Conveniências e harmonias do Mistério da Eucaristia
Ao estudarmos a Incarnação e suas conveniências, dissemos que a glória e o amor de Deus a tinham tornado desejável, e as aspirações e necessidades do homem a faziam necessária; outro tanto podemos afirmar da Eucaristia que é uma Incarnação permanente e prolongada. Com efeito, a razão nos patenteia as conveniências supremas desta instituição, tanto por parte de Deus, como por parte do homem.
1º Do lado do Deus - Começou por criar tudo para o homem, com o fim de prendê-lo a si próprio pelo espetáculo das suas obras; conversou familiarmente com ele nos dias de inocência; em seguida, depois do pecado, aproximou-se dele, participando de algum modo ao governo da nação judaica que para si escolhera, dando-lhe sua lei, habitando no meio dela sob os véus do tabernáculo e do templo. Contudo, isso não era suficiente para seu amor, e veio um dia em que Deus, revestido de nossa carne mortal, quis, durante trinta e três anos viver no meio dos homens, e morrer por eles para os conquistar e salvar: foi a Incarnação.
Mas essa união com a humanidade ainda era incompleta; tinha três limites: 1º o do tempo: que coisa era, com efeito, uma vida de trinta e três anos no meio da humanidade que esperou a Incarnação durante quarenta séculos, e depois da morte de Jesus, devia prolongar-se ainda por muitos séculos? 2º o do espaço, porque Jesus Cristo só viveu num país estreito e apertado, e o mundo inteiro não gozou de sua presença; 3º afinal, a vista e a presença de Jesus Cristo ainda não tinham conseguido criar a união perfeita, íntima, a que prende os corações e as almas entre si... Ora, o amor de Deus ansiava por vencer essas três imperfeições e isso conseguiu pela Eucaristia.
Graças a esta invenção do amor e do poder divino, Jesus Cristo 1º viverá sempre, em todos os tempos, e perpetuará para todos o benefício da sua presença e da sua Redenção, por sua permanência no tabernáculo, por seu sacrifício constantemente renovado sobre o altar; 2º viverá em toda a parte, e fará beneficiar todos os países, todos os povos e todas as almas, da sua Incarnação, prolongada até o fim do mundo; 3º afinal unir-se-á de modo íntimo a cada um de nós, coração a coração, no ato incomparável em que nos dá sua carne como comida, seu sangue como bebida, e nos comunica a sua presença, a sua graça, vida e divindade, conforme a sua própria palavra: "Aquele que comer a minha carne, permanece em mim,e eu nele", e segundo a expressão de São Paulo: "Não sou mais eu que vivo, mas é Jesus Cristo que vive em mim!" É o último limite a que o próprio Deus podia chegar.
2º Do lado do homem - Por um excesso de miséria e de fraqueza, o homem sente a necessidade de encontrar a Deus e firmar-se nele. Para nos convencer disso, não precisamos de outras provas que o antigo erro do paganismo e o moderno erro do panteísmo, tão semelhante ao primeiro. Porque é que o homem encheu o mundo de ídolos feitos por suas mãos? É porque em toda a parte, a todo o momento, chamava Deus em seu socorro, reclamava sua presença, e não podia viver sem ele... Esta sede de Deus foi satisfeita pela Incarnaçao, e a idolatria desapareceu; contudo, esta vitória alcançada sobre o paganismo não se mantém senão pela Incarnação prolongada, isto é, pela Eucaristia.
Por isso, quando o homem se exime dessa crença e se separa de Jesus Cristo incarnado e presente na Eucaristia, anda em busca de Deus, e caminha diretamente para um novo erro: o panteísmo, isto é, uma forma de paganismo, estranha confusão de Deus e do mundo, onde tudo é Deus, e onde nenhuma coisa é Deus. No fundo desse erro há uma verdade sublime: é a necessidade de Deus, a sede insaciável de achá-lo e de se unir a ele. Pois bem! Só a Eucaristia pode satisfazer a esse desejo e a essa sede. O homem, graças a este mistério, encontra Deus na oração, ao pé do tabernáculo; no altar, no sacrifício eucarístico; na mesa sagrada, na comunhão em que Deus se incorpora à sua criatura, transforma-a, ilumina-a, contenta-a, e sacia-lhe todos os desejos, realiza-lhe todas as esperanças.
Monsenhor Cauly, Curso de Instrução Religiosa, Cap. VIII
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