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"Quando se darão essas coisas" Parte III - A incerteza do dia do Senhor

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Uma leitura atenta dos Evangelhos deixa no leitor a impressão de que Jesus, embora tenha indicado alguns sinais precursores de sua vinda, em última análise quis deixar a época da parusia velada ao conhecimento humano; é de crer que, mesmo para os homens que a ela assistirem, a segunda vinda do Senhor terá o caráter de acontecimento imprevisto, surpreendente:

"Verificar-se-á por ocasião da volta do Filho do homem o que se deu nos dias de Noé. Pois, assim como no tempo que precedeu o dilúvio, os homens comiam, bebiam, tomavam e davam em matrimônio, até o dia em que Noé entrou na arca, e de nada suspeitaram até que veio o dilúvio, que levou a todos, assim se dará quando o Filho do homem voltar. Então, de dois homens que estiverem num campo, um será tomado, o outro deixado; de duas mulheres que estiverem junto à mó, uma será tomada, a outra abandonada." (Mt 24-37-41)1

O caráter impreviso da parusia é inculcado ainda por duas comparações que o Senhor propõe no Seu discurso escatológico: assim como o raio se desencadeia repentinamente, recobrindo logo toda a extensão do horizonte (Mt 24,27), assim como o salteador surpreende o pai de família em casa durante a noite (Mt 24,35s), assim também o Filho do homem inesperadamente descerá dos céus em Sua Majestade.

S. Paulo desenvolve em colorido vivo a imagem do ladrão:

"Sabeis muito bem que o dia do Senhor virá como um ladrão durante a noite. Quando os homens disserem: "Paz e segurança!", justamente então uma ruína repentina os acometerá, como a dor sobrevém à mulher que está para dar à luz, e não escaparão. Vós, porém, irmãos, não vivais nas trevas de modo que aquele dia vos surpreenda como um ladrão." (1 Tes 5,2-4)2

É justamente a consciência da incerteza do grande dia que motiva, logo a seguir, tanto no vaticínio de Cristo como na epístola de S. Paulo, séria admoestação à vigilância; Jesus insiste nesta atitude, ilustrando-a por meio de parábolas; cf. Mt 24,45-25-13; Lc 1,35-40; 1 Tes 5,5-10.

De resto, o próprio Cristo declarou explicitamente não pertencer à Sua missão revelar aos homens o dia da parusia; tal conhecimento ser-lhes-ia pernicioso mais do que vantajoso. Assim, em Seu sermão escatológico, dizia:

"Quanto àquele dia e àquela hora, ninguém os conhece, nem mesmo os anjos do céu, nem mesmo o Filho, mas, sim, o Pai só." (Mc 13,32)

A exegese deste texto já fez correr rios de tinta desde os primórdios da Igreja.3 Provém de Sto. Agostinh a interpretação hoje geralmente aceita pelos exegetas católicos: é na qualidade de Mestre dos homens que o Filho diz ignorar a época do juízo universal; o Filho não a sabe porque não pertence à Sua missão de Doutor e Salvador comunicar este segredo de Deus aos homens, ou seja, porque está fora do depósito de verdades a serem reveladas (cf. Sto. Agostinho, in Ps 36 Migne 36,355.)

Ainda aos Apóstolos que perguntavam quando se consumariam as suas expectativas messiânicas, respondeu o Senhor:

"Não toca a vós ter conhecimento dos tempos e momentos que o Pai fixou por Sua própria autoridade" (At 1,7)

E a Igreja deseja se respeite o plano divino de deixar oculta aos homens a época da parusia; admoesta a que não se pergunte, mais ou menos futilmente, à fantasia humana o que o próprio Deus explicitamente Se recusou revelar. Diante de tudo o que se tem propalado sobre o assunto, ela será sempre um baluarte de paz, exortando os homens a que, sem se deixar perturbar por "rumores", se empenhem com zelo por fazer a cada momento o que é, certa e indubitavelmente, da vontade de Deus. Foi para assegurar essa tranquilidade de alma que a Igreja mais de uma vez se viu obrigada a se pronunciar contra os pregadores de "novidades".4

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1- As últimas palavras acima insinuam que a parusia surpreenderá homens e mulheres em suas ocupações ordinárias, nos campos ou em casa. Não serão as circunstâncias externas, mas as disposições internas da alma, que decidirão da sorte de cada qual; de duas pessoas, uma será tomada, isto é, incorporada ao cortejo dos que se unirão a Cristo para sempre, a outra será abandonada ou excluída do mesmo; cf. a parábola de Mt 25,1-13: cinco virgens entram no cortejo, cinco não.
O estilo desta admoestação é apocalíptico, o que implica: ... intencionalmente obscuro, velado, não se podendo urgir os pormenores das afirmações.

2- S. Paulo inculca bem que para os cristãos fiéis ao Senhor não há trevas, não há noite ou cegueira espiritual; por isto a vinda do Senhor, por repentina que seja, não lhes acarretará os terrores de um assalto maléfico, mas será a última fase de uma longa gestação, será dar à luz uma vida oculta com Cristo em Deus (cf. Col 33)
A imagem do ladrão ocorre também em 2 Pd 3,10; Ap 3,3.


3- Encontra-se um histórico da respectiva exegese em Lebreton, Les origines du dogme de la Trinité I. Paris 1927 6, 559-90.

4- Vão aqui transcritas duas declarações do Magistério da Igreja dirigidas aos que anunciam a doutrina do Evangelho.
Um concílio regional de Milão em 1362 assim admoestava:
"Não apregoem como coisas certas a época de vinda do Anticristo e a data do juízo final, já que pelos lábios do Senhor foi dito: "Não toca a vós ter conhecimento dos tempos e momentos." Nem ousem, a partir das Escrituras Sagradas, procurar adivinhar o futuro e indicar determinado dia para determinado acontecimento. Também não afirmem temerariamente ter-lhes sido isso revelado por Deus."
O 5º concílio universal do Latrão, em 1516, decretava:
"Mandamos a todos os que estão, ou futuramente estarão, incumbidos da pregação, que de modo nenhum presumam afirmar ou apregoar determinada época para os males vindouros, para a vinda do Anticristo ou para o dia do juízo. Com efeito, a Verdade diz: "Não toca a vós ter conhecimento dos tempos e momentos que o Pai fixou por Sua própria autoridade." Consta que os que até hoje ousaram afirmar tais coisas mentiram e, por causa deles, não pouco sofreu a autoridade daqueles que pregam com retidão. Ninguém ouse predizer o futuro apelando para a Sagrada Escritura, nem afirmar o que quer que seja, como se o tivesse recebido do Espírito Santo ou de revelação particular, nem ouse apoiar-se sobre conjeturas vãs ou despropositadas. Cada qual deve, segundo o preceito divino, pregar o Evangelho a toda criatura, aprender a detestar o vício, recomendar e ensinar a prática das virtudes, a paz e a caridade mútua, tão recomendada por nosso Redentor."
Textos encontrados em Huerter, Theologiae dogmaticae compendium III nº 694 em nota. Veja-se também Hefele-Leclercq, Histoire des Conciles VIII 1. Paris 1917, 526.
Pode-se ainda notar em Dz 490 a condenação de erros semelhantes dos "fraticelos" proferida em 1318 pelo Papa João XXII.
Textos encontrados em Huerter, Theologiae dogmaticae compendium III nº 694 em nota.

BETTENCOURT, Dom Estêvão. A Vida Que Começa Com a Morte. 3ª Ed. Rio de Janeiro: Editora Agir. 1963. Pp. 198-200
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