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Somos muito mentirosos... Mas é a Verdade que nos salva


Há uma afirmação do Nietzsche que eu considero fenomenal. Lá pelo meio do Além do Bem e do Mal, um livro de aforismos, ele afirma que nós somos muito mentirosos ou, se quisermos dizê-lo de modo mais aceitável e mais hipócrita, somos mais artistas do que pensamos. Ele nos acusa de uma grande falta de sinceridade, e qualquer um que conheça minimamente o que é o homem, haverá de concordar com o filósofo ateu. Nós, de início, tendemos a ser muito falsos, preocupados somente com o nosso ganho. Para tal, forjamos todo tipo de coisas, chegando às raias de nos enganarmos a nós mesmos.

Conforme vimos nos noticiários, ontem a cantora Amy Winehouse morreu. E, agora, observando a triste vida dessa figura, como não dizer que foi uma pobrezinha que viveu o tempo todo se enganando? Ou alguém realmente vai defender que uma pessoa passa por uma overdose de drogas porque deseja um contato com a verdade? Que me perdoem os cultores  do Santo Daime, mas isto é conversa mole. Somos muito mentirosos, e, ao invés de admitir a nossa indigência, preferimos não raro sorrir para o mundo, ostentando uma alegria que não possuímos. Nos contentamos com os caricatos e, de tanto fazê-lo, há quem termine acreditando na própria mentira.

Isto me faz lembrar o que diz o Apóstolo João, a certa altura do seu evangelho. Jesus pregava e várias pessoas se convertiam. Mas Jesus, acrescenta o Apóstolo, não se fiava neles, pois sabia o que havia no interior dos homens. De nada vale uma encenação, ou uma resolução que logo amanhã já será outra. Somos muito mentirosos! E a coisa é tal que é preciso amadurecermos um bocado para alcançar certos níveis de sinceridade, porque isto supõe um conhecimento substancial de nós mesmos. Em certo momento, Jesus dirá: "Conhecereis a Verdade e a Verdade vos libertará". Obviamente, Jesus falava de Si mesmo, mas podemos também entendê-lo como uma opção fundamental pela verdade que se imprime na alma convertida; uma ausência de duplicidade. E isto não é qualquer coisa que se produza do dia para a noite. Para sair da alienação da mentira, é preciso aderir a Cristo de modo visceral, deixando-O lutar livremente contra os seus adversários em nós: "Pravaleça, Senhor, contra os Vossos inimigos", dizia o Salmista. Não podemos nos dar ao luxo de fazer do nosso projeto de santidade um mero teatro, uma encenação que nos massageie o ego e nos permita posar de beatos. A santidade só se constrói pelo encontro do nosso eu verdadeiro, íntimo, com o verdadeiro Cristo. É por isso que a santidade fora da Igreja é, por definição, impossível. Por santidade, eu não me refiro ao bom mocismo nem à mera cordialidade. Pois bem, se julgamos que a partir de um caricato lograremos êxito nesta empreitada difícil, terminaremos ouvindo aquele dolorido "não vos conheço" pelo simples fato de não termos sido nós mesmos. Isto é seríssimo. Em suma, a hipocrisia é mera e tola perda de tempo.

É por isto que, em todos os santos, encontraremos a doutrina de que precisamos conhecer a Deus, sem O qual nada podemos, e também a nós mesmos, o que não se faz pela adesão a teorias freudianas ou jungianas, como o querem alguns monges e padres moderninhos, mas somente pela intimidade com o próprio Deus. É o que alguém chamou de "maiêutica cristã", ou "conhece-te a ti mesmo em Deus". Teorias estranhas não apenas não ajudam, como acrescentam empecilhos. E eu o digo por mim, pois foi-me muito difícil e demorado libertar-me dos malditos sofismas freudianos aos quais, um dia, eu dei bastante crédito.

Somente com a graça de Deus chegaremos ao termo do caminho. E compreendê-lo faz uma grande diferença porque nos faz evitar trilhar caminho falso, que é qualquer um em que Deus não esteja por fundamento, e nos impede de despender esforços vãos. A falsidade do homem que busca a própria promoção utilizando-se de Deus como de um instrumento só mostra que, no fundo, ele não O leva a sério. Deus, nesse caso, é somente mencionado como estratégia para a conquista de honrarias as mais vãs possíveis. Em nada disso há a negação fundamental que Jesus pôs como condição para o discipulado: "quem quiser me seguir, negue-se a si mesmo..." O culto do homem e a busca frenética de satisfação dos prazeres a que assistimos hoje, sob o pretexto de que não podemos aderir a uma proposta pessimista e medieval, toma, como princípio, uma atitude que é antípoda ao convite de Cristo. Todo o modernismo tem essa revolta por raiz: em função do subjetivo atual, renuncia-se a tradição e o metafísico.

Mas, se formos sinceros e colocarmos Deus no centro, rechaçaremos qualquer religião ou caminho que não provenha d'Ele, o que equivale a reconhecer a falsidade do discurso da auto-suficiência humana. O subjetivo do homem, a sua opinião, serão, então, postos em segundo plano, em função de uma verdade que nos transcende e independe de nós. É aí que fazemos o exercício primordial da negação de nós mesmos e, ao fazê-lo, provocamos um encontro do nosso eu com a Verdade, donde resulta a liberdade prometida por Nosso Senhor.

Mas, para chegar aí, precisamos deixar de ser falsos, o que significa morrer em nosso falso eu. Essa é a morte da qual resulta a vida. Precisamos ser verdadeiros com Deus e conosco. Que Deus nos conceda a Sua graça porque sozinhos nada podemos, nós que, como diz Sta Teresa, somos a própria vaidade.

Fábio
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2 comentários:

  1. Fábio, você está certo, ela de fato encarnou um personagem, viveu (e morreu) engando a si própria. Parabéns pelo blog, gostei muito de seu trabalho.

    Abraços,

    Marcelo

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  2. Oh Marcelo, agradeço.

    Que Deus o abençoe. ^^ Pax.

    Fábio.

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Fique à vontade para comentar. Mas, se for criticar, atenha-se aos argumentos. Pax.

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