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A visão nublada dos novos hereges


A Santa Igreja sempre reconheceu a necessidade de uma boa orientação para quem quer trilhar o caminho evangélico. Sabe ela da facilidade de cair em ilusões tão característica dos homens. Por isto, sempre mostrou a Verdade como algo que se deve conhecer, e não criar. A Verdade foi revelada, veio de Deus e, portanto, não é uma projeção do que se acha. Por isto mesmo, a Verdade é objetiva e una, porque corresponde a um Ser que existe realmente e que é Uno. Por isto também, a Verdade é imutável, visto que Deus também o é. Ela é conforme Deus, porque ela é Deus.

Visto que é preciso que o homem a conheça sem mancha, e visto estar ela acima da capacidade humana (é por isso que é Revelada), a Igreja deveria conservá-la pura, imutável, e ensiná-la aos homens. Dessa forma, ela seria exata, independentemente do contexto socio-histórico, pois, sendo atemporal, ela abarca toda a existência humana. É importante notar que o homem, em sua parte essencial, é sempre o mesmo. Em vista desta preservação da Verdade Imutável, a Igreja existe como hierarquia, e não como democracia. Nesta última, a maioria decide; na hierarquia, o critério se dá pela autoridade. A Igreja recebeu a autoridade do próprio Cristo, ao mesmo tempo que recebeu também a promessa da infalibilidade.

Com base nisso, era preciso que o fiel se submetesse ao ensino da Mãe Igreja, infalível, depositária da Verdade Revelada, e dela aprendesse a perfeição da doutrina cristã que representa o perfeito conhecimento de Deus e do mundo. Esse conhecimento seria, então, objetivo, pois corresponderia ao objeto do conhecimento, isto é, à Verdade, que existe por si só. Esta Verdade, uma vez que o homem a conhecesse e nela cresse, seria a luz, através da qual todas as demais coisas assumiriam sua real forma. Deus, em Seu Filho, dá significado a todas as coisas. Ele é como o sol, que é difícil enxergar diretamente, mas que, por meio de sua luz, permite a visão dos objetos. Assim é Deus que, uma vez que seja infinitamente superior à nossa capacidade, nos fornece a Sua luz que vem dar sentido e significação verdadeira a tudo. Disto nos falou Nosso Senhor: “Conhecereis a Verdade e a Verdade vos libertará”. Sabendo do perigo que o fiel correria ao buscar produzir sua própria verdade, S. Pedro, o primeiro Papa, escreve: “A escritura não está aberta à livre interpretação”. Com esta proibição acatada, não só a Verdade não seria distorcida, como também a alma do fiel não correria risco. Os que insistiam em crer de uma forma diferente, distorciam a fé e se enveredavam por falsos caminhos. Estes era chamados de hereges que significa alguém que decidiu seguir um caminho próprio. Esta posição seria muito perigosa porque além de corromper a alma do fiel, distanciando-O da Verdade objetiva, era também potencialmente um risco para outras almas que, uma vez movidas por seus desejos de novidades, e cegas pelas paixões, poderiam também perder-se. Pelo amor à Verdade e às almas, a Igreja sempre foi muito rígida neste sentido.

Contudo, com Lutero, a hierarquia da Igreja é desacreditada. Além de criticar costumes de alguns eclesiásticos, este herege ainda decide meter-se em assuntos teológicos, onde a Igreja tem o dom da infalibilidade. Contrariando a ordem de Pedro, Lutero estabelece uma nova forma de ler a Bíblia: o Livre Exame. Segundo ele, não mais o Espírito Santo iluminaria a Igreja que interpretaria as escrituras e ensinaria aos fiéis, mas, agora, cada um, ao ler a Sagrada Escritura, seria diretamente auxiliado pelo Espírito Santo. Com isto, Lutero faz de cada fiel Papa, pois lhe deu a autoridade de interpretar aquilo que só a Igreja tem. Esta nova prática da religião tem implicâncias muito vastas. Primeiro, porque faz questionar a necessidade de uma igreja, visto que o Espírito Santo se comunicaria de forma direta com o fiel. Segundo, as possíveis interpretações, provindas dos mais diversos tipos, seriam vários tipos de verdade,Sendo, muitas vezes, opostas umas às outras. Com isto estabelece-se forçosamente, ou o relativismo, ou a negação da verdade, ou, desconsiderando a oposição entre as muitas teorias, a visão de que uma seria complemetar da outra. O absoluto se desfaz. A verdade, antes crida como algo exterior, passa a ser produto do interior. O conhecimento passa a ser subjetivo, criado pelo homem que, com essa atitude, faz-se Deus, pois só Deus criou o mundo segundo o Seu pensamento.

A partir do livre exame da Escritura de Lutero, desastroso por sinal, vai surgir também o Livre Exame da realidade, que se tornará como que o absoluto do subjetivismo, produzindo o relativismo, o agnosticismo e o ateísmo, além de atacar os fundamentos da sociedade cristã. O mundo passará a ser mera criação do homem. Frases tipo “cada um tem a sua verdade” vão ser disseminadas num contexto de tolerância e, consequentemente, de negação de qualquer posição absoluta. A Igreja, como detentora desta posição, será odiada e criticada. Jamais abrirá mão de ser quem é... por isso mesmo, verá se cumprir a profecia de Jesus: “Se o mundo vos odeia, sabei que me odiou primeiro” e “muitos vos perseguirão”. Não obstante as várias seitas surgidas da desobediência e cegueira de Lutero e seus discípulos, atualmente têm surgido, mesmo no seio Igreja Católica, heresias que insistem manter o qualificativo de católicas. Isto caracteriza uma nova forma de heresia, mais velada e, por isso, de certa forma, mais perigosa. Segundo o Papa Bento XVI, enquanto ainda cardeal, a heresia que agora será tratada é algo novo na história, pois não assume característica de nenhum tipo anterior; por isso mesmo a dificuldade de identificá-la como tal.

Trato agora de uma heresia que tem, particularmente, me despertado repugnância: A chamada TL (Teologia da Libertação) bem como suas ramificações. Embora tenha nascido em berço católico, de católico mesmo ela só tem o nome. E não se trata bem de um nascimento, mas antes, de uma transmutação, um mascaramento. Ela não surge da reflexão da doutrina perfeita da Igreja, mas como um enxertamento da doutrina marxista, dentro do meio cristão. Vale lembrar que o marxismo é totalmente anti-cristão, chegando mesmo o Papa Pio XII a dizer que o socialismo e o cristianismo são inconciliáveis. Disse ainda que não se pode ser um e outro ao mesmo tempo. Daí se deduzir que a TL, marxismo mascarado de religião, não é católica. E, especificamente sobre a TL, ela foi condenada pela Igreja a partir da carta “eu vos explico a Teologia da Libertação” de Bento XVI, enquanto ainda Cardeal. Mas, dito isto, passemos às suas considerações práticas.

Assim como o materialismo surge como uma inversão de uma filosofia, a saber, o idealismo de Hegel, passando pelo materialismo de Feuerbach, caracterizando-se por um desprezo pela metafísica e uma depreciação da teoria, supervalorizando a práxis, assim também a TL, correspondendo à sua forma original, vai inverter a visão católica, menosprezando a espiritualidade e a oração, e pondo seu foco justamente na práxis, isto é, na ação social. E o que tem de cristão nisso? Nada. Mas, para enganar, ela se reveste de um cuidado pelos pobres. Assim, o foco da TL, rindo-se dos que cuidam da oração, seria a luta social pelos pobres. Nisto está justamente o perigo. Bento XVI explica que quando um erro encerra uma partícula de verdade, ele se torna nocivo, e tanto mais nocivo, quanto maior for esta verdade. Ora, o cuidado com os pobres é autenticamente cristão. Mas, utilizando-se disto, como lobo em pele de cordeiro, a TL aproveita para distorcer a doutrina cristã, invertendo mesmo a hierarquia de seus valores. Lembremos que também Judas Iscariotes, pra encobrir a sua avareza, fingia ter cuidado com os pobres. E dele, Jesus falou que seria melhor que nem tivesse nascido. Este lamento de Nosso Senhor seria sumamente verdadeiro também com relação à TL. E ainda, por usar dos pequeninos, os pobres, seria melhor que a TL amarrasse uma pedra ao pescoço e se lançasse no mar. Isto falo com relação ao movimento e, não necessariamente, com relação aos integrantes, visto a verdade ser intolerante com o erro, mas caridosa com os homens.

A TL, subertendo os valores cristãos, primeiro descentraliza-o da oração e o desfoca para a prática. Segundo, distorce esta mesma prática, aplicando-lhe os moldes socialistas e anti-cristãos. Terceiro, assume como referencial, não os santos e doutores da Igreja, mas os militantes do partido Comunista e os terroristas coloridos pela mídia, entre eles, o assassino Che Guevara.

Tal movimento, tão mascarado, assume uma aparência de objetividade, visto que põe toda a sua força na ação e na luta. Aos olhos humanos, parece que fazem mais do que os que rezam. Do ponto de vista materialista sim, embora, mesmo assim, estes resultados não sejam positivos. Interessante que, focando a prática social e menosprezando a espiritualidade, eles destroem, não só a matéria, mas a própria fé dos seus adeptos e das suas vítimas. Em suma, é um horror. Eles fazem aquilo que Sto Tomás ensina ser muito mais grave do que roubar dinheiro: corromper a Fé. Já tive a oportunidade de escrever algo sobre a prevalência da oração sobre a prática na Igreja, mas me utilizarei de mais esta, embora o faça de forma mais resumida.

Há uma hierarquia de valores na Igreja. Isto se dá, também, porque existe uma visão verdadeira do mundo, porque parte de uma verdade objetiva. A luz que emana desta verdade, como já foi escrito, é o que dá significado real às coisas. O metafísico prevalece sobre o físico, o espiritual sobre o material, o eterno sobre o temporal, a contemplação sobre a ação. A Igreja sempre ensinou que a prioridade seria a vivência da Fé a partir da oração. O cultivo da vida do espírito é que possibilitaria a mudança exterior, entendida, em seu sentido autêntico, como consequência e reflexo da transformação interior. Esta seria a base, o pilar. A oração seria, então, aquilo que daria significado e eficácia à ação.

Do ponto de vista puramente materialista, é preciso ter-se o próprio indivíduo como termo e força primeira da ação, o que caracteriza pura vaidade e nenhum conhecimento de si mesmo. No autêntico cristianismo, assumindo seu real lugar, a prática evangélica assume eficácia real porque não se fudamenta na própria pessoa, mas em Deus. Esta é a única forma de amar verdadeiramente, pois, quando o amor não vem de Deus, não é amor, mas apenas pura vaidade e orgulho. Se o amor não nasce do contato com Deus, do trato de amizade com o Cristo, a ação torna-se meramente ostensiva, distorcendo antes que consertando, atrapalhando antes que sendo útil. No entanto, é preciso ter olhos claros para ver isso. Se um vício atrai outro vício, assim como uma virtude atrai outra virtude, uma cegueira (a de querer ser útil por si mesmo) atrai outra cegueira (a de não perceber o próprio fracasso). É, por isso, necessário limpar os olhos e aprender a amar direito. E isto só se faz com a oração em primeiro lugar.

S. José Maria Escrivá escreve: “Em primeiro lugar, oração; em segundo lugar, expiação; em terceiro, muito em terceiro lugar, ação. S. João da Cruz escreve: “Deus espera de ti o mínimo de submissão e humildade, do que todas estas obras que pensas prestar-lhe”. Sta Teresa D’Ávila escreve: “A oração é a vida da alma”. O Beato Charles de Faucaul diz: “A oração é a respiração da alma”. Jesus, no início de Sua pregação, adverte: “Convertei-vos e crede no Evangelho”. Tudo isto, e muitas outras passagens do Evangelho e de tantos outros santos e doutores, sempre mostram a precedência da oração em relação à ação. É a atitude da mulher que gastou de seu precioso perfume nos pés do Cristo. Censurada por Judas, que era corrupto, foi elogiada pelo Salvador, e o perfume encheu toda a casa, porque foi gasto com o Cristo. Ademais, é preciso amar a Deus sobre todas as coisas; por isso, também, é preciso orar constantemente, como nos ordena Jesus. E não há amor sem oração.

Os que consideram que a simples ação resume a totalidade do Evangelho são tolos que vêem, justamente, a parte menor e menos essencial. Alguns ousam falar de mística social. Ora, que bagatela! Se todo o mal vem do coração, assim também todo o bem. Portanto, é do interior que surgem as ações. Se o espírito não ama, não trata com Deus, não é purificado, então a ação exterior será igualmente suja, corrompida, desprovida de verdade e profundidade.

A TL, em si mesma, já pretende esconder seu rabo luciferino. E, transmutando-se, assume de novo novas formas, como se pusesse novos véus de mentira; mas tais véus são sempre transparentes e o mau odor se faz sentir de longe por quem quer que queira observar. Movimentos sociais, na Igreja, são autênticos quando sustentados pela oração. Mas, infelizmente, há movimentos que estão se pervertendo com o mesmo ideal vaidoso e anti-evangélico da TL. Por trás de lemas tais como “luta, resistência, ternura...” vão se cegando, vão se levando ao abismo. São como cegos que guiam cegos e cairão todos no mesmo buraco. Estranhamente, encontram espaço no seio da Igreja, embora ninguém a fira tanto. Se voltam contra ela, permanecendo nela. Geralmente são grupos que querem assumir ideais modernistas, que querem a liberdade sexual, que querem a libertação dos “tabus”, o sexo livre. São pessoas para as quais, praticamente, já não existe pecado; o único pecado seria a “exploração” dos oprimidos pelos proprietários e donos dos meios de produção. Ora, se querem ser marxistas, vão para o PT, o PSOL, o PSTU... mas, infelizmente, a maioria já está lá. Querem permanecer na Igreja porque dão a parecer que mantêm um ideal religioso, mas, na verdade o que pretendem, é que em seio católico as suas opiniões tenham mais autonomia e mais liberdade, porque transvestidas de seriedade. S. Paulo os chamaria, sem medo, de inimigos da cruz, porque o são. Não entendem nada. Pensam não só como os homens, mas como os piores homens, afoitos, inclinados à baderna, permitindo a plena liberdade e satisfação de suas paixões.

Tudo isto é uma pena. Fere, machuca, faz sangrar a Igreja, Esposa Imaculada do Cordeiro. Mancha a sua belíssima Face. Estes inimigos traem Jesus com um beijo, enquanto o açoitam as costas. Querem questionar e contestar a Bíblia, não observam os dogmas. Se tornaram todos discípulos do Livre Exame de Lutero. E, se um livre exame medíocre já seria horrível; estes, ao estarem cegos, e fazerem o tal livre exame, tornam-se risonhos e ridículos, porque suas conclusões são miseráveis.

Deus nos diz: “permanecei na minha doutrina”, “não te desvies para a esquerda ou para a direita”, “se me amardes, fareis o que vos digo”. Por fim, Sto Afonso escreve: “Quem não reza, se condena”.

Sejamos fiés à Santa Igreja, sem medo do seus inimigos, os de fora ou os de dentro, mas sejamos soldados que defendem a Verdade divina, imutável e eterna, com amor. Conheçamos a Igreja, pratiquemos os seus ensinamentos, leiamos os escritos dos doutores, dos santos, dos papas, de todo o Magistério, a sua filosofia, a sua teologia, a sua mística. E, antes de tudo, rezemos e adoremos ao Cristo, na vivência dos Sacramentos. Cabe aqui o lema dos estudantes, quado S. João da Cruz tornou-se reitor de uma universidade. Conta-se que a maioria dos estudantes, dedicava-se bem aos estudos e eram, a maioria, bons místicos. O lema observado era: “homens de oração e homens de estudo; antes, porém, homens de oração”.

Fábio Luciano
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