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Resposta a um comentário curioso


Nestes dias eu recebi um comentário, no mínimo, curioso. Nele, ao mesmo tempo em que fui criticado pelo que escrevi a respeito do Pe. Fábio de Melo, fui também convidado, por alguém que supunha conhecer-me a alma a partir do que eu escrevera, a fazer uma certa experiência com a ayahuasca, popularmente conhecida como santo daime. No comentário, a pessoa fazia algumas observações divertidas: “Se você quiser... não, você quer, só não sabe...” Pergunto-me se ela viu isso quando tomou o chazinho...rs. 

Eu não costumo fazer postagens com comentários recebidos; na verdade, nunca fiz. Mas este me pareceu que merecesse uma resposta um pouco maior, pelo que o destaco com um post.

Reproduzo abaixo algumas partes que julgo mais importantes e mais relevantes. Em todo caso, a pessoa parecia estar sendo sincera, pelo que a respeito. Responderei as suas críticas e ao seu convite com a máxima sinceridade.

O comentário completo se encontra na seguinte postagem: Estranha entrevista do Pe. Fábio de Melo no Jô Soares.

Vamos à resposta. As partes em negrito são da comentadora Leila. As em itálico, são minhas.

**
Sim. Pe. Fábio é um apóstata.. e eu adoro isso!!..awuhuawh.”

 Não Pe. Fábio não é um apóstata... pelo menos não até agora. Ele pode ter cometido heresia, o que o torna um herege. Mas apostasia é outra coisa. Não vou me deter nisso, porque não vem ao caso.

“Ele consegue com palavras amenas levar um pouco de LUZ, as trevas da ignorância do meio católico.”

Para afirmar isto, é necessário utilizar um critério para que se identifique o que é luz e o que são trevas neste contexto. Por exemplo: nós, católicos, nos submetemos à Fé Católica e, com isto, sabemos quando uma negrura tenta se disfarçar de luz sem o ser.

Para que você, porém, identifique o discurso do Pe. Fábio com a luz e a doutrina católica com a treva, naturalmente deve utilizar um critério. Eu perguntaria: qual é? Não me diga que é o chazinho...

Além disto, dizer que o catolicismo é treva implica que o conheças profundamente. É o caso, minha cara? rs...

“Ai daqueles que às trevas chamam luz e à luz chamam trevas” (Is 5,20). Isto parece se aplicar perfeitamente a você, cara Leila.

“Desculpe minha sinceridade tão ...an..herética. É que o fato de já ter estado aí..do lado de vcs usando desse mesmo discurso e agora estar aqui do lado de cá faz enxergar as coisas de outro ângulo. É como a primeira vez que o homem foi ao espaço, e enxegou a Terra de fora.” 
Mudar de lugar faz enxergar as coisas de outro ângulo; isto não é nenhuma conclusão pra se orgulhar. Depois, segundo a tua comparação com o astronauta, queres dizer que agora, fora da Igreja, consegues ter uma visão panorâmica dela? Isto é muita pretensão, não acha?

1-      Se procuras observá-la de forma puramente natural, como se fosse objeto inerte da tua pesquisa, nem entenderás bem o que vês e muito mais é o que ficará por ver. A Igreja é um Mistério cuja verdade é revelada por Deus pelo dom da Fé. Se a olhas com soberba, Deus te resistirá...
2-      Para conhecer bem a Igreja é preciso estar nela, vivenciar o seu mistério, encarnar as suas verdades. E, ainda assim, o mistério nos ultrapassa infinitamente.
3-      Por fim, a sua própria afirmação contém a refutação da sua pretensão. Se mudar de lugar é ver as coisas por um ângulo diferente, isto significa que a nossa visão não abarca  toda a totalidade. Para conhecer, portanto, a verdade a fundo é necessário uma revelação que transcenda, na sua efetivação, todos os pontos de vista. O cristianismo, minha cara, é justamente fruto desta revelação do Deus que se fez homem e habitou entre nós.

Ainda que o teu astronauta possa sair da terra, ele não a pode observar de todos os ângulos, pelo que sua visão permanece limitada. Outra: a visão geral lhe tira a apreciação dos pormenores. Na revelação divina, não... A Fé ilumina-nos sobre as grandes verdades e sua luz também confere sentido profundo sobre o evento mais ordinário. Sua comparação, portanto, é pueril.

Mas o que mais me chamou atenção nesse post não foi o Pe. Fábio mas o discurso seu, Fábio Graa... Vc me lembra o discurso de um conhecido meu amante de Krishnamurti, usando sempre da boa sobriedade tentando ser bem fundamendado, embora confesse que os pilares desse fundamento católico..tsc., me parecem sempre tijolos mau encaixados que deixam brejas aos que ousam futricar.

Bem. Se sou comparado a alguém que se destaca pela sobriedade, creio que não há nada a me queixar neste sentido. E se eu te chamei a atenção, posso bem estar servindo de isca para a sua conversão. Deus faz destas coisas e é uma honra para mim poder ser um instrumento.

Você, porém, afirma que os “tijolos” que fundamentam o catolicismo deixam brechas. Como você me parece uma pessoa sincera, cara Leila, pergunto-lhe: quais as brechas que você vê? Eu gostaria muito de que vc mas expusesse. E com isto manifesto o desejo de que sigamos dialogando.

Se vc é tradicionalista vc provavelmente se identifica mais com os santos contemplativos da Igreja. Vc já compreendeu que o caminho a percorrer É pra dentro do ser.

De fato, me identifico muito com os contemplativos, embora hoje eu também admire muito os combatem no que se convencionou chamar “carisma missionário”. E sei de muitos tradicionalistas que provavelmente se identificam mais a estes últimos. Quanto a mim, de fato, tenho uma atratividade particular pela contemplação, o que já me fez questionar várias vezes a respeito da minha vocação. Cheguei até a considerar a vida monástica, mas hoje sei que aquela especificidade não é para mim.

Depois você diz que eu já compreendi que se deve caminhar pra dentro do ser. Esta questão é bastante ambígua, e tem sido frequentemente tratada com pouca profundidade, sobretudo pelos que se apressam a criticar tais expressões como se fossem manifestamente gnósticas, budistas, etc e etc. Isto se deve, particularmente, a um paradoxo usado pelo G.K Chesterton, presente num livro de muita estima pelos tradicionais, chamado Ortodoxia. Lá o Chesterton faz uma comparação entre o budista e o católico, afirmando coisas de um modo que, a princípio, e detendo-se estritamente no pouco que ali é dito, permanecem insuficientes para fundamentar uma compreensão mais profunda sobre o tema. Como dizem alguns "o buraco é mais embaixo".

Sinto muito aos chestertonianos que me considerarão talvez um ingênuo, mas, neste ponto, o Ortodoxia é bem modesto. Não que o Chesterton fosse escritor de nível modesto, mas que, na obra e neste ponto, ele brinca com os paradoxos e não pretende ser precisamente analítico com a questão. 

Até agradeço este comentário que me dá oportunidade de tratar também destes assuntos pois, de outro modo, dificilmente o faria. O Chesterton diz que o “santo” budista se caracteriza pelos olhos semi-abertos, o que denuncia uma atitude introspectiva de busca da verdade em si mesmo. Dizer daí que tal atitude implica auto-suficiência é muito precipitado. Há pessoas aos montes que copiam e colam esta parte da obra, e acham que já falaram o suficiente do assunto. É uma ingenuidade.

Quanto ao santo católico, o Chesterton diz que ele tem os olhos bem abertos, olhando a realidade dos seres que, de fato, são. Chesterton foi um pensador muito profundo, o que é inegável, e o argumento que ele apresenta aqui pode ser bem compreendido e é muito verdadeiro, mas apenas se já tivermos assumido alguns pressupostos.

Mas se a gente for observar, há um traço no budismo, embora não se identifique com ele, que atenta para a nua realidade das coisas, tal como elas são, sem máscaras, sem vestimentas; é o Zen. O tema é complexo e não há que aprofundá-lo aqui; além do que o zen pretende-se anterior a qualquer argumentação. Poderia, então, ser defendido que o fato de buscar a iluminação implica que este sujeito praticante do zen deseja, na verdade, ver melhor.  entendido desta forma, bem se poderia argumentar que a atitude de cerrar os olhos poderia ser como uma preparação para abri-los bem.

De outro lado, há um forte traço no cristianismo que prega justamente esta busca interior, esta ida ao centro da alma. E, neste campo, eu sou bem mais confortável para fazer afirmações. Apenas uns poucos exemplos:  

Santo Agostinho escreve: “Entrei no meu íntimo sob tua guia....” e ainda “estavas em mim e eu não estava em ti”. Sto Agostinho afirma que encontrou Deus dentro de si.  Ele diz à Verdade que encontrou no seu interior: "Tu és o meu Deus".

Sta Teresa D’Avila, por sua vez, escreve: “tendes visto com freqüência que os manuais de espiritualidade recomendam a que se corra para dentro. E eu digo: é isto mesmo”. A sua obra “Castelo Interior” é, toda ela, um convite e um pedido para que se adentre mais no palácio real que é a alma. 

Já São João da Cruz escreve: “Devemos procurar Deus principalmente dentro de nós mesmos” e ainda, num pequeno canto que compôs: “Olvido do que é criado, memória do Criador, atenção ao interior, e estar amando o Amado”.  

Notem que eu cito três doutores e estas são apenas umas poucas de uma infinidade de afirmações neste sentido. 

Não quero com isto, de jeito nenhum, fazer uma intersecção entre budismo ou filosofia oriental e cristianismo. Se há pontos em comum, são meramente acidentais. É a falsa compreensão da acidentalidade deste aspecto o que motiva os sincretismos que se costuma fazer.  

Ainda que um budista e um cristão meditem e cerrem os olhos em direção ao interior, o objeto que procuram é radicalmente diferente. O Cristão busca a Cristo presente na sua alma. O budista busca o nada.

Este “nada” ainda pode dar pano pra manga numa discussão que se proponha estabelecer paralelos acidentais entre a “negação” budista e o ramo da mística chamado “teologia apofática”. Mas, mais uma vez, não vamos tratar disto.
 

Pra que pus tudo isto? Pra dizer duas coisas: Primeiro, que não podemos ficar na superficialidade, atribuindo um pecho irresponsável só porque se viu algo parecido com outro algo que se leu e de que se lembrou vagamente segundo aqueles aspectos secundários. Segundo: que, embora exteriormente ou esteticamente parecidos em certos traços, eles são radicalmente distintos. Isto é necessário, creio, para que se compreenda bem a resposta que darei a este comentário.

Dito isto, sigamos. Eu, de fato, admiro muito a vida contemplativa. E isto me leva a admirar também pelo menos a estética de outros movimentos contemplativos não católicos como, por exemplo, o zen que citei e a sua respectiva prática da meditação sentada (zazen), a meditação do tai chi, etc. Os amigos mais próximos já conhecem este meu traço oriental..rs... Haverá, talvez, a minha interlocutora se convencido, com estas minhas declarações, da veracidade da sua suposição a meu respeito? rs...

Como eu falei, a admiração não se estende aos princípios destas vertentes. Compreendo bem que são atrativos enquanto caricaturas de cristianismo. Ademais, o rigor que acompanha os tais praticantes dessas coisas dá certa atratividade a estes movimentos. Eu estudo um pouco disso e me interesso,mas com sobriedade. Não farei como o Thomas Merton que quase debandou pra o outro lado.

Agora, note o seguinte: se já há aqui uma explícita rejeição dos princípios errados destes sistemas que não apelam para o uso de substâncias indutoras de um suposto estado meditativo, quanto mais com relação ao uso deste chazinho... Isto aí, como me dizia um protestante ainda ontem enquanto coversávamos, "tá repreendido!". rs...

Não é só por causa da tradição católica. É seu coração que diz que vc encontra a Verdade quando fecha os olhos.

Veja.. Se meu coração busca a verdade, então ele sempre caminhou rumo ao catolicismo. Como já dizia algum santo, todo aquele que busca a verdade, busca a Deus sem o saber. E, completo eu, aquele que busca a Deus está rumando para o catolicismo, ainda que não saiba. Se meu coração busca a verdade, ele encontrou e encontra no catolicismo a plena satisfação dos seus anseios mais profundos e, iluminado pela fé, compreende melhor estas coisas. A tradição católica, pura e perfeita, corresponde plenamente à natureza do coração humano. Ela é, na verdade, a sistematização da verdadeira forma de entender as coisas. Ela facilita o acesso à verdade que liberta. Enquanto corpo sistemático, a tradição prepara o espírito para o que está além do sistema, a Deus que é inefável.

 Todo e qualquer movimento filosófico e/ou contemplativo que atinja algum aspecto de verdade, somente o faz pelo Verbo. Como dizia Sto Agostinho, toda verdade provém do Espírito Santo.

A verdade, porém, completa e isenta de mistura de erros está na Igreja Católica. Disse o Verbo: “pois vos revelei tudo quanto ouvi de meu Pai”.

Quanto mais, portanto, um movimento não cristão atinja a verdade, mais ele caminha rumo ao catolicismo. Se prosseguir indefinidamente neste processo de acesso à verdade, chegará o momento da sua conversão. Isto se faz pela graça de Deus: “ninguém virá a mim se o Pai não o atrair”.

Eu adoraria discutir muitos assuntos do tipo com você, mas provavelmente seria inútil.

Me pergunto por que seria inútil... Se vc tiver a pretensão de me convencer a abandonar a Santa Igreja, então toda a sua tentativa, de fato, estará fadada ao fracasso. Porém, se não obstante o seu chazinho, vc aceita que não sabe tudo e que pode pelo menos aprender algo sobre a Igreja que não sabia, não vejo porque seja inútil.


 
Se vc um dia quiser fazer uma experiência com ayahuasca, num lugar que zela pela sobriedade. Me procure. Se você quiser, não. Você quer, apenas não sabe.

Aqui vc fala de sobriedade e faz uma afirmação do tipo “Walter Mercado”. Não, minha cara, não tenho o mínimo interesse de provar do seu chá, e não vejo como um alucinógeno pode conferir sobriedade a alguém.

E eu sei que não quero.


 
Mas alguém que vai a fundo a estudar os mistérios..e a doutrina. É alguém que tem sede de verdade. Eu não vou ganhar nada com isso. E eu não saio por aí convidando as pessoas. Apenas senti que eu devia lhe proporcionar essa oportunidade. E levantar essa possibilidade pra vc.
 

De fato, todo cristão deve ter sede da Verdade, visto que a Verdade é uma Pessoa, Nosso Senhor Jesus Cristo.

 Agradeço o seu convite, mas não quero. Quero aproveitar, então, e também te fazer um convite: estude a sério, sem chá, a doutrina católica e, quaisquer dúvidas que você tiver, estamos por aqui. Somos já muitos os tradicionais, graças a Deus, e nós nos ajudamos no que um não souber.

 Você diz que sentiu que devia me dar esta oportunidade. Sinto dizer que sentiu errado. Aliás, talvez tenha sido Nosso Senhor te inquietando a alma e te trazendo a um ambiente católico onde podes respirar ar fresco e se expor à cálida luz do Sol da Verdade.


Um abraço fraterno em Cristo.

Depois de me falar do Santo Daime e de dizer tuas pérolas sobre a “ignorância católica”, tu te despedes em nome de Nosso Senhor. Rs...

Espero, minha cara, que Cristo te traga de volta. Estarei rezando pela sua conversão. Que a Virgem Santíssima te reconduza.

Fábio.
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2 comentários:

  1. Olá Fábio,

    Preciso manifestar a alegria de ter encontrado seu blog. Para compreender esse post, eu li o anterior e toda a discussão que deu origem ao mesmo.

    Confesso-te que estou em um processo de consolidação de minha fé, percebi que a minha pouca fé não tem feito bem a mim, nem às pessoas ao meu redor (o que é muito pior, pois a maior dor para mim é perceber que machuquei um irmão).

    Se me permite, preciso dizer que há 7 anos tenho me afastado gradualmente da fé em Cristo, só a pouco percebi isso. Tão logo comecei a me aprofundar na fé cristã em minha adolescência, já fui largando-a, sinto-me envergonhado por isso.

    Sendo assim, hoje sou um jovem de 22 anos que quer consolidar sua fé. E, por isso, sinto-me muito grato em ter suas palavras na tela de meu computador.

    Vejo que buscas a Verdade e não meias-verdades, aprecio muito isso. A sua coerência reaviva em mim o fervor da fé.

    Estou aprendendo muito com suas respostas aos comentários dos leitores, de forma que algumas dúvidas minhas têm sido sanadas com seus textos.

    Continue sempre assim, sendo firme na fé, pois é assim que pretendo ser, na graça de Deus.

    Adriano

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  2. Caríssimo Adriano,

    Agradeço suas palavras de apoio, e bendigo a Nosso Senhor por este blog estar te beneficiando... É tudo pela graça d'Ele que se digna usar instrumentos tão pobres para o seu serviço.

    Fico muito feliz que estejas reencontrando de novo a Fé. Que Nossa Senhora te conduza a uma Fé completa, íntegra e firme. E assim farás bem à tua alma e a todos os que te rodeiam...

    Saiba, meu caro, que a criação espera como mulher em dores de parto pela nossa decisão de viver uma Fé firme e robusta.

    E eu espero, sinceramente, que na tua busca pela Verdade, seja a própria Verdade a te cristificar. Para isto, ame-A com todo o teu coração, com todo o teu entendimento, com toda a tua alma.

    Que Deus o guarde e que a Virgem Puríssima o conduza.

    Abraço. Pax.

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Fique à vontade para comentar. Mas, se for criticar, atenha-se aos argumentos. Pax.

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