Tradutor / Translator


English French German Spain Italian Dutch Russian Portuguese Japanese Korean Arabic Chinese Simplified

É suficiente a disposição natural de amar a Deus?


Todos sabem que para nós, cristãos, o grande mandamento é amar a Deus; o segundo, que é semelhante ao primeiro, é amar ao próximo.

Ora, dizemos que, a respeito deste duplo dever, o naturalismo lança as almas em ilusões muito funestas.

Deus que nos criou pôs no fundo da nossa natureza uma inclinação invencível para amar o bem em geral. E como Deus é o soberano Bem, o único Bem das almas, as almas, naturalmente, devem se voltar para Deus. Todo homem que pensa e medita no Autor de seu ser, sente-se naturalmente voltado para ele. É um dever ao mesmo tempo de justiça e gratidão. E as noções de justiça e gratidão têm sobre nós um poder tão grande que não podemos nos furtar desse dever e é sempre honroso cumprir deveres fundados em tão autênticos títulos. 

Sem o pecado original, a natureza se voltaria diretamente para seu Criador. Mas a ignorância e a concupiscência, frutos infelizes da queda original, fazem com que, muitas vezes, a alma pare diante de bens passageiros, se distraia e se acostume a amar ninharias em lugar de elevar seu amor até a fonte de seu ser.

Mesmo nesse estado de queda a lei de Deus permanece: Amarás o Senhor teu Deus. E a graça de Nosso Senhor Jesus Cristo nos torna possível, fácil e doce a observação do grande mandamento.

O mal é que, com frequência, depois de ter perdido a graça, depois de ter decaído da caridade, como continua a encontrar em si o amor do bem em geral, a inclinação natural para amar a Deus, as pessoas se contentam com estas disposições, e crêem estar quites com Deus. Estão em pecado mortal, mas, como as inclinações naturais de amar a Deus, de amar o bem em geral, permanecem no fundo da alma, tomam estas disposições naturais, comuns a todos os homens, por disposições pessoais, como se fosse seu estado particular diante de Deus. Este estado, diante de Deus, é de pecado mortal, mas não percebem: as inclinações naturais ficam, são percebidas, contentam-se com elas e se induzem a crer que Deus se contentará também. Dizem para si mesmas: Não quero mal a Deus, sei que Ele é bom; sou inclinado a amá-Lo; como Deus poderia me querer mal se eu lho quero? Seria pior do que eu?

Aqui está, vista no fato, a grande ilusão cuja raiz é o naturalismo. Quantas pobres almas negligenciam os deveres mais essenciais do cristianismo, vivem sem a graça santificante, sem Nosso Senhor Jesus Cristo e, no entanto, afirmam que amam muito a Deus!

Lembram-nos um infeliz que pôs fim a seus dias, e antes de cometer seu irremediável crime, escreveu um adeus à sua família e nesse escrito, afirmava seu amor por Deus!

É evidente que ele tomava a inclinação natural de amar a Deus, que todos nós temos, por sua disposição pessoal, que não podia ser mais contrária ao amor de Deus!

Pe. Emmanuel-André. O naturalismo. Ed. Permanência, 2014. p. 17-18.

O Primeiro Grau de Oração - Parte 1


Sta Teresa D'Avila

Em terreno onde brotam muitas ervas más, o principiante imagine que vai plantar um jardim, onde o Senhor possa deleitar-se. Sua Majestade arranca as ervas más e vai plantando as boas. Suponhamos que isto já esteja feito quando a alma se resolve a ter oração. e nela começa a se exercitar. Com o auxílio de Deus, e como bons jardineiros, devemos procurar que cresçam as plantas, cuidando de as regar para que dêem flores de perfume suavíssimo, a fim de deliciar a esse Senhor nosso. Assim, ele virá muitas vezes deleitar-se em nosso jardim e espairecer entre as virtudes.

Vejamos de quantas maneiras se pode regar para sabermos o que fazer, o trabalho que nos há de custar, calcular se o esforço é maior do que o lucro, e o tempo que levará. Parece-me haver quatro modos de regar: o primeiro é apanhar água a baldes num poço, com grande trabalho. O segundo é tirá-la mediante nora e alcatruzes movidos por um torno (assim o fiz algumas vezes), o que cansa menos e dá mais água. O terceiro é trazê-la de algum rio ou arroio, e por este meio se rega muito melhor, o jardineiro tem menos trabalho, a terra fica bem molhada e não é necessário regar tantas vezes. O quarto é por chuvas frequentes e copiosas, modo incomparavelmente melhor que tudo que ficou dito. É então o Senhor quem rega, sem nenhum trabalho nosso.

Conforme o meu intento, apliquemos agora à oração essas quatro formas de regar com as quais se há de conservar o jardim, pois sem ser irrigado, perecerá. Por esta comparação creio poder explicar quatro graus de oração em que o Senhor, por sua bondade, tem posto algumas vezes minha alma. Praza a Sua Clemência, consiga eu dizê-lo de modo a aproveitar a uma das pessoas que me mandaram escrever (...).

Dos que começam a ter oração, podemos dizer que são os que tiram água do poço com baldes. É muito penoso, porque se cansam em recolher os sentidos e, como estão acostumados a andar distraídos, têm não pequeno trabalho. Cumpre irem-se habituando a não se importar com o que vêem ou ouvem. É preciso que assim façam efetivamente nas horas de oração, buscando soledade, e pensando, apartados de tudo, em sua vida passada. Isto, aliás, todos o devem fazer com frequência, tanto os que começam como os que já estão no fim do caminho, insistindo mais ou menos, como depois direi. Os principiantes ainda sofrem no início, porque julgam não se arrepender suficientemente de seus pecados. Contudo seu arrependimento é sincero, visto estarem realmente determinados a servir a Deus. Procurem ocupar-se da vida de Cristo, e nesta meditação a mente se cansa.

Até aqui podemos chegar por nós mesmos. Bem entendido com o favor de Deus, pois sem este, já se sabe, não conseguimos sequer ter um bom pensamento. Isto é começar a tirar água do poço a baldes,  e praza a Deus, não esteja seco! Ao menos fazemos o que é de nossa parte, indo apanhar água e empregando os meios ao nosso alcance para regar as flores. Deus pode permitir que o poço esteja seco por motivos que só ele conhece, e sempre é para nosso maior proveito espiritual. Se fizermos, porém, como bons jardineiros o que está em nossas mãos, ele, sendo tão bom, sustentará as flores e fará crescer as virtudes, mesmo sem água. Chamo água às lágrimas, e na falta delas, refiro-me à ternura e ao sentimento interior de devoção.

Neste ponto, o que fará quem, após muitos dias de trabalho, só acha secura, desgosto, dissabor, tédio de ir tirar água? Deixaria tudo se não fosse, por um lado, a lembrança de que presta serviço e dá prazer ao Senhor do jardim, e, por outro, o receio de perder todo o serviço passado, além da recompensa que espera ganhar pelo grande trabalho de lançar muitas vezes o caldeiro ao poço e tirá-lo sem água.

Acontecerá frequentemente que nem poderá levantar os braços, isto é, nem conseguirá formular um bom pensamento, porque este trabalhar com o intelecto - fique entendido - é tirar a água do poço. Digo pois: que deverá fazer aqui o jardineiro? Alegrar-se, consolar-se e ter por enorme favor trabalhar em jardim de tão grande Imperador. Sabe que com isto dá prazer ao Senhor, e não é seu intento contentar-se a si, senão a ele. Louve-o muito e entenda que Sua Majestade lhe mostra confiança vendo que, sem paga nem jornal, tem tão grande cuidado do que lhe encomendou. Ajude-o a levar a cruz e pense que durante toda a vida o Senhor viveu nela.

Não procure seu reino aqui na terra, e jamais abandone a oração. Determine-se a permanecer toda a vida nessa aridez, e não deixe Cristo cair sozinho sob o peso da cruz. Tempo virá em que tudo lhe será pago de uma só vez. Não tenha medo de que se perca seu trabalho; serve a bom patrão, que o está olhando. Não faça caso de maus pensamentos. Lembre-se de que também o demônio os representava a são Jerônimo no deserto.

Tais trabalhos têm seu valor, bem o seu, como quem os passou durante muitos anos. Quando me acontecia tirar uma gota de água desse bendito poço, pensava que Deus me fazia favor. Sei quão penosos são esses trabalhos, e, a meu ver, para superá-los é preciso mais coragem do que para enfrentar muitas outras dificuldades do mundo. Mas também tenho visto claramente que Deus não os deixa sem grande prêmio ainda nesta vida. É certo, em uma só das horas nas quais o Senhor me permitiu alegrar-me nele, considero recompensadas todas as angústias que por muito tempo passei, a fim de perseverar na oração.

Tenho para mim que o Senhor envia esses tormentos e várias outras tentações que se apresentam - muitas vezes no início e outras no fim - para pôr a prova os que o amam, e verificar se poderão beber o cálice e ajudá-lo a carregar a cruz, antes de confiar-lhes grandes tesouros. E acredito que, para nosso bem, Sua Majestade quer conduzir-nos deste modo a fim de compreendermos o pouco que somos. Com efeito, tem reservadas para nós graças de tão alta dignidade, que, antes de as dar, deseja que vejamos por experiência nossa miséria, para não nos acontecer o mesmo que a Lúcifer.

Que fazeis vós, Senhor meu, que não seja para maior bem da alma que sabeis já ser vossa, pois entrega-se a vosso poder, resolvida a seguir-vos por onde fordes, até à morte de Cruz, com a determinação de vos ajudar a levá-la e de não vos deixar sozinho com ela? Quem vir em si tal determinação, nada, nada tem a temer! Gente espiritual não tem de que se afligir. Quem já está elevado a tão alto grau, de querer tratar a sós com Deus e deixar os passatempos do mundo, creia que a maior parte está feita.Louve a Sua Majestade. Confie em sua bondade, porque jamais faltou a seus amigos.

Feche os olhos da imaginação, e não fique pensando: por que dá devoção àquele em tão poucos dias, e a mim a nega em tantos anos? Creiamos que tudo é para nosso maior bem. Leve-nos Sua Majestade por onde e como quiser. Não somos nossos, mas seus. Bastante favor nos mostra em dar-nos disposição para cavarmos um jardim onde é Senhor, e trabalharmos junto dele, pois certamente está conosco.

Se permite que vicejem essas plantas e cresçam essas flores, dando a umas água tirada do poço, e a outras nenhuma, - o que tenho eu a ver? Fazei vós, Senhor, o que quiserdes, contanto que eu não vos ofenda, nem se percam as virtudes que já me destes, só por vossa bondade. Quero padecer, Senhor, pois vós padecestes. Cumpra-se em mim de todas as maneiras vossa vontade e praza a Vossa Majestade que algo de tanto preço como vosso amor não seja dado a gente que vos sirva só para ter consolações.

É muito de se notar, e assim digo porque o sei por experiência: a alma que nesta via da oração começa decididamente e consegue resolver-se a não fazer caso de aridez, quando lhe faltam delícias e ternuras, ou de consolação quando lha dá o Senhor, já tem andado grande parte do caminho. Não tenha medo de voltar atrás por mais que tropece, poque o edifício está assentado em firmes alicerces. Sim, o amor de Deus não consiste em ter lágrimas, nem tão pouco nesses gostos e ternuras que geralmente desejamos e com os quais nos consolamos, mas em servir a Deus com justiça, fortaleza de ânimo e humildade. O ter gostos mais me parece receber do que dar.

Para mulherzinhas como eu, fracas e inconstantes, acho conveniente que Deus as conduza com suavidades, como agora faz comigo para que possa sofrer alguns trabalhos conforme Sua Majestade dispôs que me sobreviessem. Mas servos de Deus, homens de valor, de estudos, de inteligência, dá-me desgosto vê-los preocupados e queixosos de que Deus não lhes concede devoção - como tenho ouvido. Não digo que não a aceitem e tenham em muita conta quando Deus a der, porque então Sua Majestade terá visto ser conveniente para eles. Quando, porém, não a tiverem, não se aflijam. Entendam que não lhes é necessária. Quando Sua Majestade a nega, andem senhores de si. Tenho visto e experimentado. Creio que é imperfeição não andar com liberdade de espírito e é enfraquecer-se com ânimo irresoluto para qualquer acometimento.

Nisto não me refiro tanto aos principiantes, ainda que muito insista com eles neste ponto. Importa muito começarem com essa liberdade e determinação. Falo principalmente para outros, pois haverá muitos que começaram de longa data e não conseguem sair do princípio, devido em grande parte - creio - a não abraçarem a cruz desde o início. Por esta razão andam aflitos, julgando que nada fazem. Não podem suportar se o intelecto deixa de trabalhar, mas a vontade se robustece e cobra forças, embora não o percebam.

Convençamo-nos de que o Senhor não apura estas coisas, que nos parecem faltas e não o são. Melhor do que nós, conhece nossa miséria e baixeza naturais, e sabe que estas almas já desejam amá-lo e pensar sempre nele. Esta resolução, eis o que o Senhor quer. No mais, a aflição que nos acabrunha só serve para inquietar a alma. Se está incapaz de tirar fruto durante uma hora, ficará na mesma quatro horas.

Muitas vezes tudo provém de indisposição corporal. Tendo disto grande experiência e sei que é verdade, pois o tenho considerado atentamente e consultado em seguida pessoas espirituais. Somos tão miseráveis que esta encarceradinha, que é nossa alma, participa das misérias do corpo. As mudanças de tempo e as variações dos humores fazem muitas vezes que, sem culpa sua, ela não possa realizar o que quer e padeça de todos os modos. Em tais condições, quanto mais lhe fazem violência, tanto mais dura o mal. É preciso discrição para ver quando é o caso, en ão atormentar a pobrezinha. Entendam que estão doentes; mudem a hora da oração, e às vezes será necessário que assim façam durante alguns dias. Passem este desterro como puderem. É bastante desventura, para a alma, que ama a Deus, ver-se tão miserável nesta vida. Não faz o que quer, pois tem tão mau hóspede como é o corpo.

Repito: é necessário ir com discrição, porque em algumas ocasiões será obra do demônio. É bom nem sempre deixar a oração quando o intelecto está muito distraído e perturbado, e nem sempre atormentar a alma obrigando-a ao que está acima de suas forças. Há outras ocupações de obras de caridade e leitura de bons livros, ainda que por vezes nem isto seja possível. Sujeite-se então a servir o corpo, por amor de Deus, para que ele muitas outras vezes sirva à alma. Tome alguns passatempos santos de conversações virtuosas, ou vá ao campo, conforme o conselho do confessor. Em tudo é grande coisa a experiência, que dá a entender o que nos convém. Em tudo se serve a Deus. Suave é o seu jugo. É grande sabedoria não trazer a alma arrastada, como se diz, senão levá-la com suavidade, para seu maior aproveitamento.

Torno a avisar, e não importa se eu o repetir muitas vezes, porque é muito importante: por securas, inquietações ou distrações nos pensamentos, ninguém fique atormentado ou aflito. Quem quiser adquirir liberdade de espírito e não andar sempre atribulado, comece por não se espantar com a cruz. Verá como o Senhor ajuda a levá-la. Deste modo viverá contente e tirará proveito de tudo. É claro: se o poço está seco, não podemos nós enchê-lo de água. O importante é que não nos descuidemos de tirá-la assim que a água começar a brotar, porque então Deus já quer por meio dela multiplicar as virtudes.

Sta Teresa D'Avila, Livro da vida. 11ª Ed. São Paulo: Paulus, 2010. p. 81-87.

O objeto natural da vontade - o Sumo Bem


"Não é a vontade humana, como apetite, cega em si, que está sabendo para que ela tende, impulsionada pela fome e sede de felicidade, apetecendo o bem correspondente que a sacie plenamente, mas é a razão metafísica que descobre a realidade necessária deste bem. Ela analisa, antes de tudo, o objeto formal da vontade como tendência natural. Este objeto não é tal ou tal bem, mas o bem como tal, bem como bem, sem nenhuma limitação. Daí resulta que a vontade humana, como apetite natural, tende para o bem ilimitado, a fim de saciar a sua sede de felicidade, o amor. A felicidade pode realizar-se só possuindo o bem correspondente à amplidão da aspiração natural. Esta amplidão é ilimitada. Portanto, o bem correspondente não pode ser encontrado em nenhum ente finito, mas só no Bem que concentre em si a totalidade do bem, ou seja, no Sumo Bem. Por isso o Sumo Bem é real. É impossível que o amor natural volitivo, reto, que proclama perante a razão metafísica a realidade do Bem sem limites, seja frustrado. O amor natural é sempre reto, não mente. Sem a realidade do Sumo Bem, a vontade no seu apetite natural seria contraditória, pois ela existiria assim lançada, porque existe e, ao mesmo tempo não existiria, porque o Sumo Bem, para o Qual tende inevitavelmente, que a atrai, não poderia existir. O Sumo Bem é Deus, como a metafísica evidencia competentemente. Deus, possuído como Sumo Bem, gera o amor e manifesta-se como Amor, Raiz profunda e última, a Fonte da felicidade."

LADUSÃNS, Prof. Dr. Pe. Stanislavs. Gnosiologia Pluridimensional. São Paulo: Loyola, 1992. p.26-27.
Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...