Realmente, essa é uma pergunta muito boa, para a qual talvez não exista uma resposta conclusiva, pois no fundo trata-se de um mistério.
Para entender como se chegou a essa situação, é necessário regredir um pouco no tempo em busca das raízes do problema. Sempre houve materialistas e ateus, como Epicuro e Demócrito, já nos tempos áureos da filosofia grega; mas, para nos restringirmos aos tempos modernos, podemos começar novamente com Descartes. Uma das suas preocupações era precisamente a de estabelecer (como postulado) uma separação radical entre a fé e a razão humana, criando compartimentos estanques e incomunicáveis dentro de cada ser humano, o qual teria assim uma espécie de chave que poderia ser ligada e desligada; ora pensaria e agiria como cientista, utilizando-se só da razão, ora pensaria e agiria como homem religioso, valendo-se da fé. A religião seria, nesse esquema, algo puramente voluntário e sentimental, em que a razão não teria cabida.
Um dos fatores que contribuíram para dar origem a essa atitude foram as guerras de religião do século XVI, cujas consequências Descartes chegou a presenciar; manifestações de fanatismo as mais diversas, em que cada grupo afirmava estar na verdade e queria convencer os demais pela força. Não é de estranhar que, até entre gente equilibrada, se levantasse a tentação de dizer que os assuntos de religião são como os sentimentos: cada qual tem os seus, como tem os seus gostos e preferências pessoais; é assunto sobre o qual de nada adianta discutir: os argumentos são muito mais passionais do que racionais. Que motivos racionais pode ter um torcedor para torcer por um time de futebol?
Ora, uma vez que se afirme que todas as religiões são iguais - que dependem do gosto de cada um -, o passo seguinte é uma indiferença absoluta, que no fundo admite que nenhuma delas está na verdade e nenhuma possui valores absolutos. A consequência é que não vale a pena aderir a nenhuma religião oficial e muito menos praticá-la.
O passo histórico seguinte foi o deísmo, corrente nascida na Inglaterra, segundo a qual Deus não seria senão o Grande Arquiteto do Universo que, tendo construído o mundo, o teria abandonado a seguir nas mãos do homem; neste caso, caber-nos-ia viver como se Deus não existisse, e portanto, seria preciso rejeitar a existência de milagres, da Providência ou de um Evangelho revelado, negando também qualquer intervenção de Deus na história humana. Cristo seria um grande profeta e até o maior dos homens, o que, na boca dessas pessoas, equivalia a negar que fosse Deus. A religião, a união com Deus, ficaria reduzida a um vago sentimentalismo, e a moral a umas simples regras de convivência entre os homens.
A partir daí, alguns filósofos ingleses começaram a autodenominar-se livre pensadores, querendo dizer com isso que estavam livres da superstição (isto é, da religião), e que aceitavam somente uma religião "natural", sem dogmas nem ritos; adotaram o lema "liberdade, igualdde, fraternidade", que seria assumido mais tarde pela Revolução Francesa.
O passo seguinte na evolução dessa linha de pensamento foi, naturalmente, o agnosticismo (se é que Deus existe, não é possível conhecê-lo), ou simplesmente o ateísmo. Por essa rota caminharam os filósofos da Ilustração francesa: Condillac, Diderot, D'Alambert, que Lênin recomendava como a melhor introdução ao "ateísmo científico".
Nessa trajetória nota-se, paralelamente à expulsão de Deus da vida e do pensamento, uma deificação do próprio homem. A atitude de Descartes atribui ao homem (à sua inteligência) qualidades que são exclusivas de Deus; Espinosa diz que o homem é parte de Deus; Kant atribui à razão humana um papel fundamental na constituição da realidade; Hegel, num panteísmo cósmico, deifica a razão humana, projetando-a como criadora de toda a realidade; e Feuerbach entroniza definitivamente o homem no lugar de Deus: "o homem é para o homem o ser supremo", idéia plenamente aceita por Marx. Finalmente, Nietzsche, como representante de muitos outros, proclama a morte de Deus.
O triste paradoxo embutido nessa atitude é que, ao tentar divinizar o homem, acabou-se por animalizá-lo, reduzindo-o a um plano infra-humano. A conclusão era lógica: se o homem não provém de cima (de Deus), só pode provir de baixo (da matéria); se a dignidade do homem provém de estar feito à imagem e semelhança de Deus, ao suprimir-se Deus suprime-se também a sua dignidade, e o homem passa a ser qualquer outra coisa: o homem é aquilo que come (Feuerbach); é puro sexo (Freud); provém do macaco (Darwin), que provém da matéria (os defensores atuais da geração espontânea), que provém do caos. Em perfeita consonância com esses princípios, pregaram-se as filosofias da inimizade; o príncipe deve dominar pelo medo (Maquiavel), o homem é o lobo do homem (Hobbes), a guerra, a luta e a contradição constituem a essência da realidade (Hegel), o ódio é o motor da história (Marx), o inferno são os outros (Sartre), devemos aprender a odiar (Lunatcharsky).
(...) A trajetória do idealismo, de Descartes a Marx, que acabamos de esboçar, pode ser vista por outro ângulo: o da caminhada do homem rumo à autosuficiência e à confiança no poder ilimitado da sua razão, a ponto de autodivinizar-se e de rejeitar qualquer limite que lhe venha de fora.
Jorge Pimentel Cintra, Deus e os Cientistas, pp. 47-50
O senhor até tentou explicar, mas acho que confundiu mais a cabeça de pessoas pouco instruídas. Há ateus analfabetos também, não apenas estudiosos. Há ateus que simplesmente não se encaixam no perfil que o senhor descreveu. Também há ateus que assim se tornaram por ter constatado grandes divergências entre as explicações para a origem do universo, da humanidade, das doenças e outras mais que as diversas religiões deram ao longo do tempo para a humanidade e que a ciência acaba por descobrir que as coisas se deram de modo bem diverso do que aquilo que está escrito nos vários livros sagrados, entre eles a Bíblia cristã e judaica. Há ateus em oposição ao fanatismo de muitas seitas e grupos religiosos defendendo o criacionismo tal qual está descrito na Bíblia.
ResponderExcluirTambém há ateus que mais se qualificariam como pessoas descrentes e decepcionadas com os muitos erros cometidos pelos mais variados líderes religiosos. Há pessoas que tiveram grandes decepções com certos pastores que dirigem suas igrejas como autênticas empresas comerciais. Há pessoas decepcionadas com o quantitativo de padres e bispos envolvidos com pedofilia e que ainda contaram com o acobertamento da hierarquia. Claro que isto não explica e nem mesmo justifica o ateísmo, mas decepcionar-se com a hierarquia de uma Instituição Sagrada ajuda a levar as pessoas pelo menos para o Ceticismo.
Este cidadão que escreve este texto conheceu na infãncia dois padres católicos, que embora não tenham consumado o pecado, tentaram abusar deste humilde filho de Deus. Como eu outros foram tentados, mas não tenho provas de que houve a consumação do hediondo pecado, mesmo porque na época me senti tão humilhado e até mesmo culpado de um pecado que jamais tive coragem de falar abertamente neste assunto e como eu devem existir outros.
Hoje não me defino como ateu ou agnóstico, mas como um cético, mesmo ainda frequentando a Igreja Católica. É muito difícil ser um bom cristão diante de tantos erros gravíssimos cometidos pelos líderes das diversas denominações e pior ainda é ver a cobertamento que eles recebem dos seus superiores.
Caro anônimo,
ResponderExcluirDesculpe a demora em responder ao seu comentário. É que ando com a internet bem mais restrita. Mas vamos lá.
Primeiramente, obrigado por visitar o nosso blog e por comentar.
Sobre o texto, ele não tenta dar conta da existência de todos os ateus, mas das razões pelas quais alguém pode se tornar ateu. Ora, decepções, tristezas, etc... todos temos, mas nenhum desses motivos pode ser considerado razoável para que alguém desacredite em Deus e afirme a Sua não existência. Além do que, a Fé dá sim conta da existência dessas coisas.
O texto, porém, se refere ao preconceito comum que tende a associar a erudição científica e o ateísmo, como se uma coisa levasse, necessariamente, a outra. Se o senhor anônimo é formado, se passou por uma universidade ou a frequenta, saberá como este tipo de crença infantil está enraizada naquele ambiente. Daí, o autor do texto procura mostrar que tal posição não tem fundamento, pois que, pela ciência, ninguém pode provar a inexistência de Deus. Ao contrário, a boa ciência aponta constantemente para a divindade.
Dizia alguém que aqueles que negam a existência de Deus, antes desejaram que Ele não existisse. Afirmar a negação da existência de algo é dizer, racionalmente, que este algo não existe. POrtanto, é racionalmente que se deve mostrar a impossibilidade dessa negação.
No entanto, vc evoca outras supostas razões para uma pessoa ser atéia. Que haja pessoas que tenham aderido ao ateísmo por estes outros motivos que vc levanta, eu não tenho dúvidas. Mas nenhum deles é motivo para tal. Pessoas que se rebelam e se tornam atéias pq perderam a mãe ou o pai, por exemplo, dão um salto ilógico, irracional, isto é, chegam a uma conclusão que não procede das premissas. Portanto, sua atitude não é razoável.
Se há ateus analfabetos, também, convém perguntar por qual motivo eles assumiram essa posição, pois custa-me aceitar que um ateu analfabeto tenha a dimensão do que seja o ateísmo. Muita gente se diz ateu por modinha.
Sobre as supostas divergências entre as "explicações científicas" e as explicações religiosas para certas questões, como a origem do universo, etc., eu gostaria muito que o senhor mas expusesse aqui. Pelo menos, algumas dessas divergências...
ResponderExcluirE, só então, a gente poderia conversar a respeito. Assim, genericamente, não vejo nenhuma legítima conclusão científica que destoe de alguma verdade cristã.
Sobre os ateus que se tornam tais por constatarem o fanatismo de alguém, isto é muito engraçado. Pq fanatismo há em todo canto. Há na ciência, há na arte, etc. O fanatismo de algum adepto de um campo específico não deslegitima a existência deste campo. Veja que tolice isso! É como alguém que não quer ir à Faculdade, pq um conhecido de um amigo seu é professor universitário e militante stalinista. É uma tolice.
Sobre o criacionismo, gostaria muito que o senhor me expusesse bons argumentos que refutem o criacionismo. Pode procurar onde quiser. Vá no "A origem das espécies" de Darwin ou em qualquer "bíblia" científica moderna. Traga-me uma linha que prove, cientificamente, a impossibilidade do Criacionismo. Pode procurar à vontade. O senhor me fala de sinceridade. Vamos lá, apelo para a mesma coisa. Depois que me conseguir esta façanha, traga-me somente uma prova científica da teoria da evolução. Qualquer experiência de laboratório, qualquer coisa que realmente prove, cientificamente, a validade da teoria.
Enquanto isso, me permita recomendar-lhe uns poucos textos:
Primeiro: http://angueth.blogspot.com/2010/11/por-que-academia-adota-evolucao.html
Segundo: http://angueth.blogspot.com/2010/12/um-pouco-mais-sobre-evolucao.html
Terceiro: http://www.santotomas.com.br/?p=94
Sobre as decepções com líderes religiosos, é outra balela.
ResponderExcluirHá erros em todo lugar. Isso só prova o que a religião diz há muito tempo: o ser humano é pó.
Uma religião, no entanto, deve fixar-se em Deus. Ao lado de tantos erros, como o senhor aponta, há casos de altíssima virtude. É falta de sinceridade notar só um dos lados. Se os pastores tentam ganhar dinheiro, é uma atitude individual deles.
Não reduza a religião a estes cretinos. Deixe-os e procure Deus noutro lugar. Se há padres que cometem o pecado infame de que o senhor fala, são uns miseráveis. Mas isso não tira a razão de ser da Igreja, nem o seu valor. Ao contrário, esperar perfeição de absolutamente todos de um grupo religios é ilusão, é desconhecer a natureza humana, é pura ingenuidade. Mesmo dentre os Apóstolos de Cristo, formados por Ele mesmo, houve um traidor. E pq isto? Não prova isto que Cristo não era Deus? Não, não prova. Prova, ao contrário, a sacralidade da liberdade humana. E a baixeza que o pecado pôs em nós.
Deus quer, justamente, que nos libertemos dessa baixeza e nos diz claramente: "Sem mim nada podeis fazer". Os padres que cometeram tais pecados são os que agiram sem Ele, sem o Cristo. Os ateus, coitados, são aqueles que O abandonaram de vez e, por isso, nada fazem que preste, e não sabem ver sequer a tolice das suas posições. Que Deus os ilumine.
Sobre o seu caso particular, meu caro. Eu realmente sinto. Sei que deve ter sido uma situação dificil. É realmente ultrajante e causa indignação. E a ofensa é ainda bem maior do que o que nós percebemos, pq estes padres ofenderam a natureza humana, remida por Nosso Senhor, ofenderam a Deus por um pecado que clama aos céus e, de modo muito particular, O ofenderam manchando o sacerdócio do qual foram revestidos. E isso é terrível!
No entanto, partir disso para uma generalização, desacreditando toda a Igreja, convenhamos, não é uma atitude inteligente.
ResponderExcluirSua experiência foi sem duvida dolorosa. Mas ela não deve te cegar. Ser cético significa não acreditar em nada. Se é esta a tua posição, desacredite de si mesmo, então. Desacredite que a descrença é a melhor atitude. Vê o problema disso? Olhe pra Cristo, meu caro. E ele, que é a Verdade, te irá iluminar.
O motivo de pessoas que aderem a esta posição tua é a fraquíssima catequese que receberam.
Outra: dizes que a hierarquia acobertou os casos. É possível que um ou outro padre o tenha feito. Mas dizer que a hierarquia o fez é, de novo, extrapolar o campo dos fatos. Se vc se dispusesse a estudar isso com seriedade, sairia dos factóides midiáticos e chegaria à verdade que é bem diferente desta que dizes. E é um desafio que te faço. Vá estudar isso a fundo. Procure saber pq Bento XVI era chamado de "tolerância zero"... Depois, impedir que o conhecimento de tais casos se espalhe é uma atitude de prudência; não de acobertamento. Muita gente poderia se escandalizar e desacreditar de Deus, o que é uma coisa terrível. Tentar lidar com a situação sem fazer enxame é uma atitude de cuidado com as almas.
Por fim, meu caro. Peço que reconsidere sua posição. Deus é muito bom! De Verdade! Há maus padres, mas há padres bons. Há santos vivos! Há gente séria! Não faça generalizações nem seja tão ingênuo... O Evangelho é uma via de perfeição, mas disto não decorre que todos queiram percorrê-lo. Muitos estão na Igreja, mas sequer se converteram. Não misture tudo, não
ResponderExcluirgeneralize. Há muitos que seguem corajosos e generosos. E não acredite nestes boatos pseudo-científicos nem nessas conversas de comadres, ainda que acadêmicas.. rs...
Que Deus o abençoe e guarde. Que a Virgem Santíssima o conduza.
Fábio.
Fabio, virei com mais tempo já ando cá a fazer leituras e
ResponderExcluirUaaaaaaaaaaaaa!!!!
Voltarei!
A sua pergunta deveria ser: "Por que existem pessoas que acreditam em Deuses". Estudando a história das religiões, podemos constatar que Deuses não são mais que crendices nascidas pela falta de conhecimento da época. Por mais que se tente argumentar que Deus não existe, os crédulos tentam arrumar argumentos para enganar a eles próprios. Os mesmos nunca procuram pesquisar para verificar se a sua crença realmente tem fundamento. Não vou alongar muito essa explanação, pois ficaria o resto da vida falando sobre isso. Vou fazer uma pergunta que pode soar como deboche, mas não é. Trata-se de um evidência que o crédulo evitar admitir. A pergunta é: "Por que você não pergunta a Deus o motivo de existir ateus? E se você já fez essa pergunta a Deus, por que ele não te responde?"
ResponderExcluirOlá Alisson, bendito seja Deus para sempre.
ResponderExcluirVc se equivoca em algumas coisas aí.
Vc tenta negar o absoluto da divindade a partir da absolutização da "história das religiões".. Primeiro, que a história das religiões faz apenas conjecturas sobre as diferentes manifestações religiosas. Porém, ela não é capaz de versar sobre a aspiração de transcendência intrínseca ao homem, simplesmente porque o transcendente transcende a história.
O fato de querer explicar tudo a partir da dimensão do devir, que é a história, numa atitude de fechamento imanente, é uma tolice rejeitada por qualquer filósofo de respeito, desde Parmênides, Sócrates, Platão, Aristóteles, passando pelos da Patrística, da Escolástica. Isto só vai se tornar moda a partir do renascimento que, no seu ódio por tudo quanto lhe lembre a divindade, vai se fechar e, justamente por isto, absolutizar a história, a horizontalidade.
No entanto, é consenso entre os grandes filósofos que este mundo não se explica a partir de si mesmo. A filosofia, para ser sadia, deve abrir-se à dimensão metafísica. Deste modo, ela poderá conhecer os fundamentos da realidade e, conforme ascenda, interseccionar com a mística.
A história das religiões estuda, a partir de critérios naturais, as possíveis gêneses das estruturas religiosas. Para tal, dizem que o medo e o desconhecimento eram fatores fundamentais. No entanto, isto apenas não esgota o fenômeno religioso. Ele é muito mais profundo.
Não há nenhum argumento possível para provar a não existência de Deus. Ao contrário, o âmbito do mistério é traço inerente à vida humana. Dizer, portanto, que não há Deus, é uma precipitação e um salto ilegítimo do ponto de qualquer argumentação lógica. Apenas alguém que esgotasse o real poderia dizê-lo. Por isso, o ateísmo, de todas as posições, é a mais incoerente.
Sobre sua pergunta no final: Por que eu não pergunto a Deus o motivo de existir ateus? Ora, eu não pergunto a Deus porque já sei a resposta.
Primeiro, porque o ser humano é livre e, como tal, ele pode escolher ver a luz ou fechar os olhos. Para alguns, é uma honra fazer parte do conjunto da criação. Para outros, porém, isto não lhes é suficiente; querem divinizar-se a si mesmos e, para fazê-lo, tentam excluir Deus. É a posição de Nietzsche que dizia: Não há Deus porque, se houvesse, eu não aceitaria não sê-lo.
Por fim, existem ateus porque, conforme diz Schopenhauer, "Desipere est juris gentium.”
Pax Christi