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Santidade...


Adentramos no mês de maio, mês de Maria, nossa Santíssima Mãe, iniciando com o dia de S. José, este homem silencioso, discreto, aparentemente comum. Nossa sociedade romântica e sensacionalista repara pouco em homens como José; vive ela distraída pelo que move os sentidos e tem o seu critério de beleza na satisfação da própria sensualidade. Não é à toa que vivemos num tempo de profunda irreligiosidade e apelo erótico, de constante ruído sonoro, de pouca interioridade e de materialismo frenético. S. José, com certeza, não poderia ser uma figura muito apreciada pelas massas de nossa era.

Como católicos, devemos reafirmar nossa atitude de inimizade com os sub-valores que por aí são como que impostos. É sempre atual a famosa luta da cidade de Deus contra a cidade dos homens, e nunca é demais frizar este aspecto, pois constantemente o mundo pretende tornar-nos Judas, traidores de Cristo e, infelizmente, a muitos tem conseguido transformar em apóstatas. O combate é, pois, inerente à própria vocação do cristão, embora muitos, numa interpretação subjetiva e errônea, façam da luta o principal motivo de seus "apostolados", desvinculando-a do amor, tornando-se esses mesmos, dessa forma, o epicentro de sua própria religião, numa atitude essencialmente semelhante à dos inimigos que combatem.

São José é para nós eminente modelo de santidade, e nos mostra que esta não se dá a partir de êxtases e rodopios, caretas e quedas, gritos e grunhidos ininteligíveis providos de uma falsa mística, mas antes, de uma firme e perseverante decisão pelo Cristo, num sempre atual amor por Ele e por Sua vontade. É, de fato, uma negação de nós mesmos, na mesma medida em que é o investimento pela própria realização da nossa vida; dizia Thomas MErton que o caminho para a vida é uma espécie de morte, e o mesmo confirma S. João da Cruz ao advertir-nos que a santidade não consiste em recreações, mas numa viva morte de cruz. Estranhos ao mundo moderno, é neste caminho que somos felizes, é aí que se torna pura e real a nossa alegria. A cruz é loucura e escândalo para os mundanos, mas, para os cristãos, é sabedoria divina, jeito de viver e amar e certeza do encontro com o Amado; é um caminho cuja alegria está, não só no seu termo (onde, de fato, se realiza num eterno êxtase de amor), mas que se faz presente desde já, na vida eterna começada.

Um problema se faz presente. Os vícios e as ilusões da vida mundana podem ser trasladados para a vida espiritual. E assim, não é difícil encontrar pessoas que cultivam uma vida cristã marcada pelo desejo secreto de honrarias, de grandes experiências, enfim, da auto-promoção - típicas transmutações do amor próprio. Também para os que nisso caem, S. José só pode parecer estranho e, não só ele, mas também Maria e o próprio Jesus, antes de sua vida pública.

Mas, o que será que esse povo (a Sagrada Família) fazia antes dos milagres e das demonstrações poderosas do Cristo? Há, realmente, um contraste entre a vida pública de Jesus e a vida escondida em Nazaré? É muito fácil que alguém se erga juiz dessas coisas e afirme a total diferença entre as duas realidades. Assim fizeram os gnósticos dos livros apócrifos que, considerando inaceitável uma vida ordinário do Cristo, lhe atribuíram desde a infância os mais variados milagres. De fato, muitos hoje vêem ainda dessa forma; a estes, Nosso Senhor se dirige, como a Pedro: "pensas como os homens, não como Deus" e, ainda, "estas coisas são reveladas aos humildes e escondidas aos soberbos". Acontece também que, mesmo que aceitemos o simples, o cotidiano na vida cristã, não são raras as vezes em que cultivamos uma preferência pelos grandes eventos, pelas grandes aclamações, pelo reconhecimento e até, Deus nos livre, pela fama.

Os que cultivam um cristianismo meramente exterior ainda não compreendem, sequer minimamente, a riqueza a que foram chamados. Mesmo quando falamos da importância da humildade, é fácil cultivarmos uma intenção soberba na nossa alma que anseia pela admiração dos demais. E tais coisas, se queremos ser perfeitos (e devemos!) devem ser combatidas. Aqui, cabe que compreendamos bem: o fato de sermos admirados ou elogiados não é um mal em si, mas o fato de desejarmos estas coisas sim, pois assim colaboramos com a vaidade, filha da soberba que se move em nós, e nos comportamos como ignorantes da nossa condição miserável, ao mesmo tempo que usurpamos a glória que só a Deus é devida, desejando-a para nós, furtando-nos de amar a Cristo sobre todas as coisas.

De todas estas virtudes, da maturidade de conhecer a pequenez humana, S. José é exemplo perfeito. No seu silêncio, no seu cotidiano, na sua pobreza, na sua obediência ao plano divino, na obscuridade da Fé que, então, era ainda mais densa, S. José nos ensina como ser cristãos, não de momentos e de palmas, não de afetações e barulhos, mas de amor, de silêncio, de vida comum e íntegra, de perfeição nas pequenas coisas, de justiça no trato com os demais, de responsabilidade pelas próprias obrigações, de oração constante, de mortificação, de entrega, de Fé.

Este pai tão nobre nos mostra que o que importa para Deus é o amor, o amor cultivado, no esquecimento das próprias vontades para a realização da Vontade de quem se ama. Não há verdadeiro cristianismo sem esta luta em favor do Amado, sem esta negação de si mesmo, sem este cultivo da intimidade com Deus, sem silêncio, sem mortificação, sem obediência. E, diante de tudo isto, se assumimos retamente a nossa vocação, é claro que não seremos apreciados pelas massas, é claro que o mundo nos combaterá, mas é claro também que, no íntimo de alguns corações, na alma de quem nem imaginamos, o fogo que arde no nosso coração acenderá outras chamas, de modo que, então, tal amor por um Deus Crucificado abrase o mundo. Só então se consumará a vontade do Cristo: "eu vim pôr fogo à terra, e como desejo que esteja aceso".

Fábio Luciano
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