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O padre não é assistente social; está muito acima disso...


Joseph Ratzinger

Aí está um paralítico, pedindo esmola diante da chamada Porta Formosa do Templo de Jerusalém. Pede dinheiro para poder garantir o seu sustento, uma vez que não é capaz de construir por si mesmo a sua vida. Pede dinheiro como um sucedâneo da liberdade que lhe falta, como um sucedâneo da vida que lhe é negada. E então aparecem João e Pedro. Como são pobres daquilo que o mendigo lhes pede: "não tenho ouro nem prata"! Em contrapartida, como são ricos daquilo em que o paralítico não pensa e não ousa pedir, mas que é o mais importante: "Mas o que tenho eu te dou: em nome de Jesus Cristo Nazareno, levanta-te e anda!" (At 3,6)

Ao invés do sucedâneo, o paralítico recebe o impensado, o inesperado, aquilo que não ousava pedir. Recebe o que realmente importa: a própria vida. Recebe-se a si mesmo. A partir desse momento, pode erguer-se sobre os próprios pés, pode seguir o seu caminho, pode saltar - como diz o texto da Sagrada Escritura -, o que é um sinal de liberdade. E pode entrar no Templo, o que significa dizer "sim" ao Deus Criador, inserir-se no coro que entoa o "sim" da Criação inteira, tornar-se um "sim" a si mesmo e ao seu Criador.

"Não tenho ouro nem prata, mas o que tenho eu te dou: em nome de Jesus Cristo Nazareno, levanta-te e anda!" Nesta palavras, descreve-se de maneira válida para todos os tempos o conteúdo do ministério sacerdotal. Nem ouro nem prata: a nossa missão não é a transformação material do mundo. Numa época em que experimentamos tão a fundo a penúria material, a fome de tantos milhões de pessoas, numa época em que só parece contar o que é quantificável - ou seja, aquilo que se pode medir, calcular e tomar nas mãos como "fato" -, sentimo-nos imensamente pobres. E é compreensível que sintamos uma e outra vez a tentação de não ficar só em palavras - ao menos aparentemente -, palavras que parecem tão pequenas e tão impotentes diante das verdadeiras necessidades do mundo. Não, essa tentação de converter também o sacerdócio em assistência social e ação política, a fim de termos enfim algo de tangível e efetivo para oferecer, tem de ser vencida.

Aos poucos, temos começado a perceber que os homens não sentem fome apenas de pão e de dinheiro, mas que efetivamente sentem fome de palavras - dessas palavras em que lhes damos um pouco de nós mesmos, em que lhes damos amor. No fundo, é sobretudo de amor que vive todo o homem. Começamos a compreender que pecamos se não lhes damos esse dom, se o ocultamos envergonhados. E começamos igualmente a tomar consciência de que mesmo os milhões de pessoas que efetivamente passam fome neste mundo não se podem sentir satisfeitos, e na verdade nem ao menos são tratados de maneira justa, se apenas lhes damos um pouco de dinheiro para o pão. Também eles - e sobretudo eles - sentem fome de algo mais, fome de palavras, fome de receber as atenções do nosso amor.

Mais ainda: as nossas palavras, a nossa atenção, que pouco são! Não bastarão nunca! Temos que dar mais, e é nisso que consiste a grandeza do ministério sacerdotal. Temos que dar aquilo que o homem não procurava, que muitas vezes nem ao menos conhece, e no entanto constitui a sua autêntica necessidade. Por isso, não temos o direito de regular a nossa oferta pela procura: se o fizéssemos, privaríamos o ser humano do mais essencial, levá-lo=íamos a resignar-se com os sucedâneos e afastá-lo-íamos daquilo que importa e que é capaz de devolvê-lo a si mesmo. Temos que dar o nome de Jesus Cristo. É por esse Nome que a humanidade procura com tanta fome, mesmo que não o saiba, no meio das suas revoltas por causa das privações deste mundo. Ele é o dom que pode dar ao homem a sua liberdade, a liberdade de andar com os seus próprios pés, de caminhar, saltar e entrar no Templo do Senhor para tornar-se louvor, para dizer "sim" ao Criador, que em todas as angústias deste mundo continua a ser o nosso Salvador e nos quer incorporar ao seu "Sim".

Dar aos homens o nome de Jesus Cristo: este é o conteúdo permanente do ministério sacerdotal. Sempre me comovo quando, ao distribuir a comunhão, posso e devo dizer: O Corpo de Cristo - quando dou aos homens algo que é infinitamente mais do que tudo o que sou e tenho; quando lhes dou muito mais do que seria capaz de lhes dar apenas como ser humano; quando posso pôr o próprio Deus vivo nos seus corações.

Da mesma forma, é inaudito poder dizer-lhes no Sacramento da Penitência: Eu te absolvo. A ti, não ao elemento de uma coletividade anônima qualquer em que todos dizem: "Sim, é verdade, todos nós somos pecadores", e "Bem, no fim Deus terá piedade de nós", quando na verdade - como diz um poeta moderno - "não conseguimos deixar de ruminar o nosso passado mal digerido". Não, nada de coletividades em que, em última análise, eu, com o meu passado de culpas e misérias, não me sinto diretamente interpelado. Eu te absolvo.

Um amigo contou-me de um sacerdote, prisioneiro de guerra dos russos, a quem um clérigo não-católico procurou com o pedido de que o confessasse. O sacerdote perguntou-lhe: "Mas por que o senhor recorre a mim?" E a resposta foi: "Porque não quero conselhos, mas a absolvição". Isso é o que significa dar o nome de Jesus, dar o próprio Jesus, e dizer: "Estás livre. A tua culpa já não conta, foi-te tirado o peso do teu passado. Podes levantar-te, andar por ti mesmo, caminhar para Deus, saltar e louvar".

E inaudito é também podermos conferir na hora da morte a unção para a ressurreiçãoressurreição é o único remédio verdadeiro para a morte, de forma que até nessa hora em que ocorre a máxima paralisia neste mundo possamos dizer: "Levanta-te! Porque hás de erguer-te e retomar o teu caminho, e olhar o teu Deus nos olhos e louvá-lo. e já ninguém poderá roubar-te a tua liberdade".

Dar aos homens o nome de Jesus. Isto pressupõe, no entanto, que nós mesmos estejamos nesse Nome, que ele tenha sido invocado sobre nós. E aqui se revela o mistério mais profundo do sacerdócio: ninguém pode pronunciar por si mesmo o nome de Jesus; só Ele é que nos pode dar a autoridade necessária para fazê-lo.

Ao chamar o Profeta Jeremias, Deus disse-lhe: "Pus as minhas palavras na tua boca" (Jer 1,9). É justamente o que diz a cada um de vós [ordenandos] nesta hora: "Ponho as minhas palavras na tua boca". A partir de agora, podes e deves pronunciar as palavras dEle. Poderás dizer: Isto é o meu Corpo! Este é o meu sangue! E poderás dizer: Eu te absolvo. Com o teu eu? Não, porque nenhum homem pode dar-te poder para tanto. E também nenhuma comunidade, porque são palavras pessoais, exclusivas, de Cristo. É somente no Sacramento, no poder sacramental que o Senhor mesmo confere, que isso se pode dar, e é só assim que o seu Nome pode continuar a estar presente neste mundo.

"Ponho as minhas palavras na tua boca": em última análise, isso é também o que nos torna livres. Não precisamos reinventar nós a Igreja, a sua eficácia não depende da nossa eficácia, da nossa piedade, da nossa limitada capacidade de amar. "Ponho as minhas palavras na tua boca". Por isso, Deus aceitou que Jeremias tentasse contradizê-lo, afirmando: "Ah, Senhor, eu não sei falar, ainda sou criança (Jer 1,6). Quantas vezes não teimaremos dessa forma com o Senhor, embora a sua resposta permaneça sempre a mesma: "Mas se não és tu quem fala! Ponho as minhas palavras na tua boca". Assim serás livre e poderás falar, anunciar o Nome de Jesus, com toda a paz. É precisamente por falarmos no seu Nome que podemos ter essa grande serenidade interior, essa paz e essa liberdade sem as quais semelhante ministério seria insustentável. O que não significa, evidentemente, que possamos por assim dizer permanecer alheios ao que dizemos, como simples alto-falantes indiferentes. O sentido do nosso ministério só se realiza plenamente quando realmente começamos a pensar por nós mesmos os pensamentos de Cristo e assim a participar das suas palavras.

Com isto chegamos ao que nos diz o Evangelho de hoje. Há nele duas frases de Jesus relacionadas entre si: "Simão, filho de João, amas-me?" e "Apascenta os meus cordeiros" (Jo 21,15-17). Segundo estas palavras admiráveis do Senhor, amar e apascentar são a mesma coisa. Porque o "apascentar" - isto é, cuidar do bem das almas - só se realiza por meio do "amar", por um amar com o amor de Jesus Cristo. A eficácia dos Sacramentos não depende de nós e a Palavra não deixa de ser verdadeira mesmo quando nos acusa (e muitas vezes essas realidades hão de servir-nos de consolo). Mas só poderemos ser pastores de almas se apascentarmos, isto é, se nos tornarmos homens que amam, que amam com Cristo. Temos, pois, de voltar-nos para Ele: "Senhor, Tu que queres que eu fale por ti: dá-me esse Nome! Dá-me ao teu Nome, e dá-me o teu Nome!"

(...) Apascentar significa amar. Cuidar das almas significa amar com o amor de Jesus Cristo, o que por sua vez significa amá-lO e ser amado por Ele. Porque é assim que Ele nos apascenta.

Este amor a Jesus Cristo nada tem de adocicado, barato ou cômodo. Afinal, é este amor que nos conduz, como diz o Evangelho, ao cumprimento destas outras palavras: "outro te cingirá e te levará pra onde não queres ir" (Jo 21,18). Precisamos encontrar a amizade com Jesus, ouvir e reconhecer o pulsar do coração divino na Sagrada Escritura, para que, quando Ele nos cingir e nos levar para onde não queiramos ir, continuemos a reconhecer nEle o Amigo, o Coração de Deus, e saibamos que, por mais que nos custe, Ele está a conduzir-nos para o amor, a salvação e a liberdade.

Homilia do Cardeal Joseph Ratzinger por ocasião de uma ordenação sacerdotal na cadetral de Nossa Senhora de Freising, 27.06.1981.

Alguns problemas da RCC


"Devemos em tudo ser guiados pela lei do Cristo, o Homem-Deus, e pela lei da sua Igreja e de seus ministros, de uma forma humana, e por este meio remediarmos a nossa fraqueza espiritual e ignorância, encontrando nele abundante remédio para estas. Se abandonamos estas veredas, somos culpados não só de curiosidade, mas de grande ousadia: nada deve ser crido de modo sobrenatural salvo somente o que é o ensino de Cristo, o Homem-Deus, e de seus ministros, que são homens" (S. João da Cruz, Subida ao Monte Carmelo, Livro II)

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Tendo por base esta afirmação do doutor místico da Igreja e o artigo anterior que escrevemos neste blog, e buscando, o mais possível, isentar-se de qualquer paixão que impeça a objetividade, não vos parece estranho todo este movimento pentecostal que paira sobre sobre várias denominações ditas cristãs, fazendo uma abstração dos aspectos doutrinais que as separam? Isto não parece identificar-se com aquela "sopa mística" de que falávamos anteriormente?

Em geral, quando eu vou discutir com algum adepto do movimento carismático, já recebo logo, gratuitamente, toda uma leva de xingamentos e de pechos nada honrosos. Se eu reclamo que estou tratando de argumentos e não da vida pessoal do rapaz, passo a ser chamado de chorão ou de emotivo, etc.. rsrs, quando na verdade eu só quisera sustentar uma discussão sem ter que apelar para o ad hominem. Eu sempre afirmei que um dos motivos pelos quais a RCC é tão criticada reside no fato de ser tão mal representada. Se alguém inicia uma discussão com dúvidas a respeito do movimento, sai dela com a certeza de que os seus adeptos estão a seguir qualquer tipo de esquisitice. E vou dizer: poucas coisas são tão hilárias como um carismático imitando desajeitadamente a agressividade de um destes tradicionais freneticamente raivosos.

Tenho amigos carismáticos, muitos dos quais são ótimas pessoas, bastante ciosos no respeito. Portanto, não pretendo, nestes artigos que aqui ponho, fazer uma tola generalização a respeito dos adeptos do movimento pentecostal "católico", claro que não. Mas eu pretendo pôr argumentos aqui e eles são endereçados ao movimento, não ao pai ou à mãe de ninguém. Vamos lá, se me permitem.

Na outra postagem, nós criticávamos e negávamos a teoria de que os diferentes caminhos religiosos serviriam apenas de vias preparatórias para a experiência mística que seria, por natureza, supra-denominacional. Vimos que esta suposição não se coaduna com a visão católica. Logo, se alguém quiser adotá-la, que fique à vontade, desde que não se declare católico ao fazê-lo. S. Paulo escreve numa de suas cartas: "se alguém vos pregar um evangelho diferente do que vos temos anunciado, que seja anátema!" Isto serve para demonstrar um pouco do zelo que a Igreja sempre teve com a questão doutrinal. A heresia, como dizia um padre que agora me escapa o nome, é totalmente repugnante aos olhos divinos, porque ela nubla a verdade que é Deus mesmo. A Igreja Católica, guarda e mestra desta Verdade, nasceu do coração aberto de Cristo, pendente na Cruz! Não foi da unha, foi do coração. Cristo a ama profundamente e a ama com exclusividade, com a mesma fidelidade com que um esposo deve amar a sua esposa. Isto ficou compreendido?

O que acontece é que este movimento pentecostal é protestante de origem. E isto é tão fora de questão que mesmo as comunidades carismáticas o admitem. E o que, exatamente, foi o Pentecostes, o verdadeiro? Foi a descida do Espírito Santo sobre a Igreja. Percebem a pretensão? Como supor que, agora, o Espírito Santo, que é Deus, veio para a Igreja - como se em algum momento se tivesse ausentado dela - por meio da heresia protestante? É um disparate afirmá-lo!

E não se pode defender esta teoria sem aplicar um caráter muito secundário à doutrina da Igreja. Como dissemos, não se pode aderir a isto e permanecer católico. A verdade, que é dita de modo infalível pela doutrina católica, não tem essa mobilidade não.

Supor, então, que o Espírito Santo de algum modo se ausentou da Igreja é um disparate sem tamanho. Tudo bem, eles não o admitem expressamente, mas afirmam que houve, então, uma "primavera" ou um aperfeiçoamento da ação do Espírito Santo na Igreja. Vinda do protestantismo? Sei...

Vejamos o que diz o Papa Leão XIII:

"Não é, absolutamente, admissível excogitar-se ou guardar uma segunda, mais ampla e fecunda "aparição ou revelação do Espírito Divino"; a que atualmente se efetua na Igreja é deveras perfeita, e nela permanecerá incessantemente..." (Carta Encíclica Divinun Illud Munus - Sobre a Missão do Espírito Santo - Papa Leão XIII)

E, como já dizia alguém, contra fatos não há argumentos. O que se vê hoje na Igreja tem qualquer semelhança com uma primavera? Observem os desmandos litúrgicos, os pops e rocks cantados nas Missas; observem a apostasia, a quase total ignorância com relação à doutrina católica, a simpatia sem fim com os discursos protestantes, o sincretismo descarado. Isto parece uma primavera? Eu creio que não. Parece uma era glacial, mas como se diz lá em Nárnia, "aos dentes de Aslam, o inverno morrerá".

Bem, mas eles irão defender que o Catecismo da Igreja diz que há "elementos de santidade" em algumas dessas denominações. De fato, é este um ponto controverso do novo catecismo, e eu admito que não sei bem como conciliar esta afirmação com a doutrina de sempre. Se alguém souber, por favor me ensine. 

Seja como for, a tradição da Igreja e o seu maior doutor, Sto Tomás de Aquino, dirão expressamente que Deus não age extraordinariamente na heresia. Deixa eu explicar: Deus pode, a grosso modo, agir de duas maneiras: ordinariamente, isto é, de modo comum; e extraordinariamente. Como que Deus age ordinariamente? Ele nos mantém na existência, nos dá os meios de subsistência, etc. Como que age extraordinariamente? Pelos milagres ou outros sinais visíveis. São extraordinários porque não são comuns. 

No protestantismo, Deus age ordinariamente, tolerando a sua existência, por exemplo e, na medida do possível, segundo a abertura dos seus adeptos, pondo-lhes meios para conhecerem a verdade. Para alguém que não esteja minimamente familiarizado com estas querelas, tal modo de exposição parecerá muito pretensioso. Se isto surgir na alma do leitor, será indício de catequese insuficiente.

No entanto, Deus não age extraordinariamente no erro, pois fazê-lo seria como uma legitimação desse erro. E Deus detesta o mentira e quer que todos os homens se salvem justamente pela adesão à verdade. "A vida eterna é conhecer-Te, Pai", diz Jesus. "Ninguém conhece o Pai senão o Filho e quem o Filho O quiser revelar". Quem ouve a Igreja, ouve a Cristo; quem rejeita a Igreja, rejeita a Cristo. Portanto, o protestantismo, sendo uma atitude de revolta contra a única Igreja de Cristo, não conhece o Cristo, não conhece o Pai, não possui o Santo Espírito e não prepara ninguém para a eternidade. Se deixarmos de romantismo maçom, haveremos de concordar. O que estamos fazendo aqui são somente deduções.

Veja a este respeito esta oração do Papa Pio XII:

"Ô Maria, Mãe de Misericórdia e Sede da Sabedoria! Ilumine as mentes envolvidas na escuridão da ignorância e do pecado, para que eles possam claramente reconhecer a Santa, Católica, Apostólica, Igreja Romana, como a Única e Verdadeira Igreja de Jesus Cristo, fora da qual nem santidade nem salvação podem ser encontradas"

Esta conclusão de que nem santidade nem salvação podem ser encontrados fora da Igreja é uma consequência natural da compreensão dos princípios que vimos tratando. Aliás, a afirmação de que fora da Igreja não há Salvação é um dogma, proclamado no IV Concílio de Latrão. Para bem compreendê-lo, requer-se um certo estudo, pois há aspectos que devem ser considerados, como os casos de ignorância invencível. Não abordaremos este ponto por fugir da nossa pretensão com este artigo, mas queremos relembrar que a negação explícita de um dogma da Igreja gera excomunhão.

Se não há Salvação fora da Igreja, o que estaria o Espírito Santo fazendo no protestantismo e concedendo-lhes sinais extraordinários? Segurando as pessoas lá para que se percam? Vejam se isso não é uma blasfêmia! Ou será que Ele estaria lá inspirando esses que falam mal de Maria Santíssima, que blasfemam contra a Eucaristia, que chamam o Papa de a besta do Apocalipse e dizem ser a Santa Igreja a prostituta descrita por S. João?

Haveria muito ainda que dizer sobre este assunto, principalmente porque somente abordamos agora a questão da origem protestante do carismatismo e algumas implicâncias deste fato. Mas o tema pode ser discutido sob vários outros pontos, como a doutrina subjacente ao movimento, as práticas que ele mantém, os princípios aparentemente gnósticos, a sua tendência fenomênica, etc.

Para terminar, reforço que meu interesse é deter-me no movimento em si. Não me agrada xingar ninguém e se por acaso corro o risco de desagradar alguém por meio desta postagem, o faço pelo imperioso dever da caridade e por realmente desejar que a verdade seja conhecida sem mesclas, tal como a ensina a Santa Igreja. Se alguém se propuser a me responder, eu peço que, pelo menos por ora, não apele para elogios papais ou reconhecimento pontifício, etc. Estes são outros pontos que também são passíveis de discussão, é claro. Mas eu peço que, pelo menos a princípio, se atenha aos argumentos que eu pus aí acima. Resolvamos primeiramente este impasse e, então, poderemos dar prosseguimento. Se eu estiver errado, que alguém me mostre em quê.

Salve Maria Santíssima, esmagadora dos demônios e das heresias.

Fábio.

A mística independe da doutrina?

Êxtase de Sta Teresa D'Avila

Bem. Temos tratado recorrentemente sobre assuntos relacionados à doutrina da Igreja, sobretudo no que diz respeito a matérias teológicas e tal. E quando eu escrevo "temos", estou me referindo a toda esta leva de blogs católicos que têm se dedicado a fazer um trabalho alternativo de formação dos cristãos, já que, ao que parece, e sem querer generalizar, as catequeses por aí não deram conta nem de formar nos princípios básicos da doutrina católica nem de instigar um ulterior aprofundamento da mesma.

É, às vezes, com comoção que lemos os relatos de inúmeras pessoas que, ao entrar em contato com a infalível verdade católica, passam a respirar, depois de tanto tempo, ares frescos e convertem-se e agradecem veementemente a pessoa da qual Deus se utilizou para fazer resplandecer um raio da Sua luz puríssima.

No entanto, há pessoas até um tanto familiarizadas com certas questões teológicas, mas que persistem na prática de uma mística incorreta e adversa à verdadeira espiritualidade católica. Agem como se estes - doutrina e mística - fossem terrenos estanques, que não se comunicam, quando, na verdade, ocorre justamente o contrário.

Existe uma teoria que ganha cada vez mais adeptos mundo afora e que consiste em dizer que a mística ou a experiência direta com a divindade localiza-se num nível supra-denominacional. As diferentes religiões e doutrinas seriam modos imperfeitos, acomodados ao limite humano, de fazer compreender algo daquele "quê" transcendente. Uma vez, porém, que alguém alcançasse a experiência mística, já não seria preciso manter-se dentro dos limites doutrinários que seriam como que uma palavra penúltima antes da imersão no abismo místico. As religiões seriam, na verdade, tentativas sistemáticas de expressão da experiência do inefável. Como não se pode esperar que todos os homens sejam místicos, então os diferentes sistemas religiosos mantêm a sua vigência, pois, então, eles servem para fazer vislumbrar algo daquele mistério.

Esta doutrina do relativismo religioso em função de uma idêntica experiência mística, como eu falei, tem ganho cada vez mais espaço. S. João da Cruz, por exemplo, é muitas vezes instrumentalizado em discursos e palestras sobre o assunto e mostrado como exemplo desta teoria. Por ser chamado de "doutor do nada", é comum que se faça já uma precipitada identificação entre este nada e o nada budista, pretendendo mostrar como o termo - objetivo alcançado - dos diferentes sistemas é, na verdade, o mesmo. Mestre Eckhart, um sujeito místico e, no dizer de alguns, gnóstico - enfim, alguém suspeito mesmo -, embora de fundo cristão, é outro personagem constantemente evocado nessas discussões.

Um escritor católico, inclusive monge trapista, e de quem recorrentemente trago textos aqui, é também bastante criticado porque aparentou partilhar de uma teoria similar. É o Thomas Merton. Pelo que conheço dele, nunca vi nada explícito neste sentido, mas é certo que ele cultivava bastante interesse na mística oriental e passou os seus últimos anos em viagens pelo oriente, entrevistando mestres e autoridades em meditação, etc. Não consta, porém, que ele tenha jamais abandonado a sua fé.

Mas eu fiquei particularmente feliz quando, lendo um de seus livros, do qual tenho feito ultimamente várias transcrições para este espaço, e onde ele pretende fazer um minucioso estudo da teoria mística de S. João da Cruz - por quem o Thomas Merton torcia para que se tornasse o doutor comum em mística da Igreja -, vi que este monge retira qualquer suspeita de sincretismo e rebeldia à autoridade da Igreja e faz questão de demonstrar que aquela visão de S. João da Cruz como exemplo de uma mística alheia a qualquer doutrina é, na verdade, bastante equivocado e sem nenhum fundamento. Transcrevo abaixo, mais uma vez, alguns trechos:

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Não poderemos compreender bem a S. João da Cruz ou a S. Gregório de Nissa se não nos lembrarmos de que a sua mística é centralizada no Cristo. Mesmo sendo apofática a sua teologia mística, a experiência supra-conceitual que têm de Deus só pode consumar-se em Cristo. E, o que é mais, ela não pode em realidade dar-se sem o conceito do Cristo como Verbo Encarnado de Deus. Isso é essencial à mística evangélica.  "Ninguém vai ao Pai senão por Cristo"" (Jo 14,6)

Alguns escritores de fora da Igreja prestam aos grandes místicos cristãos a homenagem dum certo respeito. Os santos mesmos não se teriam sentido lisonjeados por isto. S. João da Cruz é tratado por alguns como um panteísta a viver atrás de uma fachada cristã. Isso concorda com a teoria que faz viverem juntos no cume do seu Olimpo os místicos de todas as religiões, longe das névoas da doutrina religiosa, do sacerdócio, liturgia, sacrifício, disciplina eclesiástica, e todas as outras aborrecidas coisas que separam a marcha comum dos homens em grupos religiosos. Pensam na prática que os místicos cristãos da "Noite" deixam o Cristo fora das portas de seu próprio Eden contemplativo. A idéia de um Verbo Encarnado é para a gente simples. Devoção a Cristo crucificado, meditação sobre a sua santa Humanidade, supõem-se tão relacionadas com a mística cristã apofática, como o Bakhti Ioga ao mais puro Raja Ioga da Índia. O Bakhti é uma forma respeitável mas reconhecidamente inferior da mística, em que os adeptos chegam à união com o Absoluto concebido sob uma forma pessoal.

Esta engraçada teoria pode cativar-se se deixamos de ler os mais importantes capítulos de S. João, passando sobre as suas doutrinas mais fundamentais como se elas não existissem. Na realidade, a mística dos Carmelitas espanhóis é centralizada em Jesus Cristo, verdadeiro Deus e verdadeiro homem, Deum verum de Deo vero, consubstancial ao Pai e nascido da Virgem Maria no tempo, morto na Cruz em redenção da humanidade, e que ressuscitou em glória e subiu aos céus, onde entronizou ao menos potencialmente a nossa natureza humana que Ele assumiu.

Isto é o mínimo exigido para a constituição de uma doutrina mística cristã. Mas o ensino dos carmelitas espanhóis, ou dos cistercienses franceses ou dos franciscanos italianos, ou dos Padres gregos e dos místicos do Deserto egípcio, não é [só] cristão, mas também católico. Quer isto dizer que ele não é só centralizado em Cristo histórico, mas que a sua contemplação é alimentada por esta extensão da Encarnação que é o Corpo Místico de Cristo, a sua Igreja visível, em que ela vive.

(...) Quando, portanto, S. João reconhece na razão um dos fundamentos da vida mística, é porque para ele a razão só preenche o seu ofício quando submete o homem à direção da fé. E esta não é um valor puramente subjetivo, pessoal, incomunicável. Ela tem o seu centro em Deus, revelado ao Corpo inteiro dos fiéis. Chegamos, assim, a esta importante conclusão: a razão é a chave da vida mística enquanto ajuda o homem a conformar toda a sua vida ao ensino e autoridade do Cristo que vive e atua na sua Igreja visível. Esta Igreja é uma unidade orgânica, com credo definido, corpo de leis, culto, chefe visível. A mística de S. João da Cruz não é apenas reconciliável com uma Igreja autoritativa e um sistema dogmático. Ela é efetivamente impossível sem isso. ( \o/ )

Thomas Merton, Ascensão para a Verdade, grifos meus.

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Creio que estas linhas sejam suficientes para demonstrar que a mística católica de modo algum cede à teoria da sopa mística que é defendida por aí. Mesmo quando o contemplativo chega a esta experiência de fato inefável, ela dá-se, sem dúvida, num nível supraconceitual, mas, mesmo aí, ela mantém-se genuinamente católica.

Fábio.

Restaurar e Impregnar tudo de Cristo

 S. Josemaria Escrivá

Instaurare omnia in Christo, é o lema que São Paulo dá aos cristãos de Éfeso: impregnar do espírito de Jesus o mundo inteiro, colocar Cristo no âmago de todas as coisas. Si exaltatus fuero a terra, omnia traham ad meipsum, quando for levantado ao alto sobre a terra, tudo atrairei a mim. Cristo, com a sua encarnação, com a sua vida de trabalho em Nazaré, com a sua pregação e milagres pelas terras da Judéia e da Galiléia, com a sua morte na Cruz, com a sua Ressurreição, é o centro da Criação, Primogênito e Senhor de toda a criatura.

A nossa missão de cristãos é proclamar essa realeza de Cristo, anunciá-la com a nossa palavra e as nossas obras. O Senhor quer os seus em todas as encruzilhadas da terra. Chama alguns ao deserto, para que se desliguem das vicissitudes da sociedade humana e, com o seu testemunho, recordem aos demais homens que Deus existe. Confia a outros o ministério sacerdotal. Mas quer a grande maioria no meio do mundo, nas ocupações terrenas. Estes cristãos devem, pois, levar Cristo a todos os ambientes em que se desenvolve o trabalho humano: à fábrica, ao laboratório, ao cultivo da terra, à oficina do artesão, às ruas das grandes cidades e aos caminhos de montanha.

Gosto de recordar a este propósito o episódio da conversa de Cristo com os discípulos de Emaús. JEsus caminha ao lado daqueles dois homens que perderam quase toda a esperança, a tal ponto que a vida começa a parecer-lhes sem sentido. Compreende a sua dor, penetra em seus corações, comunica-lhes um pouco da vida que nEle habita. Quando, ao chegarem à aldeia, Jesus faz menção de continuar viagem, os dois discípulos retêm-no e quase o forçam a ficar com eles. Reconhecem-no depois, ao partir o pão; o Senhor, exclamam, esteve conosco. Então disseram um para o outro: Não é verdade que sentíamos o coração abrasar-se dentro de nós, enquanto nos falava pelo caminho e nos explicava as Escrituras? Cada cristão deve tornar Cristo presente entre os homens; deve viver de tal modo que à sua volta se perceba o bonus odor Christi, o bom odor de Cristo; deve agir de tal modo que através das ações do discípulo, se possa descobrir o rosto do Mestre.

S. Josemaria Escrivá, É Cristo que Passa, Homilia pronunciada em 26 de março de 1967, Domingo da Ressurreição

Se vc quiser ir para o inferno - Pe. Paulo Ricardo

Vi estes videos no blog do Everth e vejo que vem muito a calhar, tendo em vista, além dos desmandos de certos católicos, as críticas recentes que o Pe. Paulo Ricardo tem recebido. Nos videos, a gente percebe por quê.



Mais do humor mertoniano

Discorrendo sobre as faculdades humanas durante a oração, ele segue:

"Mas em outras ocasiões, a razão e a imaginação podem fazer muito barulho. Nossa alma exterior prega sermões, reforma os mosteiros, reprova heréticos, passa em revista as faltas de outros contemplativos, desenvolve complexas teorias da vida interior, assume a direção espiritual de todos os conventos de monjas, urge os bispos a levarem uma vida de maior oração, e finalmente se torna Papa e governa a Igreja Universal com o aplauso de todos..."

Thomas Merton, Ascensão para a Verdade

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Estas linhas são engraçadas, mas nos falam de como andamos, por vezes, ocupados com a nossa própria promoção e em considerar a nossa própria excelência. E o que temos aí é uma vaidade travestida de espiritualidade, e como tal, coisa que não pesa mais que fumaça.

Resurrexit sicut dixit! Alleluia!


Haec est dies quam fecit Dominus, exsultemus et laetemur in ea
Este é o dia que o Senhor fez, alegremo-nos e nele exultemos!

Pequeno recesso; até a Páscoa!


Este blog fará um pequeno recesso e somente retomará as postagens na Páscoa. 
Que a Virgem Santíssima, aquela que estava aos pés da Cruz, nos ensine a viver santamente os mistérios que celebramos nestes dias.

Ave Crux Spes Unica

Na Cruz, eu te desposei...


S. João da Cruz
 Sob o pé da macieira,
Ali, comigo foste desposada;
Ali te dei a mão,
E foste renovada
Onde a primeira mãe foi violada.

Declara o Esposo à alma, nesta canção, o admirável modo e plano de que usou para a remir e desposar com ele, servindo-se dos próprios meios que haviam causado a ruína e a corrupção da natureza humana; pois assim como por meio da árvore proibida no paraíso foi essa natureza estragada e perdida por Adão, assim na árvore da cruz foi remida e reparada, dando-lhe ele ali a mão de sua graça e misericórida mediante sua paixão e morte, e firmando no alto da cruz a parte que havia sido destruída entre Deus e os homens, em consequência do pecado original. Diz então:

Sob o pé da macieira

Isto é, sob a graça da árvore da cruz, simbolizada aqui pela macieira, onde o Filho de Deus remiu, e, consequente, desposou consigo a natureza humana, e, portanto, cada alma, concedendo-lhe sua graça e penhores, para este fim, na cruz. Esta é a razão de dizer:

Ali comigo foste desposada,
Ali te dei a mão.

Querendo significar: a mão de meu favor e ajuda, levantando-te de teu estado miserável à minha companhia e desposório.

E foste renovada,
Onde a primeira mãe foi violada.

Tua mãe, a natureza humana, foi violada, de fato, em teus primeiros pais, debaixo da árvore; e também tu, ali debaixo da árvore da cruz, foste reparada. Se, pois, tua mãe, sob a árvore, te deu a morte, eu, sob a árvore da cruz, dei-te a vida. A este teor vai Deus descobrindo à alma as ordenações e disposições de sua sabedoria, mostrando-lhe como de modo tão sábio e formoso sabe ele tirar dos males bens; e, assim, aquilo mesmo que foi causa de tanto mal soube transformar em maior bem. As palavras literais desta canção são ditas pelo mesmo Esposo nos Cantares à Esposa: Eu te despertei debaixo da macieira; ali é que tua mãe foi corrompida, ali é que foi violada aquela que te gerou" (Ct 8,5).

S. João da Cruz, Cântico Espiritual, Explicação ao Canto XXIII

Cds para Download e Via Sacra Eucarística


Pessoal, quero disponibilizar dois Cds do Monsenhor Marco Frisina referentes à liturgia da Semana Santa e da Vigília Pascal. São muito bons! Em italiano, ambos.

Primeiro - Settimana Santa - Domenica della Palme - Giovedì e Venerdì Santo - Canti pela la Liturgia

Segundo - Veglia Pasquale - Canti per la Liturgia della Veglia

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Vai também a Via Sacra Eucarística de S. Pedro Julião Eymard (texto) - Clique aqui

A Sagrada Comunhão, régio festim das núpcias do Cordeiro Imaculado com a alma cristã.

S. Pedro Julião Eymard

''Desejei ardentemente comer esta Páscoa convosco'' Lc 22,15

É mister colocar a Comunhão no cimo da vida cristã, da qual é o fundamento, pois é na Comunhão que se conhece bem a lei do e se recebe a graça que lhe é própria. A Comunhão deve se tornar o eixo da vida, o pensamento dominante do espírito e do coração, a finalidade de qualquer estudo, da piedade, das virtudes.

Receber Jesus deve ser o ideal da vida e a sua lei, e todas as obras devem convergir para a Comunhão como para o seu fim, e derivar dela como de sua origem. Deste modo, todo ato que se pratica torna-se uma pequena flor- de preparação ou de ação de graças- que a alma se apressa em oferecer antes que murche.

A piedade então se torna viva; o coração está sempre em movimento para Jesus, e o movimento é a vida! A alma sai de si mesma para ter em vista somente o prazer de Jesus que reina em sua vida, pois que ela trabalha diretamente para ele, com ele e sob a sua orientação. É a sociedade de amor desejada por Jesus.

Eis o que imprime à comunhão o seu mais alto poder. É uma segunda e perpétua Encarnação de Jesus Cristo, numa palavra, é, para Jesus Cristo, uma segunda vida.

S. Pedro Julião Eymard, Flores da Eucaristia

A bondade e o amor de Cristo manifestados na Eucaristia


Imitação de Cristo

Alma - Senhor, confiado na Vossa bondade e na Vossa grande misericórdia, a vós recorro como doente ao médico; como faminto ao sedento, à fonte da vida; como pobre, ao Rei do Céu; como escravo, ao Senhor soberano; como miserável criatura, ao meu Criador; como angustiado, ao meu piedoso consolador. Mas onde mereci a graça de virdes a mim? Como se atreve o pecador a apresentar-se na Vossa presença? E Vós, como Vos dignais descer até ao pecador?

Vós conheceis o Vosso servo e bem sabeis que nada há nele que lhe mereça semelhante graça. Confesso, portanto, a minha vileza, reconheço a Vossa bondade, louvo a Vossa piedade e rendo-Vos graças pela Vossa infinita caridade. Vós procedeis assim comigo, não pelos meus méritos, mas por Vós mesmo, para que se manifeste em mim a Vossa bondade, para que uma grande caridade me seja oferecia e para que exerça mais perfeitamente a humildade. Portanto, já que assim Vos apraz e assim mandastes que se fizesse, recebo com alegria a graça que Vos dignastes fazer-me. Oxalá não lhe ponha obstáculos a minha iniquidade!

Ó dulcíssimo e benigníssimo Jesus, que grande reverência, que ações de graças, que louvores perpétuos não Vos devemos, por nos haverdes dado o Vosso santíssimo Corpo, cuja dignidade nenhum homem é capaz de explicar!

Em que pensarei nesta Comunhão, ao aproximar-me do meu Senhor, a quem não posso devidamente venerar e a quem desejo, contudo, receber dignamente? Que pensamento melhor e mais salutar posso eu ter do que humilhar-me profundamente diante de Vós e exaltar a Vossa infinita bondade para comigo? Eu Vos louvo, meu Deus, e desejo que sejais sempre louvado. Desprezo-me e submeto-me a Vós, no abismo da minha miséria.

Vós sois o Santo dos santos, eu o mais vil dos pecadores. Vós inclinai-Vos para mim, que nem sequer sou digno de levantar os olhos para Vós. Vindes a mim, quereis estar comigo, convidais-me para a Vossa mesa. Quereis nutrir-me com o manjar celeste, o pão dos anjos, que não é outra coisa senão Vós mesmo, "pão vivo, que descestes do Céu e dais vida ao mundo" (Jo 6,33-51).

Quão excessivo é, pois, o Vosso amor! Quão inefável é a Vossa bondade! Quantas ações de graças e louvores Vos são devidos! Como foi salutar e proveitoso o Vosso desígnio ao instituirdes este Sacramento! Como é suave e delicioso este banquete, em que Vós mesmo Vos dais em alimento!

Oh! Como são admiráveis as Vossas obras, Senhor! Como é potente a Vossa virtude! Como é infalível a Vossa verdade! "Falastes e tudo foi feito" (Sl 148,5) e não se fez senão o que Vós mandastes.

Coisa admirável, mas que exige Fé, porque excede o humano entendimento, é que Vós, Senhor, Deus meu, verdadeiro Deus e verdadeiro homem, estejais contido sob a aparência de um pouco de pão e de vinho, e que, sem serdes consumido, sirvais de alimento a quem Vos recebe.

Vós, Senhor de todas as coisas, a quem nada falta, pelo Vosso Sacramento quisestes habitar em nós. Conservai imaculado o meu coração e o meu corpo para que, com uma consciência alegre e pura, possa celebrar mais frequentemente os Vossos mistérios e recebê-los para a minha salvação eterna, pois Vós os haveis instituído especialmente para Vossa glória e para perpetuar para sempre a memória do Vosso amor.

Alegra-te, minha alma; dá graças a Deus por um dom tão excelente e por uma consolação tão singular, que Ele te deixou neste vale de lágrimas. Todas as vezes que celebras este mistério e recebes o Corpo de Cristo, representas a obra da tua redenção e tornas-te participante de todos os méritos de Cristo. Porque a caridade de Cristo nunca diminui e jamais se extingue a grandeza da Sua impetração.

Por isso deves preparar-te para este Sacramento com uma renovação espiritual constante, deves meditar atentamente neste grande mistério de salvação.

Quando celebras ou participas na Missa, esse sacrifício deve parecer-te tão grande, tão novo, tão digno de amor, como se nesse mesmo dia Cristo, descendo pela primeira vez ao seio da Virgem, se fizesse homem; ou como se, pendente da Cruz, sofresse e morresse pela salvação dos homens.

Imitação de Cristo, Livro IV, Cap. III

"O pão nosso de cada dia nos dai hoje" - Sta Teresa D'Avila sobre a Eucaristia


Vendo o bom Jesus que seu auxílio nos era muitíssimo necessário, buscou um meio admirável por onde nos mostrasse o seu excessivo amor por nós. Em seu próprio nome e no de seus irmãos, fez esta petição: O pão nosso de cada dia nos dai hoje, Senhor.

Por amor de Deus, compreendamos bem o que nosso bom Mestre pede. Para nós é questão vital não passarmos por alto sobre este ponto. Convencei-vos de que destes pouquíssimo e haveis de receber imenso tesouro.

Tenho para mim, salvo melhor parecer, que o bom Jesus, considerando o que havia prometido por nós, viu o quanto nos importava cumprir esta sua palavra. Por outro lado, percebeu as grandes dificuldades que nisto teríamos de superar, por sermos tão vis e inclinados a coisas da terra e termos tão pouco amor e coragem.

Para despertar-nos ele quis então que víssemos quanto nos amava. Isto não uma vez, mas, todos os dias. Resolveu então ficar para sempre conosco.

Sendo coisa de tal gravidade e de tanta importância, quis o bom Jesus que essa graça nos fosse concedida pela mão do eterno Pai. Ele sabia muito bem que seu Pai não deixaria de confirmar e aprovar no céu o que ele fizesse na terra. O pai e o Filho entre si são ambos uma só e mesma coisa. A vontade de um é a vontade do outro. Contudo era tão profunda a humildade do Filho que, por assim dizer, quis primeiro pedir licença a seu Pai, embora soubesse que era o objeto do seu amor e de sua complacência.

Entendeu perfeitamente que nesta súplica pedia mais do que em todas as outras, porque antevia a morte que o esperava e as desonras e afrontas que havia de padecer.

Que pai haveria, Senhor, que, tendo-nos dado seu filho - e que Filho! - e vendo o estado em que o pusemos, consentiria em deixá-lo entre nós e padecer de novo cada dia? Por certo nenhum, Senhor, senão o vosso Pai, e bem sabeis a quem pedis! Valha-me Deus! que grande amor o do Filho, e que grande amor o do Pai!

Todavia já não me admiro tanto do bom jesus. Tendo dito: faça-se a vossa vontade, e não sendo como nós, havia de cumprir a palavra de modo digno de quem é, com a perfeição de um Deus. Sabia que devia amar-nos como a si mesmo para cumprir a vontade de seu Pai. Assim andava buscando um meio, para cumprir este mandamento com a maior perfeição, embora muito à sua custa.

Porém, vós, Pai Eterno, como consentistes? Por que motivo quereis ver vosso Filho cada dia em mãos tão indignas como as nossas? Por uma vez que assim quisestes e consentistes a seu pedido, bem vistes o estado em que o deixaram.

Como pode vossa piedade presenciar diariamente - sim, diariamente - as injúrias que lhe fazem? E quantas não se devem hoje assacar a este santíssimo Sacramento! Em quantas mãos inimigas não o vê o Pai! Quantos desacatos por parte desses hereges!

Ó eterno Senhor! Como admitis tal petição? Por que dais vosso consentimento? Não vos guieis pelo amor de vosso Filho! A troco de realizar plenamente vossa vontade e de nos fazer benefícios, ele se deixará despedaçar cada dia.

Toca a vós, Senhor meu, providenciar o que é justo. A vosso Filho nada parece demasiado. Por que razão todo o nosso bem há de ser à sua custa? A tudo cala, não sabe falar por si, senão só por nós - não haverá quem fale em defesa desse amantíssimo Cordeiro?

Tenho reparado que só nesta petição, ele duplica as palavras. Primeiro diz e pede que nos seja dado este pão cada dia, e depois torna a dizer: Nos dai hoje, Senhor.

Apela para seu Pai, como a dizer-lhe que é nosso, já nos pertence porque o deu uma vez para morrer por nós. Não o torne a levar até o fim do mundo. Deixe-o para nos servir cada dia.

Não há escravo que de boa vontade confesse que o é: e eis que o bom Jesus parece gloriar-se de o ser. Isto nos enterneça o coração, e nos mova a amar sempre mais o vosso Esposo.

Ó eterno Pai! Por certo, bem meritória é esta humildade! Com que tesouro compraremos vosso Filho! Já sabemos que foi vendido por trinta dinheiros, mas, para comprá-lo não há preço que baste! Nesta oração faz-se uma só coisa conosco pela participação da nossa natureza. Como senhor e árbitro de sua vontade, faz ver a seu Pai que sendo ele dono da sua própria vontade, quer dar-se a nós. Assim diz: o pão nosso.

Não faz diferença alguma entre ele mesmo e nós. Entretanto diariamente nós o fazemos em demasia para não nos darmos cada dia por Sua Majestade.

Sta Teresa D'Avila, Caminho de Perfeição, VIII Parte.

Quinta Feira Santa - Dia da Instituição da Eucaristia - Ele amou-nos ao extremo


S. Josemaria Escrivá


Na véspera da festa da Páscoa, sabendo Jesus que chegara a sua hora de passar deste mundo para o Pai, tendo amado os seus que estavam no mundo, amou-os até o fim. Este versículo de São João anuncia ao leitor do seu Evangelho que algo de importante está para acontecer nesse dia. É um prâmbulo ternamente afetuoso, paralelo ao do relato de São Lucas: ardentemente - afirma o Senhor - desejei comer convosco esta páscoa, antes de padecer.

Comecemos desde já por pedir ao Espírito Santo que nos prepare para podermos entender cada expressão e cada gesto de Jesus Cristo: porque queremos viver vida sobrenatural, porque o Senhor nos manifestou a sua vontade de se dar a cada um de nós em alimento da alma, e porque reconhecemos que só Ele tem palavras de vida eterna.

A fé leva-nos a confessar com Simão Pedro: nós acreditamos e sabemos que tu és o Cristo, o Filho de Deus. E é essa mesma fé, fundida com a nossa devoção, que nesses momentos transcendentes nos incita a imitar a audácia de João, a aproximar-nos de Jesus e a reclinar a cabeça no peito do Mestre, que amava ardentemente os seus e, como acabamos de ouvir, iria amá-los até o fim.

Todas as formas de expressão se revelam pobres quando pretendem explicar, mesmo de longe, o mistério da Quinta-Feira Santa. Mas não é difícil imaginar em parte os sentimentos do Coração de Jesus Cristo naquela tarde, a última que passaria com os seus antes do sacrifício do Calvário.

Tenhamos em mente a experiência tão humana da despedida de duas pessoas que se amam. Desejariam permanecer sempre juntas, mas o dever - seja ele qual for - obriga-as a afastar-se uma da outra. Não podem continuar sem se separarem, como gostariam. Nessas situações, o amor humano, que, por maior que seja, é sempre limitado, recorre a um símbolo: as pessoas que se despedem trocam lembranças entre si, talvez uma fotografia, com uma dedicatória tão ardente que é de admirar que o papel não arda. Mas não conseguem muito mais, pois o poder das criaturas não vai tão longe quanto o seu querer.

Porém, o Senhor pode o que nós não podemos. Jesus Cristo, perfeito Deus e perfeito Homem, não nos deixa um símbolo, mas a própria realidade: fica Ele mesmo. Irá para o Pai, mas permanecerá com os homens. Não nos deixará um simples presente que nos evoque a sua memória, uma imagem que tenda a diluir-se com o tempo, como a fotografia que em breve se esvai, amarelece e perde sentido para os que não tenham sido protagonistas daquele momento amoroso. Sob as espécies do pão e do vinho encontra-se o próprio Cristo, realmente presente com o seu Corpo, o seu Sangue, a sua Alma e a sua Divindade.

Como compreendemos agora o clamor incessante dos cristãos, em todos os tempos, diante da Hóstia santa! Canta, ó língua, o mistério do Corpo glorioso e do Sangue precioso que o Rei de todos os povos, nascido de Mãe fecunda, derramou para resgate do mundo. É preciso adorar devotamente este Deus escondido. Ele é o mesmo Jesus Cristo que nasceu de Maria Virgem; o mesmo que padeceu e foi imolado na Cruz; o mesmo de cujo peito trespassado jorraram água e sangue.

Este é o sagrado banquete em que se recebe o próprio Cristo, se renova a memória da sua Paixão e, por meio dEle, a alma chega a um convívio íntimo com o seu Deus e possui um penhor da glória futura. Assim resumiu a liturgia da Igreja, em breves estrofes, os capítulos culminantes da história da caridade ardente que o Senhor nos dispensa.

o Deus da nossa fé não é um ser longínquo, que contemple com indiferença a sorte dos homens, os seus anseios, lutas e angústias. É um Pai que ama os seus filhos até o extremo de lhes enviar o Verbo, a Segunda Pessoa da Santíssima Trindade, para que, pela sua encarnação, morra por eles e os redima; o mesmo Pai amoroso que agora nos atrai suavemente a si, mediante a ação do Espírito Santo que habita em nossos corações.

A alegria da Quinta-Feira Santa nasce daí: de compreendermos que o Criador se excedeu no carinho pelas suas criaturas. E como se não bastassem todas as outras provas da sua misericórdia, Nosso Senhor Jesus Cristo instituiu a Eucaristia para que pudéssemos tê-lo sempre junto de nós e porque - tanto quanto nos é possível entender -, movido pelo seu Amor, que de nada necessita, não quis prescindir de nós. A Trindade enamorou-se do homem, elevado à ordem da graça e feito à sua imagem e semelhança, redimiu-o do pecado - do pecado de Adão, que recaiu sobre toda a sua descendência, e dos pecados pessoais de cada um - e deseja vivamente morar em nossa alma: Se alguém me ama, guardará a minha palavra, e meu Pai o amará, e viremos a ele, e nele faremos a nossa morada.

S. Josemaria Escrivá, É Cristo que Passa.

Há seis anos era eleito Sua Santidade Bento XVI





Breves recomendações

Vou passando rapidinho somente para indicar duas leituras:

1- Um texto da querida Teresa que traz um método para diálogo com não católicos no intuito de trazê-los à luz da Fé. Clique aqui.

2- Meditações sobre a Semana Santa divididas por dias no blog Sociedade Apostolado. Clique aqui.

A todos uma Santa Semana.

Ontem foi dia do amigo


Escrevi este texto ontem à noite, mas, quando terminei, a net havia caído. Disponibilizo-o hoje, então.
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Agora, no momento em que escrevo, é quase a transição para o dia 19 de abril. Provavelmente, quando eu venha a terminar este texto, já seja terça feira. Bom. Acontece que hoje, segundo eu soube, é dia do amigo e eu gostaria de escrever algo sobre o tema.

Quem tenha já um contato, pelo menos superficial, com as postagens que eu faço, haverá de notar que um tema recorrente, porque considero de capital importância, é o egoísmo, esta nossa tendência de satisfação pessoal em detrimento, por vezes, de um bem maior. A virtude, qualquer que ela seja, se encontra no campo oposto; é sempre uma vitória contra o egoísmo.

Hoje celebramos o dia do amigo. E convém perguntar: o que é um amigo? Antes de tentar responder esta difícil pergunta, notemos que a Sagrada Escritura nos dá, entre outras, duas advertências:

1- "Quem encontra um amigo, encontra um tesouro". Isto nos dá a idéia de que não é tão comum encontrar amigos, assim como não encontramos tesouros diariamente. Uma vez eu encontrei R$ 50,00 na rua, mas este é o tipo de coisa que só acontece uma vez na vida, rs. E 50 reais está longe de ser um tesouro. Outra coisa que esta afirmação nos diz é que uma amizade é algo muito valioso e que, portanto, não convém desprezar. Diz o ditado popular que quem rasga dinheiro tem problema. Quem despreza um amigo é o que, então? E não nos enganemos: nós desprezamos nossos amigos quando os trocamos por uma coisa de menos valor, ou quando os abandonamos por causa de uma tola discussão. Às vezes, e tenho visto isto, os amigos se separam por causa de um olhar estranho ou de uma fala má interpretada e, então, lá se foi a amizade. Conviria perguntar: então ela valia só isso? Por fim, os tesouros não se encontram em qualquer lugar. Do mesmo modo, não é em qualquer lugar que poderemos construir uma amizade. Claro que isto não é uma regra sem exceções. Assim como há, segundo dizem, tesouros enterrados em lugares inesperados, Deus pode fazer construir uma amizade a partir de encontros em lugares estranhos. Mas, para que a amizade seja verdadeira, é preciso que ambos estejam animados de bons sentimentos e afeto puro e isto, repito, não se dá em qualquer lugar. Por fim, mesmo depois que se sabe onde está o tesouro, convém investir nele, cavar, trabalhar e aprofundar a fim de que ele se faça notar e a amizade se construa. E então, diz o Evangelho, tendo aquela pérola, o sujeito será feliz.

2- "Escolhe os teus amigos no tempo da dificuldade", ou algo assim. Isto demonstra que a amizade não existe só nos risos, mas também nas provações e lutas da vida. E aqui, o preceito faz referência justamente ao egoísmo de que eu fazia menção acima. Estar com o outro quando há alegria e podemos participar desta alegria, é demasiado fácil e confortável. Um amigo, porém, deve estar acima disto: deve ser fiel, mesmo em face da dor, mesmo em face da tentação. Por vezes, pode haver algum tipo de oferta a uma pessoa, onde ela receberia qualquer benefício proveniente de uma traição ao amigo. Qual seria o mais fácil? Fazendo abstração da amizade, ceder. Mas o amigo se sacrifica, isto é, vence o seu egoísmo porque a sua amizade é maior. Aqueles, então, que permanecem mesmo quando o sol se esconde são os que demonstram uma amizade sólida, para além das circunstâncias.

E isto nos faz notar ainda um ponto: a amizade meio que dispensa o falatório; ela é algo sobretudo prático. O Oscar Wilde tem um conto em que ele descreve um sujeito que sabia tudo sobre amizade e encantava a todos com o que falava a respeito. Mas fica patente pela estória que este rapaz não entendia, sequer de longe, o que significasse ser amigo. Ele costumava usar seu suposto saber para fazer chantagens e conseguir de outros a satisfação de seus desejos. Termina a história, e ele mantém-se na mesma: crente de ser especialista em amizade, admirado pelos presentes, mas, no fundo, um imbecil. Pode haver estes tipos, e não são raros, que quase embargam a voz quando tratam do assunto, mas que, no fundo, passam ao largo de qualquer amizade prática. O importante aqui é compreender bem isto: o amor são obras, como dizia Jesus a um santo. Sendo que a amizade é amor, então ela é algo prático, mesmo quando esta prática signifique ficar quieto..

Nós podemos ter uma idéia do valor da amizade quando vemos que Jesus chamava os Apóstolos, aos quais muita amava, de amigos. Jesus era amigo dos Apóstolos, e estes estavam aprendendo a arte da amizade com Jesus. Haveria de chegar o dia em que eles manteriam sua fidelidade ao grande Amigo mesmo em face da morte.

A amizade é amor e, como tal, é vitória sobre o egoísmo. Todo tipo de amor provoca um certo êxtase (ek-histanai - pôr para fora), faz o sujeito sair de si em direção de um outro. Sto Agostinho dizia que o perfeito amor a Deus leva ao desprezo de si. Assim o amigo para com o amigo: ele nega satisfazer-se se, com isto, trai o amigo.

Se a amizade é amor, ela tem sua origem e fonte em Deus. É n'Ele que toda amizade é perfeita e, quanto mais uma amizade d'Ele se afasta, menos ela é amizade autêntica, chegando, por vezes, a ser como uma cumplicidade de pequenos crimes, isenta de qualquer virtude. Quando ela, no entanto, se fundamenta em Deus, é real e verdadeira e terá o suficiente para vencer o egoísmo de ambos. É então que, em Deus, ambos se fazem o bem mutuamente; não um bem subjetivo, mas um bem real, objetivo, segundo a vontade de Deus.

Este é um assunto muito profundo e não pretendo, nem de longe, encerrar a questão. Quis apenas fazer estas reflexões para, por fim, dirigir-me aos meus amigos e dizer-lhes que os amo. Peço perdão pelos meus erros e defeitos; peço perdão pelas vezes em que não fui o que um amigo deve ser; pelas vezes que me deixei levar por respeitos humanos, contra os quais luto bastante. E peço, por fim, a Deus que nos conceda sempre a graça da verdadeira amizade.

Fábio

Que amo quando amo a Deus?


Que amo eu, quando Vos amo? Nao amo a formosura corporal, nem a glória temporal, nem a claridade da luz, tão amiga destes meus olhos, nem as doces melodias das canções de todo o gênero, nem o suave cheiro das flores, dos perfumes ou dos aromas, nem o maná ou o mel, nem os membros tão flexíveis aos abraços da carne. Nada disto amo, quando amo o meu Deus. E contudo, amo uma luz, uma voz, um perfume, um alimento e um abraço, quando amo o meu Deus, luz, voz, perfume e abraço do homem interior, onde brilha para a minha alma uma luz que nenhum espaço contém, onde ressoa uma voz que o tempo não arrebata, onde se exala um perfume que o vento não esparge, onde se saboreia uma comida que a sofreguidão não diminui, onde se sente um contato que a saciedade não desfaz. Eis o que amo, quando amo o meu Deus.

Sto Agostinho, Confissões, Livro X.

Aniversário de Sua Santidade Bento XVI - 84 anos! Deo Gratias!





Hoje, dia 16 de abril de 2011, Sua Santidade Bento XVI completa seus 84 anos de vida. Toda a Santa Igreja celebra com o seu Sumo Pontífice o dom da sua vocação.

Feliz aniversário, Santidade! Que Deus conduza todas as tuas ações e a Virgem Santíssima configure o teu coração ao coração de Cristo, Bom Pastor.

Nós, do Anjos de Adoração, te amamos e reafirmamos a nossa obediência e submissão. Reconhecemos alegremente que tu és Pedro e que sobre ti está confiada a Igreja de Nosso Senhor.

Deo Gratias!

Grupo de Resgate Anjos de Adoração - GRAA

A Intuição Metafísica do Ser - Thomas Merton


Ultimamente, tenho feito várias transcrições do livro "Ascensão para a Verdade" do Thomas Merton. Há vezes que fico meio desconfortável por colocar tanta coisa só de uma fonte, mas é que eu encontro tantos tesouros e fico querendo compartilhar com os leitores aqui do blog, que nem tenho certeza se chegam a ler os artigos todos. Mas, eu recomendo muito a leitura das transcrições deste livro e os do Thomas Merton em geral disponibilizados aqui no blog. O Thomas tem alguns escritos, realmente, suspeitos, mas, destes, eu não os porei aqui. Enfim, aí vai mais uma pequena transcrição. São coisas que, sinceramente, me deleitam. Quisera eu que vocês também se alegrassem. Ah, e o senso de humor dele é muito bom. rs... Vamos lá.

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A ação de Deus na oração passiva aprofundou e alargou o poder natural da vontade em experimentar o prazer espiritual. Nada há de miraculoso nas novas capacidades espirituais que a alma descobre em si mesma. Elas fazem parte da sua natureza, mas tinham o seu exercício frustrado e entorpecido pelo apego aos prazeres sensíveis. Agora, estão livres e começam a recobrar frescura e vigor.

Quais são essas capacidades? Só mencionarei uma como exemplo. É o senso metafísico do ser e de todos os transcendentais. Muitas pessoas podem sequer compreender as noções abstratas do ser, verdade, beleza, unidade, como são propostas pelos filósofos. Não têm nenhuma capacidade para apreciar essas realidades, que para eles não passam de simples palavras. Para excitar o interesse dos que vivem aprisionados ao nível da experiência dos sentidos, e não têm familiaridade com o pensamento e a intuição filosófica, é preciso apresentar-lhes exemplos concretos e particulares de ser, de verdade e outros. (...) "Verdade", "beleza", só são apreciados em suas manifestações mais fragmentárias. Centenas de milhões de gordos cidadãos estão em vias de beber copázios de cerveja gelada. Centenas de milhões de moças exibem sabão, meias, cigarros, automóveis e um milhão de outras coisas, convidando os que contemplam tais anúncios a apreciar os produtos com olhos de consumidor. É tudo que vale como "ser" num mundo decidido a estourar-se.

Quando, pela prática da oração e a disciplina interior, um homem se livra das preocupações inúteis com o que é fragmentário e particular, e pode fazer um uso moderado das coisas materiais sem se deixar levar demais por elas, e quando Deus lhe alargou a capacidade de alegria espiritual com as graças infusas da oração, ele começa a experimentar alguns dos prazeres que pertencem por direito à alma humana, mas que muitos esqueceram. Metafisicamente falando, os valores que podem ser provados na experiência sensível de coisas particulares, podem ser desfrutados em forma concentrada e muito mais alta, numa intuição espiritual das propriedades transcendentais do ser. Procurarei explicar isto de um modo que seja aceitável mesmo àqueles que secretamente lamentam não ter estômagos infinitos para devorar todos os frangos fritos do mundo. Não nos é possível entrar na posse de toda a bondade dos alimentos existentes, simplesmente nos assentando para comê-los com a vista. Apesar das ambinções de Gargantua, os nossos corpos não são equipados para esse feito.

Entretanto, toda a realidade existente e toda a bondade de cada coisa que é boa, pode ser espiritualmente provado e desfrutado numa simples intuição metafísica do ser e da bondade como tal. O puro e intelectual deleite desta experiência faz de toda a embriaguês causada pelo vinho parecer um simples remanescente. Não falo aqui de nada místico, mas da mera intuição natural do ser, da bondade. Aqui o ser, a bondade, participados por todas as coisas particulares, são compreendidos numa simples intuiçõa luminosa que banha o nosso espírito de luz e alegria. É uma sorte de êxtase natural em que o nosso ser reconhece em si um parentesco transcendente com tudo que existe, e como que sai de si mesmo em busca de cada ser, e volta a si mesmo para achar todo ser. Num momento de rica iluminação metafísica elevamo-nos acima dos acidentes e das diferenças específicas para descobrir todas as coisas numa realidade transcendental sem diferenciação, a qual é o ser em si mesmo.

O fundamental dessa experiência é, sem dúvida, uma súbita penetração intuitiva do valor de nosso próprio ser espiritual. É uma profunda consciência metafísica da nossa realidade, não do eu superficial comum, psicológico, comprometido na busca de muitos desejos temporais e na fuga de muitos temores, mas da profunda realidade substancial de nosso ser pessoal. Neste momento de luz, a alma pode experimentar da liberdade inata que lhe é devida como uma propriedade do espírito. Ela pode até passar a uma intuição do Ser Absoluto que transcende absolutamente o nosso mais elevado conceito de ser e de espírito. Nesta intuição metafísica de que falo, a inteligência não entra numa visão imediata do Ser infinito. Deus é percebido numa inferência que parte do ser criado. Ele é conhecido no reflexo que deixa nas profundezas vitais do nosso espírito, do qual Ele é o Criador e que é o espelho onde se projeta a sua imagem.

E, no entanto, a intuição metafísica do ser e de suas propriedades transcendentais é uma grande coisa. Ela não pode dar-se sem alguma pureza moral e seu efeito natural é fortalecer a alma e ajudá-la a livrar-se de perigosas ligações. Através desta intuição há uma outra, a intuitiva apreciação do Ser Absoluto de Deus, uma intuição qualitativa, colorida de afetividade, em virtude da luz analógica derramada sobre a idéia do Criador pela intensa vitalidade e alegria que o espírito, consciente de ser a sua criatura, concebe em si mesmo.

É uma coisa tão grande essa intuição, que os filósofos pagãos pensavam que era a maior bem-aventurança. É de fato a maior a que pode o homem chegar por seus poderes naturais. Esse prazer, essa plenitude intelectual que é uma resposta parcial à mais profunda necessidade do ser espiritual do homem, a necessidade de contemplação, é acessível à natureza. Mas é sob a direção da graça que ela é atingida logo e mais perfeitamente.

Thomas Merton, Ascensão para a Verdade, Cap. XII

Interpretação da Primeira Parte da Santa Missa pelo medieval Guilherme Durand


“O canto grave e triste do Introito abre a cerimônia: ele exprime a espera dos Patriarcas e dos Profetas. O coro dos clérigos representa o côro dos Santos da Antiga Lei, que suspiram antes da vinda do Messias, que eles, entretanto não verão”.

“O bispo entra, então, e ele aparece como a figura viva de Jesus Cristo. Sua chegada simboliza o aparecimento do Salvador, esperado das nações”.

“Nas grandes festas leva-se diante dele sete tochas, para lembrar que, segundo a palavra do Profeta, os sete dons do Espírito Santo repousam sobre a cabeça do Filho de Deus. Ele se adianta sob um pálio triunfal, do qual os quatro carregadores são comparados aos quatro Evangelistas.

“Dois acólitos caminham à sua direita e à sua esquerda, e representam. Moisés e Elias, que se mostraram no Thabor dos dois lados de Nosso Senhor. Eles nos ensinam que Jesus tinha por Si a autoridade da Lei e a autoridade dos Profetas”.

“O bispo senta-se em seu trono e permanece silencio. Ele parece não desempenhar nenhum papel na primeira parte da cerimônia. Sua atitude contém um ensinamento: ela nos recorda pelo seu silêncio, que os primeiros anos da vida de Nosso Senhor se desenrolaram na obscuridade e no recolhimento”.

“O Sub-Diácono, entretanto, dirige-se para a cátera, e, voltado para a direita, lê a Epístola em alta voz. Entrevemos aqui o primeiro ato do drama da Redenção.

“A leitura da Epístola, é a pregação de São João Batista no deserto. Ele fala antes que o Salvador tenha começado a fazer ouvir Sua voz, mas ele não fala senão aos judeus.

“Também o Sub-Diácono, imagem do Precursor, se volta para o norte, que é o lado da Antiga Lei. Quando a leitura termina, ele se inclina diante do bispo, como o Precursor se humilhou diante de Nosso Senhor”.

“O canto do Gradual, que segue a leitura da Epístola, se reporta ainda à missão de São João Batista: ele simboliza as exortações à penitência que ele fez aos judeus, à espera dos tempos novos”.

“Enfim, o Celebrante lê o Evangelho. Momento solene, porque é aqui que começa a vida pública do Messias, Sua palavra se faz ouvir pela primeira vez no mundo. A leitura do Evangelho é a figura de Sua pregação".

“O Credo segue o Evangelho, como a fé segue o anúncio da verdade. Os doze artigos do Credo se reportam à vocação dos doze Apóstolos”.

“Quando o Credo termina, o bispo se levanta e fala ao povo. Escolhendo esse momento para instruir os fiéis, a Igreja quis lhes recordar o milagre de Sua expansão.

“Ela lhes mostra como a verdade, recebida antes somente pelos doze Apóstolos, se espalhou em um instante, no mundo inteiro”. 

Sacramento da Confissão - Uma constante na vida do verdadeiro cristão


Hoje nós teremos, aqui na cidade, um mutirão de confissões. Acredito que isto esteja acontecendo em várias paróquias distribuídas pelo mundo. O motivo desta ênfase é que vamos nos aproximando da grande Semana Santa, este tempo forte da Igreja em que celebramos dois grandes mistérios: o da morte do Senhor e o da Sua Ressurreição. Pela morte, Cristo nos redime; pela sua Ressurreição, Ele nos dá a maior festa da Igreja. Em um momento, estamos profundamente inclinados e pesarosos pelo sofrimento do Esposo. Em outro, extasiamos pelo reencontro com Ele.

Eu gostaria, então, de tecer algumas reflexões e fazer uma apologia à prática da confissão. Este é um assunto facilmente aceito pelos católicos que se mantêm fiéis à tradição e, para estes, o máximo que eu poderia oferecer seriam algumas reflexões piedosas. Porém, como nem todos que visitam este espaço são, assim, convictos da doutrina católica, creio que um artigo desta natureza possa fazer muito bem.

Antes de iniciar, quero evocar apenas dois fatos. Um se deu em alguns meses atrás, em que, conversando com uma adolescente, ao mesmo tempo em que ela manifestava o interesse em comungar, relutava contra a prática da confissão. Dizia ela: "não há sentido em confessar os meus pecados a um homem pecador como eu". Como eu respondesse: "Mas não é a um homem que confessamos, é ao próprio Cristo", a resposta veio rápida: "Nada disso! É um homem comum". Como eu ainda insistisse, veio uma resposta mais exaltada: "cada um com sua opinião." Eu relutei: "Não é opinião" e fui cortado asperamente com um imperativo: "E vamos deixar dessa conversa!". Por fim, eu dei uma modesta gargalhada...

O outro fato aconteceu precisamente ontem. Já depois da aula, esperando o ônibus pra vir embora, eu conversava com uma garota que, então, me perguntou: "quando é que vai ter a confissão comunitária?" Ao ouvir isto, eu pensei que ela tinha usado um termo inadequado para se referir à confissão auricular, mas com vários padres à disposição. Então respondi: "não é exatamente confissão comunitária, é individual, mas há vários padres e, em geral, a igreja fica cheia. Mas a confissão é individual. Vai ser amanhã." Ela agradeceu, mas insistiu no ponto: "é que uma vez eu fui a uma confissão em que o padre ficava fazendo umas perguntas pra todo mundo...". Respondi: "isso é invenção desse povo das CEB's e semelhantes que gostam de brincar com o sagrado. Mas isso não existe e a Igreja não aprova. Isso aí não perdoa pecados..." e a menina ficou surpresa. Tinham passado esse 'gato com lebre' nela. Depois de eu explicar um pouco sobre o que acontece na confissão, ela me testemunhou: "Acho que vou me confessar amanhã; a sua conversa me acendeu o desejo", e eu, obviamente, dei um "Deo Gratias", rsrs, mas em português, pra não espantar.. kk

Estes dois episódios reais falam da má formação de grande parte dos católicos de hoje. Imaginem o tanto de sacrilégios cometidos por quem se acha, porque "acordou bem", digno de comungar, se bem que nem se lembre de quando foi a última confissão. E, enquanto isso, do que estão falando nas catequeses e turmas de crisma? Estão cantando loas a Chico Mendes e ensinando lorotas relacionadas à planta num sei que, à mata num sei de onde e ao aquecimento num sei das quantas. E segue atualíssima a frase do livro de Oséias: "Meu povo se perde por falta de conhecimento".

É, então, importantíssimo que tenhamos uma formação correta sobre a Fé, sobre os mistérios que ela traz, sobre a dinâmica da vida espiritual. E não nos enganemos: este nosso apostolado, tão modesto, tem grande alcance. Aqueles que podem estudar, estudem! Deus fará com que sejam instrumentos da Sua graça.

Tratemos, então, deste sacramento da misericórdia.

Primeiramente, convém saber que ele tem fundamento na Sagrada Escritura. Diz Jesus: "Dou-vos autoridade para perdoar percados. A quem os perdoardes, eles serão perdoados; a quem os retiverdes, eles serão retidos". É bíblico; não tem nem o que questionar. Depois, não foi a qualquer um que Jesus disse isso; não foi no seu Sermão das Bem Aventuranças, nem quando multiplicou os pães. Foi na intimidade com os Apóstolos. Portanto, há uma elite espiritual, que são os que recebem o sacramento da ordem, a quem é dado o poder objetivo de, na pessoa de Cristo, perdoar pecados. Falando mais claramente: somente padres e bispos católicos têm esse poder.

Depois, porque convém contar o que se fez de errado? Para compreender isto, entendamos, primeiro, o que é o pecado. Ele é sempre um fruto da soberba, uma preferência pela própria satisfação egoísta em detrimento do bem, da verdade, enfim, de Deus. O soberbo é aquele que desobedece a Deus para satisfazer o próprio desejo. Todo pecado tem essa mesma raiz, desde Adão. O primeiro mandamento ordena amar a Deus sobre todas as coisas. Quando pecamos, amamos mais a nós mesmos do que a Deus. A soberba, então, se insurge contra Deus. E Deus resiste aos soberbos. Ora, qual é o oposto da soberba? A humildade. Deus revela sua graça aos humildes. E o que é a humildade? É o retorno da ordem, é quando o homem percebe a própria pequenez diante de Deus; é quando percebe que o seu prazer não deve ser mais importante do que a vontade divina; em suma, é uma reta consideração das coisas. O humilde é aquele que sabe se desprezar para amar a Deus. O seu centro está em Deus, assim como Jesus disse: "onde está o teu tesouro, aí está o teu coração".

Quando notamos a grandeza divina e, em contraste, a nossa pequenez, parece absurdo que, em algum momento, nós tenhamos nos insurgido contra Deus. A soberba é ridícula. Desta constação, surge o desejo de humilhar-se diante d'Ele, que é tão bom. Confessar-se miserável e humilhar-se é o modo de mortificar aquele amor-próprio, de atacar-lhe o âmago e de ferir-lhe de morte. É só quando nos esvaziamos deste modo que podemos estar aptos, novamente, para receber a graça de Deus. É o que diz Sto Antônio de Pádua: "é próprio do coração verdadeiramente contrito humilhar-se em tudo e reputar-se cão morto e pulga viva. Portanto o penitente por tal espírito de arrependimento é conduzido ao deserto da confissão."

No entanto, não basta uma atitude subjetiva. O que perdemos com o pecado foi algo real: o dom da graça, a virtude teologal da caridade, sem a qual ninguém agrada a Deus. Daí que, uma vez bem dispostos interiormente para a humilhação, devemos recorrer a alguém que possa, objetivamente, restituir aquilo que perdemos. E essa pessoa, conforme vimos, é o padre católico. Confessando, então, os nosso pecados, humilhando-nos diante do sacerdote, somos perdoados e, como afirmou Jesus, este perdão é confirmado no céu. De novo, somos o pecador que se converteu e que alegrou o céu. Isto, embora se dê sem nenhum alarde, é, na verdade, grandiosíssimo e é muito real.

Também Jesus, quando nasceu, não teve festa e, no entanto, nascia o homem mais importante de todos. Quando Ele morreu, não havia brilho e, no entanto, o Calvário redimiu o mundo. Creio que já está na hora de notarmos que esta discrição é um traço bastante característico de Nosso Senhor.

Aí alguns perguntam: "mas isso é muito confortável! Eu peco já pensando que vou me confessar e, depois, eu já fico planejando pecar e me confessar". Uma vez uma protestante me perguntou algo assim, pois ela dizia que até hoje não entendia isso. De fato, isso parece uma sacanagem e esta pode ser a dúvida de muita gente. Acontece, porém, que para a confissão ser válida, alguns requisitos são necessários. Quai são estes requisitos?

Primeiro: uma absoluta sinceridade. Poderíamos até dizer que este é o único, pois é ele que inspira os demais. No entanto, como somos cheios de pretextos para pecar, esclareçamos os pormenores. Para uma boa confissão, primeiro se deve fazer o exame de consciência. A Igreja recomenda que esta prática seja constante, e não apenas um estágio prévio para as confissões que muito escassamente fazemos. É muito conveniente que, todas as noites, antes de dormir, façamos um breve exame de consciência, que consiste em percorrer, com a memória, o que fizemos durante o dia, sondando as nossas intenções e a natureza mesma das nossas ações. Antes da confissão, porém, devemos fazer um mais aprofundado. Se já tivermos a prática do exame diário, não nos será difícil saber dos nossos delitos, uma vez que já estaremos acostumados a considerá-los. Isto ajuda no conhecimento de nós mesmos, donde provém a humildade que é base para todas as demais virtudes.

Depois do exame, devemos detestar aqueles pecados que cometemos e tomar a resolução séria de não voltar a cometê-los, adquirindo a disposição de nos afastarmos de toda ocasião que possa promovê-los.

Após estes pontos, é necessário decidir-se seriamente a contar todos os pecados mortais ao padre, por mais que eles sejam constrangedores. Lembremos que um padre não pode quebrar o sigilo da confissão, sob pena de excomunhão. Diz o código de direito canônico: "Guarde-se, portanto, muito bem o confessor de descobrir, no mais mínimo, ao pecador, nem por palavra, nem por qualquer sinal, nem de qualquer outra forma  e por nenhuma causa". Além disto, os padres já são acostumados em escutar os nossos podres e não é comum que se escandalizem. Portanto, o ponto essencial da confissão é uma sinceridade cristalina.

Uma vez contados todos os nossos pecados graves (os veniais também podem ser contados e até é conveniente que se o faça), ouviremos algum conselho do sacerdote, a absolvição e a penitência que nos será dada e que deve ser cumprida ciosamente. Pronto! Ao sair do confessionário, saímos como Lázaro que foi ressuscitado pelo Senhor. Foram desatados os nossos pés, o que nos permite retomar o caminho. Foram desatadas as nossas mãos, o que nos permite fazer atos sobrenaturais. E foi desatado o nosso rosto, o que nos permite enxergar e expressar a nossa verdadeira identidade.

Outra dúvida corrente: com que frequência o cristão deve se confessar? Alguns dizem: "mas a Igreja só pede uma vez ao ano, com comunhão na Páscoa". Mas isto é o mínimo do mínimo e acredito - não tenho certeza - que isto foi escrito deste modo tendo em vista aquelas pessoas que moram distantes, nas zonas rurais, e que costumam vir à cidade para a Santa Missa somente de tempos em tempos. A Igreja não abre mão deles.

No entanto, nós que podemos estar assiduamente na Santa Missa - se possível diariamente - não podemos aplicar isso a nós. Devemos ter uma constante com a confissão. Mesmo se não pecamos mortalmente, convém se confessar num prazo estabelecido. Há pessoas que se confessam, pelo menos, mensalmente. Há outros que se confessam semanalmente. E aqui convém esclarecer duas coisas:

Se eu me confessei ontem, mas voltei a cometer pecado mortal, eu já não posso comungar. Para voltar a receber o Corpo de Cristo, é preciso voltar à confissão. Não estamos brincando de um faz de conta! Estas realidades e efeitos sacramentais são muito reais. Quem ganha um grande prêmio e, minutos depois, o perde, fica sem o prêmio, não importa que somente alguns minutos se tenham passado desde que o recebeu. O que não podemos é planejar pecar, porque isso é falta de sinceridade e, como já dito, se alguém vai com algum plano semelhante pra um confessionário, a confissão é inválida! Depois, é preciso, como diz Jesus, "vigiar e orar". Estamos numa guerra; quem pensar que pode vencer pela própria força vai ser facilmente derrotado. Por isto a oração! E por isto a vigilância, para que não nos exponhamos, sem motivo, a ocasiões perigosas para a alma.

Mas, e quanto aos que não pecam mortalmente e, ainda assim, se confessam? Aquele que se confessa com frequência tem de dar conta da sua vida, das suas intenções, dos seus projetos ao confessor, apontando as suas falhas, por pequenas que sejam. Isto, como dissemos, aumenta o conhecimento de si mesmo,  favorece a humildade e mortifica a soberba, reafirma a disposição em seguir a Cristo, impede ou dificulta o cometimento de pecados graves pela proximidade das confissões, apaga os vícios, acende as virtudes e infunde maior graça na alma. Algumas pessoas, até padres, dirão que confessar-se toda semana é brincar com o sacramento. É possível, se a pessoa não for bem orientada. Mas, o que estes padres diriam se começássemos a citar inúmeros santos que se confessavam até diariamente? Então, não nos deixemos enganar! Estes argumentos falsos apenas pretendem satisfazer o comodismo, seja daquele que se confessa, seja daquele que confessa. E o que está em jogo, aí, é a vida da alma. Confessemo-nos, portanto!

Que a Virgem Maria imprima em nossas almas as disposições necessárias para uma boa confissão, a fim de que, passando pela morte de Cristo, alcancemos, com Ele, a vida eterna!

Ad Iesum Per Mariam

Fábio.
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