O documento emitido pelos senhores bispos por ocasião da 48ª Assembléia Geral que ocorreu estes dias em Brasília e que teve nas CEBs o seu tema central com vista a ressaltar o "seu já admirável espírito missionário", veio recheado de declarações no mínimo interessantes. Ao que parece, foi fruto de profundíssimas reflexões...
Dentre estas expressões curiosas que exaltam sem fim as CEBs, destaco algumas e ponho, em seguida, breves comentários.
- "Queremos reafirmar que elas continuam sendo um "sinal da vitalidade da Igreja"" (De que tipo de vitalidade será que se trata? Que vida os senhores bispos estão supondo ter a Igreja? Para os cristãos a vida é Jesus Cristo, e Ele nos transmite esta vida quando nossas almas estão em graça, isto é, isentas de pecado mortal. Dessa forma, munidos do dom da caridade somos agradáveis a Deus, belos aos Seus olhos. Do contrário, isentos da graça, nada do que façamos é bom, pois não participa da bondade de Deus e não O tem por fonte. Uma alma em pecado mortal, por exemplo, que ouse comungar, além de cometer sacrilégio, come e bebe a própria condenação, conforme escreveu S. Paulo. Consideremos, então, que a vida da alma é assunto central. Para que a tivéssemos, morreu Nosso Senhor no madeiro da Cruz. O próprio Cristo é a vida da alma e transmite esta vida pelos seus Sacramentos que a Igreja, fiel depositária dos Seus tesouros, bondosamente dispensa. Pois bem, qualquer movimento que queira ser "sinal de vitalidade da Igreja" deveria ter por prioridade a reta catequização das almas e o objetivo de sua entronização no Corpo Místico de Cristo. É isto o que caracteriza as CEBs?
De outro lado, tratando da vida física ou das condições dignas de subsistência, legítima preocupação da Santa Igreja, tais cuidados devem ser acompanhados por uma correta compreensão do ser humano na sua totalidade e a eficácia de todo e qualquer esforço humano depende intinamente da sua subordinação à contemplação e do cultivo da vida da Graça. As linhas de ação legítimas, que retamente provocam o bem aos irmãos necessitados levando em conta a integridade de sua natureza, estão descritas na Doutrina Social da Igreja. Qualquer um que queira verdadeiramente pôr em prática tais intentos será, de fato, sinal da vitalidade da Igreja. Tal não se pode ser, porém, se se recusa deliberadamente obedecer a mesma Igreja.)
- "Só uma Igreja com diferentes jeitos de viver a mesma Fé será capaz de dialogar relevantemente com a sociedade contemporânea." (É muito fácil vermos hoje afirmações deste tipo, cujo traço mais característico é a ambiguidade. Podem ser bem ou mal interpretadas, ao gosto do leitor. Isto é muito confortável pois, à medida que abre margem para interpretações as mais disparatadas, também funciona como uma espécie de redoma a proteger quem as proferiu, visto que nada está inequivocamente claro. A diversidade de jeitos de ver aí pode ser estendida ao infinito, incluindo também aqueles modos que não se coadunam com a compreensão da Igreja. Nem preciso ser mais claro... Parece que a grande intenção em frizar a necessidade desta diversidade é tão somente legitimar aquelas posições destoantes...)
-"Na verdade, os tempos se tornaram maduros para uma nova consciência histórica e eclesial: primeiro, pela emergência de um novo sujeito social na sociedade brasileira, o sujeito popular, que ansiava à participação; segundo, pela emergência de um novo sujeito eclesial, portador de uma nova consciência na Igreja. Ele ansiava participar ativa e corresponsavelmente da vida e da missão da Igreja. Esse sujeito provoca novas descobertas e conversões pastorais" (Isto parece-se muito com a realização do ideal gramsciano de hegemonia cultural, onde surge, dotado de um novo senso comum revolucionário, o novo sujeito, com estas novas consciências e a fazer estas novas descobertas. Nova consciência histórica, a identificar, pelo que se chama "hermenêutica da suspeita", as relações opressoras, sejam políticas ou econômicas, e que são vistas como as determinantes de todo o devir histórico. De outro lado, a nova consciência da Igreja que cede lugar a estas interpretações estranhas à sua natureza e, para tal, abre mão daquilo que lhe foi tão característico durante todo o tempo e que causava inveja no próprio Antônio Gramsci: a firmeza de sua doutrina. Tudo se torna questionável e, daí, surge esta nova espécime, com novas consciências das coisas (muito embora tais consciências sejam já tão antigas...)).
- "Os Encontros Intereclesiais das CEBs são patrimônio teológico e pastoral da Igreja no Brasil." (Não sei do que se orgulhar... rs...)
- "A realidade das CEBs se expressa na liturgia e também na diaconia e na profecia." (Concordo com a primeira parte... Vê-se claramente a grande [des]graça que as CEBs representam para a Liturgia, profundamente obedientes que são. Deve ser a "nova consciência" litúrgica. Fizeram da Missa qualquer coisa diferente do Calvário. É verdade: "a realidade das CEBs se expressa na liturgia".)
- "O protagonismo dos leigos nas CEBs é expressão viva de uma Igreja que se renova animada pelo Espírito Santo" (Protagonismo dos leigos, isso mesmo. Leigos auto-gestionários, que se formam a si mesmos. Não vejo aí nenhum motivo de elogio, senão tão somente uma sombra da velha auto-suficiência. E isto talvez esclareça a razão da fraqueza doutrinária de muitos. Sugere-se no texto que isto se dá, também, pela dificuldade de acesso aos sacerdotes, mas não se pode generalizar. Mesmo à distância, contatos são possíveis, visitas são agendadas. Ainda que, hoje em dia, ouvir um padre infelizmente não seja garantia de se aprender algo interessante, o protagonismo leigo apenas se me apresenta como uma inversão da hierarquia. Parece que a velha relação dialética projetada nos sujeitos de classes distintas, forçando-lhes a oposição, se manifesta também aqui, onde parece transparecer qualquer sombra desta revolta contra os superiores. Mas isto é apenas suposição minha. Seja como for, o texto exalta as CEBs, além de mil outras razões, por ser sinal de comunhão eclesiástica. Mas fato é que não vejo este povo ser fiel ao Papa, aos concílios anteriores ao Vaticano II e nem sequer a este último, a não ser com as já tão conhecidas acrobacias hermenêuticas... Recentemente, ouvi que um Cebiano afirmava algo engraçado. Dizia ele que o Vaticano providencia para que lá estejam os padres mais bonitos esteticamente. Dizia isto para fazer supor intenções duvidosas por parte do Santo Padre e dos demais que lá convivem. Claro que é um caso isolado, pelo qual não se pode julgar todo o movimento; mas pelo menos mostra um pouco que sequer o respeito pelo Sumo Pontífice é ponto tocado lá dentro. Some-se a isto, a gravidade da afirmação, a imprudência de dizer isto num meio qualquer, e o nenhum comprometimento com a verdade das coisas.)
-""O ministério da Palavra exige o ministério da catequese a todos porque ‘fortalece a conversão inicial e permite que os discípulos missionários possam perseverar na vida cristã e na missão em meio ao mundo que os desafia.""(DGAE 64; DAp 278c). A vida em comunidade já é uma forma de catequese. Ela predispõe para o aprofundamento da fé e da vida cristã por meio do ministério da catequese e também pelo testemunho fraterno de seus membros". (Quero frizar, primeiro o início desta citação: "O ministério da Palavra exige o ministério da catequese". De fato... Por que, então, se prega quando não se foi retamente catequizado? Será esta, de fato, uma preocupação real? Ou está aí meramente para enfeitar? Depois se diz: "A vida em comunidade já é uma forma de catequese". Interessante. A primeira afirmação estabelece uma tensão, enquanto que esta segunda parece poder servir para arrefecê-la, para satisfazê-la, senão de todo, ao menos em parte.)
-"o surgimento das CEBs, junto com o compromisso com os mais necessitados, ajudou a Igreja a “descobrir o potencial evangelizador dos pobres”. (Já seria estranho afirmar que as CEBs ajudaram a Igreja a descobrir o que quer que fosse. Isto soa imensamente pretensioso.. Agora, afirmar que foram as CEBs que ajudaram a Igreja a descobrir o potencial evangelizador dos pobres, é realmente o cúmulo. Ora, a Igreja sempre estabeleceu que, embora fosse mais próprio do clero o ensino, os leigos não estavam isentos, no entanto, de fazê-lo, devendo contribuir, à medida de suas forças e possibilidades, para o alastramento do Reino de Deus pela adesão das almas à Igreja. No texto, parece-se querer fazer referência ao aspecto itinerante da evangelização, onde os pobres se mobilizam a visitar outros pobres. Primeiramente, obviamente que a Igreja jamais se opôs a coisas dessa natureza; ao contrário. Mas convém notar também que a faculdade de evangelizar supõe que o evangelizador seja preparado. Nem sempre se encontram estas condições e, em especial, nos dias de hoje em que vivemos o espetáculo de ver até mesmo sacerdotes minimamente formados a soltar toda espécie de pérolas. Portanto, se as CEBs representam uma novidade, é com certeza com relação à sua imprudência neste sentido e em tantos outros.)
-"As vocações religiosas e sacerdotais despertadas pelas CEBs sinalizam vitalidade espiritual, comunhão eclesial e um novo estímulo de consagração a Deus." (vitalidade espiritual? Como a última assembléia geral dos bispos onde os fiéis, por conta própria, molhavam o Adorável Corpo de Nosso Senhor no Seu Santíssimo Sangue e, por si mesmos, comungavam? Isto é o que se chama vitalidade espiritual? Comunhão eclesial? Como a obediência ao Papa no que diz respeito a não aderir à ideologia da libertação? Novo estímulo de consagração a Deus? Seria tal estímulo qualquer coisa semelhante à garantia de ser marxista sem precisar ser importunado?.. Não sei...)
-"a Igreja no Brasil exorta as CEBs e demais comunidades eclesiais a se manterem fiéis à própria fé, no conteúdo e nos métodos, na busca da libertação plena, superando a tentação “de reduzir a missão da Igreja às dimensões de um projeto puramente temporal.” (Se manterem fiéis à própria fé.. hum... como dizia o Kiko, "Que será que ele quis dizer?". "No conteúdo", isto é, na TL (será???!!!) e nos métodos (não!!!!!). Por fim, se diz que se busca a libertação plena (uau! É o céu!!!), superando a tentação de reduzir a missão a um projeto puramente temporal. É curioso que isto possa ser uma tentação pra um católico... Seja como for, a exortação faz transparecer: 1) que a tendência é essa, pois "tentação" é geralmente uma "tendência" contra a qual deve-se lutar, ou, como dizia Nosso Senhor, fugir. O ideal, portanto, seria fugir pra bem longe das CEBs.. rs... 2) que parece haver uma busca de conciliação disforme entre o ideal materialista e a concepção espiritual do homem, o que leva a uma série de contradições.
Mais uma vez eu repito: não se trata de condenar todo e qualquer projeto social que tenha por objetivo tornar mais justas as relações entre os homens. Mas tal projeto deve obedecer necessariamente à chamada Doutrina Social da Igreja, e não à ideologia marxista que, infelizmente, ainda enche os olhos de muitos ditos católicos, inclusos aí, muitíssimo infelizmente, padres e bispos.)
-"Em relação à aproximação das CEBs com os movimentos populares na luta pela justiça, o documento 25 da CNBB afirmava que elas “não podem arrogar-se o monopólio do Reino de Deus”. Na verdade, a CEB deve tomar consciência de que, “como Igreja, é sinal e instrumento do Reino, é aquela pequena porção do povo de Deus onde a Palavra de Deus é acolhida e celebrada nos sacramentos ... sobretudo na Eucaristia” (70ss). As CEBs buscam, sim, a “colaboração fraterna com pessoas e grupos que lutam pelos mesmos valores.” (Primeiramente, convinha definir o que se entende por justiça. Este termo pode ser usado pra defender mil ideais. Entre eles, parece-nos o texto querer referir-se ao tão malfadado igualitarismo que, misteriosamente, continua a soar atrativo pra muita gente. Dentre os defensores disso, estão os comunistas de todo tipo... Daí que se poderia usar o argumento exposto acima para justificar a união de movimentos católicos com sindicatos comunistas, desde que buscassem o mesmo fim, apontado sob o nome de "justiça". "Mesmos valores" é igualmente ambíguo.
Alguém poderia objetar de que, como grupo realmente católico, as CEBs têm na Eucaristia o seu centro, tal como expresso acima. E aqui está outra grande ambiguidade. Não se costuma, nesse meio, defender a Santa Missa como Sacrifício de Nosso Senhor. Ao contrário, a Eucaristia parece se tornar instrumento de evidenciação ou materialização dos ideais pregados. A Santa Missa se torna refeição comum e fraterna, isto é, ocasião em que todos são iguais, em que o "pão" é dado a todos e tem-se aí encerrado o significado da "festa". Parece que toda uma simbologia nova (da nova consciência) é projetada sobre o Sacrifício Eucarístico que perde, assim, todo o seu rigor. Coisa terrível!)
-"Uma das dimensões da espiritualidade cultivadas pelas CEBs é a do diálogo ecumênico e interreligioso, que se dá pela abertura ao mundo do outro, promovendo a unidade na diversidade e buscando as semelhanças na diferença. Esta espiritualidade dialogal tem sido assumida pelas CEBs como uma missão de fraternidade cristã, numa atitude de profundo respeito às demais manifestações religiosas, em busca da comunhão universal. Essa espiritualidade nasce do desejo expresso por Jesus: "Que todos sejam um!" (Jo 17,21)" ("Unidade na diversidade", não importa se esta diversidade seja ao infinito a ponto de ir contra a própria natureza da Igreja. A flexibilidade é absoluta. Alguém poderia usar este termo "unidade na diversidade" assim, ambiguamente, pra defender o seu direito de morar com as galinhas, os tatus e com os peixes, tudo ao mesmo tempo. Tal como está, a expressão se aplica aos casos mais absurdos. O "profundo respeito às demais manifestações religiosas" é outro carácter profundamente anti-católico, pois isto implica relativizar os distintos, enquanto que a exclusividade é traço inerente à verdade. O respeito deve existir para com os adeptos destas tais manifestações religiosas, mas nunca com as manifestações religiosas em si, pois a Verdade não respeita o erro, mas somente quem erra, assim como Deus ama o pecador, mas detesta o pecado. Se a escrita acima, porém, expressa ingenuidade ou intenção de ludibriar, eu não sei, e me isento de afirmar qualquer coisa. Mas, seja um ou outro o caso, vindo de senhores bispos, é lamentável. Por fim, fazem Nosso Senhor de instrumento (coisa terrível) para defender algo totalmente non sense ao afirmar que tal desejo nasce em Jesus. Esta manipulação do sentido do Evangelho, bem à semelhança protestante, pode ser fruto deste dito "respeito" às outras "manifestações religiosas", a ponto de imitar-lhes o método.)
-"(...) reafirmamos aqui o que está escrito no Documento 25 da CNBB: “Ao concluir estas reflexões, desejamos agradecer a Deus pelo dom que as CEBs são para a vida da Igreja no Brasil, pela união existente entre os nossos irmãos e seus pastores, e pela esperança de que este novo modo de ser Igreja vá se tornando sempre mais fermento de renovação em nossa sociedade”. (94). (Dom? Nani? Fermento de renovação em nossa sociedade? Libera nos Domine...)
Enfim, a coisa é muito preocupante. Fico me perguntando o que o Santo Padre diria disto. Ele sabe? Se não, virá a saber? Se alguém aí souber, me responda... Se me equivoquei em algo que escrevi, mostrem-me em que. Tudo isto é muito triste.
Fábio.
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