirmos algo, é necessário que o processo se inicie nos sentidos que apreendem as "espécies sensíveis" ou "imagens" dos entes corporais; em seguida, estas espécies são encaminhadas à imaginação e retidas pela memória. Até aí elas continuam sendo realidades singulares, isto é, individuais. Isto significa que tudo quanto temos na imaginação são realidades físicas. Mesmo que juntemos espécies sensíveis distintas compondo entes inexistentes, ainda assim estes entes terão uma figura física. Pois bem: desta matéria prima captada pelos sentidos e depositada na imaginação, a inteligência, agora uma faculdade espiritual, retira, num processo chamado "abstração", as "espécies inteligíveis", os dados universais que estavam "vestidos" pelos traços individuantes. É destes traços universais que virá o conceito ou definição das coisas. Isto significa que o ente humano não pode conhecer, por si mesmo, seres que não sejam materiais, a não ser por comparação com os entes físicos. Desse modo, há um claro limite cognoscitivo, o que faz com que Deus, querendo revelar ao homem realidades suprassensíveis, tenha de as adaptar ao conhecimento sensível humano. Assim, mesmo as visões dos santos e místicos deve necessariamente ter um caráter analógico. O que se conclui disso? Que não é possível dizer, a princípio, que no inferno exista fogo literal.

Agora, o fogo visto pode ter - e tem - um caráter simbólico. Mesmo um fogo literal cumpriria uma função: a submissão de um ente inteligente e espiritual a um elemento material e irracional, o que seria um remédio perpétuo para o orgulho humano. Além disso, o fogo pode meramente simbolizar a inquietude e o sofrimento que, no inferno, são contínuos. O escritor Joseph Pieper dizia que no inferno não há nem silêncio nem música, mas só barulho, isto é, não há a quietude da cessação nem a ordem da harmonia, mas apenas a agitação contínua e ruidosa, perpetuação das desordens da paixão que dominaram a pessoa em vida, efeito da animalidade à qual se submeteu durante sua estadia na terra.

O fogo, segundo o simbolismo antigo e medieval, também é composto de duas características: é seco e é quente. A sequidão é o princípio da fixidez, da não fluidez. O quente é o princípio da fragmentação, da não coesão. O fogo, portanto, poderia simbolizar a dureza dos entes fragmentados, isto é, que não alcançaram a sua coesão interior, e que permanecem nesta condição, o que significa que os condenados manifestariam uma espécie de personificação do estado de guerra. Nada mais adequado, portanto, que o fogo para servir-lhes de símbolo.

Contudo, nem sempre o inferno é referido, na Bíblia, como um lugar de fogo. Com efeito, lemos em 2Pe 2,4 o que segue:

"Pois se Deus não poupou os anjos que pecaram, mas os precipitou nos abismos tenebrosos do inferno onde os reserva para o julgamento..."

Aqui o inferno aparece como "abismos tenebrosos", isto é, lugar onde habitam as trevas. Inferno, aí, tem o sentido de "lugar inferior" em oposição ao "lugar superior", o Céu. Como, porém, o Céu não é uma realidade material e, portanto, é não-espacial, também o "lugar inferior" ou "inferno" pode ser o símbolo de um estado inferior contrário ao celeste, e não exatamente um lugar. A Escritura diz que o demônio, depois do pecado, foi enviado à terra. Se se quiser tomar "inferno" como lugar literal, então talvez tivéssemos de fazer a identificação entre a terra e o inferno. Estariam corretos os que dizem que "o inferno é aqui", hehe.. A coisa complica ainda mais se considerarmos que Paulo, referindo-se a estes que foram precipitados "nos abismos tenebrosos do inferno", habitam nos ares (Ef 6,12). Além disso, qualquer protestante tende a aceitar que os demônios têm liberdade suficiente para tentar os cristãos, o que indica que os abismos onde estão precipitados não é exatamente um lugar.

O Inferno é, portanto, o contrário da beatitude celestial, isto é, um estado de alma. Do mesmo modo, as trevas do inferno são o oposto da luz divina. O que se nota, porém, é que, embora estejam reservados para um futuro julgamento, os anjos decaídos - que chamamos "demônios - habitam desde já nestes estados, o que significa que estas trevas não são um símbolo da sua destruição.

Porém, o próprio Jesus usa o exemplo das trevas para simbolizar o castigo dos proscritos depois do julgamento. Vamos ver?

"Por isso, eu vos declaro que multidões virão do Oriente e do Ocidente e se assentarão no Reino dos céus com Abraão, Isaac e Jacó, enquanto os filhos do Reino serão lançados nas trevas exteriores, onde haverá choro e ranger de dentes." (Mt 8,11-12)

Quando Jesus conta a parábola da festa das bodas do filho do Rei, inclui um personagem que está sem a veste nupcial. Qual será o destino deste sujeito?

"Amarrai-lhe os pés e as mãos e lançai-o nas trevas exteriores. Ali haverá choro e ranger de dentes." (Mt 22,13)

Falando do servo mau e preguiçoso que enterrou o talento ao invés de tê-lo ao menos colocado no banco para correr juros, Jesus, referindo-se à Sua volta, diz:

"E a esse servo inútil, jogai-o nas trevas exteriores; ali haverá choro e ranger de dentes." (Mt 25,30)

Eu estou pegando de propósito somente trechos de Mateus, pois se citasse autores diferentes alguém poderia objetar a diferença de estilos e de símbolos. Mas se é só um autor, fica evidente a intenção dele.

Notem que os trechos acima sempre relacionam o "choro e ranger de dentes" às "trevas exteriores". Agora, observem a seguinte relação:

"O Filho do homem enviará seus anjos, que retirarão de seu Reino todos os escândalos e todos os que fazem o mal e os lançarão na fornalha ardente, onde haverá choro e ranger de dentes." (Mt 13, 41-42)

"Assim será no fim do mundo: os anjos virão separar os maus do meio dos justos e os arrojarão na fornalha, onde haverá choro e ranger de dentes." (Mt 13,49-50)

O que é que se nota aí? Mateus faz uma relação evidente entre "trevas exteriores" e "choro e ranger de dentes". Depois, ele faz o mesmo com "fornalha ardente" e "choro e ranger de dentes", o que indica que "trevas exteriores" e "fornalha ardente" sejam a mesma coisa. Obviamente que a idéia de "trevas exteriores" não sugere destruição.

Como vimos na afirmação de Pedro, as "trevas exteriores" ou "lugares tenebrosos", ou, ainda, "profundezas das trevas" (2Pe 2,17), onde estão os demônios desde já, não simbolizam a destruição literal. Logo, a "fornalha ardente" tampouco a simboliza.

Daqui surge naturalmente a questão: se os demônios já esperam no lugar tenebroso pelo julgamento, o que mudará ao serem julgados se se está dizendo que eles permanecerão neste lugar?

Antes, porém, de respondê-la, notemos o seguinte: Jesus, em Jo 16,11, afirma que o juízo, do qual o Espírito Santo nos convencerá, é o de que o "príncipe deste mundo", isto é, o demônio, "já está julgado e condenado".

Se já está julgado e condenado porque haveria um julgamento também dos demônios no fim dos tempos? Será que o texto quer dizer que apenas Lúcifer já está julgado e condenado e que os demais demônios podem ser ainda inocentados? Obviamente que não. Isto indica que o Juízo Final é um juízo de confirmação e de exposição das obras de cada pessoa - humana ou angélica - a fim de, depois, determinar-lhe justa punição. Os demônios, nesta ocasião, perdem todo o poder de causar mal aos outros, sendo, dentre todos, os que mais sofrerão. Do mesmo modo, os ressurretos para a perdição terão acrescido, pelo fato de estarem agora com seus corpos, o sofrimento de que padecerão pela eternidade.
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