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Uma pista para desmascarar a Preguiça


Ouvi contar há tempo, a um homem de Deus, a história verídica de um pastorzinho que todos os dias acompanhava o pai, ajudando-o a conduzir o gado para o pasto. Queimava-o o sol e cansavam-no as longas caminhadas, um dia após outro. Aconteceu que chegaram à fazenda uns estudantes para passar as férias. Acordavam tarde, passeavam longamente, prolongavam conversas à sombra das árvores.

Um dia, um desses estudantes, no meio de um passeio vespertino, aproximou-se do garoto, que voltava cansado do pastoreio.

- "Você" - perguntou -, que gostaria de ser quando crescer?"

A resposta, após um relance ao moço e outro à boiada, não se fez esperar:

- "Eu gostaria de ser um estudante ou boi".

Não andava pelas alturas, aquele menino. Queria uma vida cômoda: o dolce far niente do estudante em férias ou a paz do boi ruminando no pasto. Mas será que nós andamos por maiores elevações?

Uma das formas mais comuns da preguiça, sem diminutivo, é justamente a repugnância pelas alturas espirituais e morais. É o que poderíamos chamar a ambição da mediocridade. Quer-se é viver bem, mas sem exageros de esforço nem loucuras de idealismo. Ser bom, ser um "cristão médio", com a sua dose medida de religião, vá lá. Mas levar o cristianismo a sério e em plena coerência com a fé, isso considera-se fanatismo.

É muito interessante verificar que a sabedoria dos antigos, já desde os primeiros séculos do cristianismo, ao enfocar a preguiça, contemplava quase que exclusivamente o seguinte conteúdo: a resistência a atingir a altura espiritual e moral própria de um filho de Deus, de um cristão.

Na linguagem clássica cristã (de Cassiano a São Tomás de Aquino, passando por São Gregório Magno), o vício capital da preguiça era designado com o nome de acédia. A acédia é fundamentalmente uma tristeza, uma tristeza ácida e fria - daí o nome -, que invade a alma ao pensar nos bens espirituais - na virtude, na bondade, no amor a Deus e ao próximo -, precisamente porque não são fáceis de alcançar nem de conservar. Exigem esforço, renúncia, sacrifício. E o egoísmo se defende. A repugnância que sente por tudo quanto é abnegação e doação generosa vai criando depósitos azedos no coração, e acaba transferindo para Deus e para os próprios bens árduos que Deus pede uma fria antipatia, que pode terminar em aversão: "um tédio que acabrunha", diz São Tomás3.

É natural que estes mesmos autores insistam no fato de que a acédia se opõe frontalmente àquilo que é a essência da perfeição cristã: o amor. A preguiça detesta o que o amor abraça, entristece-se com o que alegra o amor.

É possível que já tenhamos tido, alguma vez, a experiência desse tipo de tristeza, ao pensar em Deus e nos ideais cristãos, e nos tenhamos perguntado: por que Cristo exige de todos os seus seguidores que se neguem a si mesmos e tomem a cruz (cfr. Mt 16,24)? Por que insiste na necessidade de perder a vida - de entregá-la - para achá-la (cfr. Jo 12,25)? Por que assinala como lei áurea do cristianismo um amor ao próximo tão exigente, que deve ser um constante "servir e dar a vida" pelos outros (cfr. Mc 10,5)? Não seria mais agradável um programa suave, sem cruzes nem renúncias, feito de bondades descomprometidas?

É bem possível que, sem reparar, tenhamos fixado como ideal de vida a honestidade hipócrita do fariseu - não mato, não roubo, pago o dízimo -, aliada à frase que se esgrime como uma fórmula de auto-canonização: "Não faço mal a ninguém".

Basta uma leitura superficial dos Evangelhos para concluir que isso não basta. Sede perfeitos, assim como vosso Pai celestial é perfeito (Mt 5,48). O primeiro de todos os mandamentos é este: amarás o Senhor teu Deus com todo o teu coração, com toda a tua alma, com todo o teu entendimento e com todas as tuas forças. O segundo é este: amarás o teu próximo como a ti mesmo (Mc 12, 29-31).

Quem quiser seguir a Cristo tem que renunciar à vida fácil. Não se pode entrar no Reino de Deus sem um empenho esforçado: O reino dos Céus - diz Cristo - é arrebatado à força e são os violentos (os que lutam energicamente) que o conquistam (Mt 11,12).

Iludem-se os homens quando pensam que levar Deus a sério vai perturbar-lhes a vida, metendo-os num calvário de compromissos, exigências e complicações. Quando, na realidade, o que complica e estraga a vida com a maior perturbação que existe - o vazio - é exatamente o contrário: o medo de levar Deus a sério, a apreensão que faz fugir dos compromissos do ideal cristão.

Nunca é por ter-se dado ou sacrificado que um homem se esvazia, mas por ter-se poupado. É dolorosa como uma queimadura a constatação de que os anos vão passando e o vazio vai aumentando. São duras certas horas de solidão, em que parece que o coração reclama: - "Não sei o que está acontecendo comigo, falta-me alguma coisa e não sei dizer o que é".

A única coisa que acontece é que não vivemos a "nossa" vida - o que ela deveria ser -, mas um substitutivo rebaixado ou uma falsificação. Somente seremos felizes quando realizarmos a Vontade de Deus a nosso respeito, porque só então é que nos encontraremos a nós mesmos.

Aqui temos, pois, uma primeira pista para descobrir a preguiça de fundo: a renúncia à altura. Assim resume Pieper, com traços vigorosos, essa atitude: "A preguiça, como pecado capital, é a renúncia mal-humorada e triste, estupidamente egoísta, do homem à "nobreza que obriga" de ser filhos de Deus4.
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3- São Tomás de Aquino, Suma Teológica, II-II, q. 31, a. 1;
4- Josef Pieper, Las virtudes fundamentales, Rialp, Madrid, 1976, pág. 395.

Francisco Faus. A Preguiça, Quadrante, 2ª ed., São Paulo, 1993, pp. 7-10.
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Um comentário:

  1. Parabens, muito bom seu blog, bastante criativo e interessante... confira o nosso site
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