E chegou isto que eu chamo de “meu dia”, o dia em que eu nasci. É interessante como os dias anteriores já me deixam um tanto comovido. Eu fico com um senso de gratidão. Os budistas dizem que o mundo é sempre tal qual o nosso espírito. Embora isto não possa ser entendido na sua literalidade, como alguns o pretendem, ele expressa uma verdade: o nosso modo de olhar para o mundo nos permite ver certas cores. Isso o dizia o próprio Paulo ao escrever que tudo é puro para os que são puros. Eis, pois, que, nesta época, o meu coração cheio de gratidão julga ver no mundo um colorido muito peculiar.
Este ano foi particularmente pródigo na demonstração dos afetos dos meus amigos. Talvez eu pareça insensível a tudo isso; não sei a cara que faço quando sou o alvo desses carinhos. Todos veem que eu sorrio, mas não sei se o julgam tratar-se somente de educação. Na verdade, a repercussão que tudo isto tem dentro de mim é bem maior, como seria de se esperar de um sujeito com temperamento melancólico sanguíneo. Porém, se foi um tempo de particulares atenções e delicadezas dos amigos, também foi um ano bastante difícil. A idade de vinte e sete anos, da qual saio hoje, é conhecidamente uma idade de tensões e dificuldades. Se estas são importantes para preparar o caráter do homem que está, aí, em formação, eu também fico feliz de avançar para uma nova idade, rs.. Houve e há muita dor, muita saudade, muita falta. Um senso muito agudo de que o curso da vida não segue todas as nossas determinações. A vida nos ensina duramente. Há dores afogadas aqui dentro e que permanecem muito vivas. Mas nada disso impede o senso de gratidão.
Quero, portanto, agradecer primeiramente a Deus que, além de me dar a vida – e de um modo bastante imprevisível -, ainda me concedeu, de ontem pra hoje, a graça da confissão e de tê-lo recebido na Comunhão. Esse foi, de longe, o melhor presente que eu recebi. Que Ele me dê a graça de permanecer fiel mesmo quando as demonstrações exteriores de afeto não forem tão pródigas. Mas quero agradecer também à minha família, à minha tia, ao meu irmão, que me expressaram seu carinho, e também aos demais que, talvez por timidez – o que eu compreendo muito bem – se reservaram a desejar anonimamente o meu bem. É suficiente.
Agradeço também, de forma muito carinhosa – e nem o sei expressar devidamente –, aos meus amigos; a estes que me cercaram, desde a manhã, com suas atenções e seus sorrisos. Tudo isso me surge como um prelúdio do céu. Eu sinceramente os amo. Que bom é poder viver tudo isso. Obrigado, meu Deus, por eles também.
Enfim, em todos os aniversários, gosto de relembrar que, enquanto ele significa mais um ano em que estou por aqui, também representa um ano a menos em que estou por aqui. Em outros termos: se ele marca a distância temporal da minha estadia neste mundo, ele também se refere àquele outro nascimento, mais real, para uma outra vida, também mais real, comparada à qual isto aqui é só um sonho. Então, se o aniversário é a celebração da presença neste mundo, também é ênfase de que tal presença é, ainda, espera. Esta alegria de agora é só um pardo aviso da outra. Se o aniversário, hoje, tende a passar, aquela outra vida será continuamente celebrada e não cederá lugar às tristezas. Será a contínua festa de aniversário; a festa que nunca acaba e que, de algum modo, nunca se torna rotina. Se os presentes recebidos agora são quase imprevisíveis e deles só temos certeza uma vez que os abrimos, o presente recebido lá – o nome que ninguém conhece a não ser quem o recebe – está seguro contra qualquer previsão. O olho não viu, o ouvido não ouviu, a mente não imaginou o que Deus tem preparado para os que O amam. Por isso, mais que tudo, peço a graça de poder amá-Lo, aqui, acima de todas as coisas. E não o peço apenas por interesse. Quero amá-Lo por Ele mesmo. A grande alegria do céu é a posse de Deus.
Enfim, termino com uma frase de Sta Clara de Assis, dita exatamente antes de ela morrer, e que sempre uso por estas datas: "Mil graças, meu Senhor, por me teres criado..."
E como o niver é meu, vamo de música
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