Pode, na verdade dizer-se que, para mim, a santidade consiste em ser eu próprio, que, para vós, a santidade consiste em serdes vós próprios, e que, em última análise, a vossa santidade nunca será a minha e a minha nunca será a vossa, exceto no que respeita à partilha comum de caridade e graça.
Para mim, santificar-me seria ser eu próprio. O problema da santidade e da salvação consiste, portanto, e na realidade, no problema de encontrar o que sou e em descobrir o meu próprio eu.
As árvores e os animais não têm problema a resolver. Deus fá-los o que são sem os consultar e eles ficam perfeitamente satisfeitos. Conosco, é diferente. Deus deixa-nos a liberdade de ser o que quisermos. Podemos ser nós próprios ou não o ser, segundo a nossa vontade. Mas o problema é este: uma vez que só Deus possui o segredo da minha identidade, só Ele pode fazer-me o que eu sou, ou antes, só Ele pode fazer-me o que eu serei, quando, por fim, eu começar verdadeiramente a ser.
As sementes que, a todo o momento, são lançadas na minha liberdade pela vontade de Deus, são gérmens da minha identidade, da minha felicidade, da minha santidade.
Recusá-las é recusar tudo: é a recusa da minha existência e do meu ser, da minha identidade e do meu eu bem individual.
E se não me tornar nunca aquilo que estou destinado a ser e antes ficar sempre o que não sou, passarei a eternidade a contradizer-me, por ser, ao mesmo tempo, alguma coisa e nada, uma vida que quer viver e que está morta e uma morte que quer estar morta e não pode realizar completamente a sua própria morte, porque é, não obstante, obrigada a existir.
Dizer que nasci no pecado é dizer que vim ao mundo com um falso eu. Entrei na existência sob o signo da contradição, sendo alguém que nunca tive a intenção de ser, e, por essa razão, sendo a negação do que se pode admitir que eu seja. Assim, entrei, ao mesmo tempo, na existência e na não-existência, porque, desde o começo, fui qualquer coisa que não era.
Exprima-se a mesma coisa sob uma forma menos paradoxal: durante todo o tempo em que não sou nada mais do que aquilo que nasceu de minha mãe, estou tão longe de ser a pessoa que deveria ser, que poderia mesmo não existir por completo. Na realidade, valeria mesmo mais, para mim, não ter nascido.
Thomas Merton, Sementes de Contemplação
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